A vantagem de se fazer um testamento está ligada ao fato de a pessoa poder manifestar o seu desejo sobre a destinação de seus bens depois de seu falecimento. As origens desse desejo podem ser as mais variadas, por exemplo: uma pessoa tem muitos imóveis, mas não tem nenhum herdeiro, apenas parentes muito distantes com quem sequer mantém contato.
No entanto, essa pessoa tem um amigo que sempre esteve presente e sempre o ajudou em sua vida e quer que todo o seu patrimônio seja destinado a essa pessoa, quando vier a falecer. Para que isso ocorra, será necessário um testamento, do contrário, os bens ficarão para os herdeiros, de acordo com a ordem de sucessão.
A vantagem de declarar as vontades em um testamento está muito ligada aos sentimentos do testador em relação às pessoas e à forma como quer distribuir seu patrimônio. Muitas vezes, inclusive, um testamento bem elaborado elimina diversos conflitos familiares que surgem na hora da divisão do patrimônio deixado por aquele que não mais está presente.
O testamento deve ser visto como uma forma de resolver em vida pelo menos parte das questões que surgem quando uma pessoa vem a falecer. Se ela construiu um patrimônio, por que não decidir sobre a destinação dele quando vier a falecer? Se você ajudou muito uma pessoa em vida (ou alguma instituição) ou foi ajudada por ela, por que não deixar algo em seu benefício?
Quantos testamentos posso fazer?
Não existe limite quanto ao número de testamentos que podem ser feitos por uma pessoa. No entanto, é importante lembrar que cada testamento novo que for feito, poderá anular o anterior de forma parcial ou total. Se o novo testamento declarar que revoga o testamento anterior (que o testador desiste dele), então ele será revogado completamente e o novo é que passará a ter validade.
Caso o testador não declare que revoga o testamento anterior, o conteúdo do novo deverá estar coerente com o anterior. Um exemplo disso seria: se “A” fizesse um testamento deixando um apartamento para “B” e anos depois, fizesse um novo testamento deixando o mesmo apartamento para “C”, mas sem informar que a intenção de revogar o anterior, como o objeto é o mesmo, não há como manter os dois testamentos. Portanto, o antigo deixará de ter efeito, automaticamente.
Agora você se pergunta: mas como vou saber qual é o último testamento?
Pois bem, na hora da elaboração do testamento deverá sempre sem preenchida a data em que ele está sendo elaborado. Junto a isso, como vimos anteriormente, os testamentos públicos, cerrados, marítimos, militares e aeronáuticos, deverão ser registrados em cartório. Este registro será direcionado à Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados (CENSEC), que tem a finalidade de gerenciar os bancos de dados com informações sobre a existência de testamento em todos os cartórios do Brasil.
Desse modo, basta pedir uma certidão ao CENSEC para ter em mãos as informações sobre a existência, ou não, de testamentos deixados por alguém que faleceu.
Dito isso, você pode questionar: mas e o testamento particular?
Quanto ao testamento particular, a discussão sempre acaba sendo maior, e a análise sempre requer mais cautela, justamente por não ser um documento que foi registrado em cartório. No entanto, embora não tenha registro, o testamento deverá conter obrigatoriamente a data em que foi elaborado, e o mais recente será o válido.
Infelizmente, não há como ter certeza se o testamento particular apresentado efetivamente é o único, ou ao menos o último deixado pela pessoa que faleceu, cabendo aos interessados questionar a validade do testamento, caso entendam como necessário, bem como apresentar o que efetivamente foi elaborado por último.
Quais bens eu posso dispor por testamento?
Quando a pessoa tiver herdeiros necessários (ex.: filhos, pais, marido/mulher) poderá dispor por testamento somente de 50% do seu patrimônio. A outra metade é chamada de “legítima” e será transmitida para esses herdeiros necessários.
Por exemplo: “A” é solteiro, mas tem dois filhos. Ele quer fazer um testamento e deixar seus bens para um amigo muito próximo. Devido a existência desses dois filhos, por testamento ele só poderá deixar metade de seus bens para o amigo. A outra metade será obrigatoriamente destinada aos filhos, a não ser que a pessoa falecida tenha um motivo relevante que justifique a exclusão de algum herdeiro da sua herança (por exemplo: o filho que tenta matar o próprio pai, pode ser excluído da herança)
Qualquer pessoa pode fazer um testamento?
Não é qualquer pessoa que pode fazer um testamento, sendo exigidos alguns requisitos:
– ser maior de 16 anos;
– estar plenamente capacitada, ou seja, a pessoa não pode estar acometida por alguma doença que prejudique sua capacidade de discernimento sobre suas escolhas, por exemplo, a doença do Alzheimer, ou sob efeito de medicamentos ou substâncias que afetem seu estado mental.
Ainda, devemos elencar situações especiais, que dizem respeito a pessoas estrangeiras, bem como aquelas acometidas por alguma limitação, como os analfabetos, cegos, surdos e mudos.
a) Estrangeiros:
O estrangeiro também pode declarar o testamento público, inclusive em seu idioma, desde que acompanhado por intérprete de confiança. Em relação ao testamento cerrado, os estrangeiros podem formulá-lo no seu idioma e o brasileiro também pode escolher idiomas estrangeiros, “quando pretenda ampliar o segredo de suas disposições”1.
b) Analfabetos:
Os analfabetos podem fazer testamento público (em cartório) e ele será assinado por uma das testemunhas. Nesses casos, a leitura do testamento é de extrema importância e a testemunha que ouvir a leitura será a mais recomendada para assinar o documento.
Em relação ao testamento cerrado, também pode ser feito por analfabetos, desde que saibam assinar, podendo ouvir o conteúdo do escrito por alguém que seja de sua confiança.
c) Mudos, surdos e cegos:
O mudo pode ser testador em testamento público, já que ele pode ouvir a leitura do texto a ser feita pelo tabelião e comunicar-se pelo idioma dos sinais, caso necessário e, preferencialmente, acompanhado de intérpretes.
Para os surdos, a leitura em voz alta pelo testador em caso de testamento público é substituída pela leitura direta do próprio testador. Caso o surdo não saiba ler, pode ser designada uma pessoa de sua confiança para tanto. A função da testemunha passa a ser de confirmar a leitura do testador e, caso ele não saiba escrever, a testemunha poderá assinar o documento em seu lugar.
O cego que puder ler e escrever em braile (sistema de escrita com pontos em relevo que os cegos utilizam para ler pelo tato) também poderá declarar sua vontade em testamento público ou cerrado. Caso ele não consiga ler, porém, não poderá utilizar-se desta modalidade de testamento.
Como podemos observar, o testamento é um instrumento de muita utilidade, no entanto, ainda são poucas as pessoas que optam por formulá-lo. O motivo pode ser o desconhecimento sobre o assunto, ou talvez, uma questão cultural que relaciona o testamento à morte de um ente querido, fazendo com o que o tema muitas vezes passe a ser visto como delicado e, por isso, evitado.
Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
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1 LÔBO, Paulo. Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013.
Sou casada no civil em regime de comunhão parcial de bens, sem filhos. Gostaria de deixar os valores das minhas contas de investimento e previdência para meus pais. É possível colocar isso em testamento? Como é possível identificar o valor desse patrimônio tipo de patrimônio de antes do casamento?
Olá, tudo bem?
É possível mencionar isso em testamento sim, desde que não ultrapasse 50% de seu patrimônio total, sob pena de se considerar um adiantamento da herança.
Para verificar tais valores, antes do casamento, entendemos que será preciso buscar informações junto às instituições de investimentos e de previdência privada. Isso também pode ser, eventualmente, solicitado em juízo, ainda que não conste especificamente em testamento a quantia exata.
Mas, cada caso deve ser analisado de acordo com suas particularidades e são diversos os fatores que podem alterar qualquer situação no que diz respeito ao inventário, herança… O ideal, portanto, é consultar advogados – antes de tomar qualquer atitude -, a fim de que possam ser conferidas as possibilidades e as melhores estratégias para dispor de seu patrimônio.
Esperamos ter ajudado de alguma forma!
Atenciosamente,
Laura e Arethusa.
Uma dúvida: como fica as precatórias no caso de disponibilizar 50% dos seus bem a um amigo, sendo que há herdeiros. Por exemplo, o testador deixa uma casa de R$ 300 mil e R$ 400 de precatórias para receber do Estado? Como ficaria esta divisão?
Olá, tudo bem?
“Disponibiliza” em testamento? Em tese, o testador somente pode dispor de 50% de seu patrimônio em testamento. Não temos certeza se entendemos o questionamento, mas, de qualquer modo, toda dúvida individual sobre um caso específico precisa ser ser analisada dentro de seu contexto para ser respondida adequadamente. Atualmente, nos dedicamos a produzir um conteúdo gratuito e, por isso, somente conseguimos responder dívidas individuais pessoalmente, relacionadas aos processos com os quais lidamos na Vara de Família de Curitiba/PR.
No mais, em relação a eventual partilha, sugerimos a leitura dos nossos artigos sobre o tema (https://direitofamiliar.com.br/category/sucessoes/), uma vez que vários pontos precisam sem analisados, o que não nos cabe.
Atenciosamente,
Equipe Direito Familiar.
Muito Obrigado pelo ensinamentos aqui, tem me ajudado muito. Vou continuar seguindo e compartilhando.
Nós que agradecemos!!!
Olá, Direito de Família!
Eu tenho 2 filhas solteiras é um filho casado que já tem 2 filhas. Eu já passei um imóvel para o filho e outro para uma das filhas. Como já estou com 88 anos, gostaria de saber se posso fazer doação da casa que moro para a filha de 50 anos e 2 netas adolescentes que ainda não ganhou nada é que irá cuidar dos pais e da irmã que é esquizofrênica.
Ex: pai e mãe
1 filho casado( 2 filhas), já passei um imóvel.
1 filha de 47 anos( esquizofrênica) já passei um imóvel.
1 filha com 50 anos( irá cuidar dos pais e da irmã esquizofrênica). Essa é a filha que quero doar a casa que moro. Mas a doação seria para essa filha e minha 2 netas. Qual seria as medidas cabíveis para essa situação?
Tem como me orientar pelo meu e-mail?
mglins71@gmail.com
Grata.
Maria das Graças
Olá,
Responderemos sua dúvida por e-mail, conforme solicitado!
Atenciosamente,
Equipe Direito Familiar.
Boa tarde! Meu marido tem um 2 filhos, mas quer excluir um de herdar seus bens! Eu li q ele pode fazer! Mas tem que justificar os motivos: não tem possibilidade dele querer reivindicar seus direitos mesmo assim, com o testamento feito?
Olá, Neide! Tudo bem?
A exclusão de herdeiro não é algo tão simples assim. Existem situações específicas para tanto previstas na legislação, e a exclusão somente será possível em casos excepcionais. Mesmo que seja feito um testamento, ele poderá sim ser questionado, dependendo das circunstâncias.
Sugerimos a leitura do artigo abaixo para que alguns pontos sejam esclarecidos:
“Doação de bens: “Tenho dois filhos, posso doar um imóvel apenas para um deles?”’: https://direitofamiliar.com.br/doacao-de-bens-tenho-dois-filhos-posso-doar-um-imovel-apenas-para-um-deles/
Advogados especializados na área de Direito de Família poderão avaliar a situação detalhadamente e apresentar as possibilidades referentes ao caso concreto.
Se ainda restarem dúvidas, nos escreva.
Atenciosamente,
Equipe Direito Familiar.
Really looking forward to read more. Really Cool.
Estou fazendo monografia sobre a impossibilidade do cego testamentar em todas modalidades. Vi que vocês afrimam que o cego poderá testemunhar no modulo cerrado, desde que saiba ler em braile. Eu não encontrei nenhuma doutrina afirmando isso, nenhum julgado… Poderiam me dar um norte a respeito…
Grato!
Heslley Couto
Olá Hessley, tudo bem?
O tema de seu trabalho diz respeito à impossibilidade de o cego testar em todas as modalidades, isso? Conforme mencionamos no texto, ele poderá testar nas modalidades público (conforme preceitua o artigo 1.867: Ao cego só se permite o testamento público, que lhe será lido, em voz alta, duas vezes, uma pelo tabelião ou por seu substituto legal, e a outra por uma das testemunhas, designada pelo testador, fazendo-se de tudo circunstanciada menção no testamento.) ou cerrado, dependendo das circunstâncias. Você poderá encontrar esse entendimento nos livros de Paulo Lôbo (Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013). Frisamos: este é um entendimento minoritário, no entanto, como nosso objetivo é proporcionar uma reflexão aos nossos leitores, entendemos por bem compartilhar tal posicionamento.
Esperamos ter ajudado!
Atenciosamente,
Equipe Direito Familiar.
Quando os herdeiros necessários possuem dívida em órgãos públicos como Previdência Social, a herança é automaticamente absorvida pelo governo? Como funciona nesses casos? Se o valor ou bens forem absorvidos automaticamente pelo governo, o que sugerem na hora de escrever o testamento?
Olá Thais,
Os casos de débitos com a Previdência acontecem, geralmente, por aqueles que são responsáveis pelo recolhimento do empregado, a não ser que se trate de contribuinte individual.
Se a contribuição acontecesse por pessoa física, o valor da herança não seria automaticamente absorvido pelo governo.
No entanto, estando habilitado o credor, no momento em que o herdeiro receber seu quinhão, a quantia poderá ser bloqueada no valor correspondente à dívida, como em qualquer processo de execução (cobrança de um valor devido). Mesmo que se faça um testamento, é importante lembrar que uma pessoa somente pode dispor em testamento de 50% de seus bens, quando houver herdeiros necessários.
Atenciosamente,
Equipe Direito Familiar.