O regime da separação obrigatória de bens (atualizações)

Assim como os demais regimes de bens, a separação obrigatória é conjunto de regras patrimoniais, aplicável na relação matrimonial e com efeitos também na sucessão. No entanto, diferente dos outros regimes de bens, a separação obrigatória é de aplicação impositiva. Ou seja, como o nome já diz, ela deve ser aplicada obrigatoriamente em determinados casos previstos na lei, independentemente da vontade dos noivos. Esta regra está colocada no artigo 1.641 do Código Civil.

De modo geral, durante o casamento, esta modalidade de regime funcionará da seguinte forma: cada cônjuge manterá o seu patrimônio individual. Não haverá, a princípio, bens comuns, ainda que tenham sido adquiridos durante o casamento.

Apesar da semelhança, é importante saber que a separação obrigatória não é igual à separação convencional de bens, já explicada no artigo “Regime da separação Total de Bens” (clique aqui). A primeira é impositiva, por força da lei, já a segunda é uma escolha do casal. Além disso, há diferenças no tratamento jurídico (nas regras) de cada um destes regimes, no que se refere à dissolução da relação, inclusive quanto aos efeitos sucessórios.

Veja a seguir os casos em que é aplicada a separação obrigatória de bens:

1. Quando o casamento é realizado por pessoas que, na realidade, não poderiam se casar:

a) o viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer o inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;

b) a viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal

c) o divorciado, enquanto não tiver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do ex-casal;

d) o tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não terminar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas.

Importante esclarecer que, nestas situações demonstradas, o regime impositivo pode ser afastado a pedido dos nubentes se, nas hipóteses “a”, “c” ou “d”, for comprovada a inexistência de prejuízo para o herdeiro, para o ex-cônjuge ou para a pessoa tutelada ou curatelada. Já na hipótese “b”, o afastamento do regime impositivo dependerá da prova de nascimento de filho ou inexistência de gravidez, na fluência do prazo de 10 meses.

2. Quando um dos noivos (ou os dois) for maior de 70 anos:

Até o ano de 2010, esta idade era de 60 anos, quando então foi alterada a lei, passando a ser obrigatório este regime de bens para as pessoas maiores de 70 anos.

A imposição deste regime nestes casos, tem a intenção de proteger o patrimônio do idoso e a ele próprio, considerando que neste momento da vida eventual perda patrimonial teria impacto muito mais relevante. Também há quem entenda que a medida visa proteger patrimonialmente os descendentes do idoso, privilegiando esta relação familiar em detrimento da nova constituição matrimonial realizada após os 70 anos.

Esta norma é criticada por alguns operadores do Direito de Família, pois impede a pessoa maior de 70 anos de dispor livremente sobre sua vida e sobre seus bens. É importante ressaltar que a idade avançada, por si só, não é causa de incapacidade, não justificando, portanto, a necessidade de imposição do regime legal. Apesar disso, persiste a previsão legal.

A questão é polêmica e, inclusive, será objeto de discussão pelo Supremo Tribunal de Federal, que decidirá se a imposição do regime de bens da separação para pessoas com mais de 70 anos é constitucional ou não.

3. Quando o casal precisar de suprimento judicial para poder casar:

Este tipo de situação ocorre quando a pessoa menor de idade pretende se casar, mas não tem o consentimento de um ou de ambos os pais, necessitando, portanto, de uma autorização judicial para realizar o casamento. Se esta autorização judicial for concedida, o regime de bens será o da separação legal.

Maria Berenice DIAS1, referência para o Direito de Família, ensina que esta obrigatoriedade existe para mostrar a insatisfação do legislador (aquele que faz a lei) com aqueles que se casam mesmo quando a lei sugere que não o façam, impondo assim, alguns “castigos” em relação ao patrimônio do casal.

Vale acrescentar que, desde março de 2019, pessoas com menos de 16 anos não podem casar sob nenhuma circunstância.

Menores de idade podem se casar? Confira o artigo sobre o assunto (clique aqui).

Assim, conforme dito acima, durante a relação o regime da separação obrigatória de bens funcionará de forma semelhante ao regime da separação total de bens (clique aqui).

Ao longo dos anos houve muita discussão a respeito das regras aplicáveis na dissolução das relações regidas por este regime de bens.

Por um longo período de tempo, para evitar que um dos cônjuges enriquecesse às custas do outro, prevaleceu o entendimento de que os bens adquiridos durante a união seriam presumidos como adquiridos pelo esforço comum do casal. Neste caso, existiria o direito à meação em relação a tais bens. Esta situação está prevista na súmula 377 do STF, que diz o seguinte: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”.

Porém, inúmeras discussões vieram à tona em relação à presunção do esforço comum, uma vez que, presumir que os bens adquiridos na constância da união são comuns, faz com que o regime obrigatório assemelhe-se ao da comunhão parcial.

Regime da Comunhão parcial de bens – clique aqui para ler.

Diante disso, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que é necessária a comprovação da participação no esforço para a aquisição onerosa de determinado bem que se pretende partilhar, ou seja, a presunção deixou de ser aplicada (EREsp 1171821/PR). Portanto, dependendo do caso, os envolvidos poderão, ou não, ter direitos sobre eventuais bens.

Outro ponto interessante se refere à sucessão: pessoas casadas sob o regime de separação obrigatória de bens não têm o direito de concorrer à herança do cônjuge caso este tenha descendentes (filhos, netos…). No entanto, caso o falecido não tenha descendentes, o cônjuge sobrevivente terá direito à herança, seja concorrendo com os ascendentes daquele (pais, avós…) ou, se não houve ascendentes, receberá a integralidade do patrimônio.

Embora haja certa discussão sobre alguns aspectos da separação obrigatória de bens, sendo a sua aplicação justa ou não, essas são as regras contidas na lei em relação ao referido regime de bens até o presente momento. Caso haja alguma novidade sobre o assunto, atualizaremos este artigo!

Arethusa Baroni

Laura Roncaglio de Carvalho 

Isabella Mady

__________________

1 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias . 9ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

Casamento: Posso casar com algum parente meu?

Posso casar com algum parente meu?

O casamento é a união voluntária de duas pessoas, nas condições sancionadas pelo Direito, a fim de se estabelecer uma família. Ele é um ato formal submetido a diversos requisitos previstos em lei.

Mas você sabia que não pode casar com qualquer pessoa? É isso mesmo, a nossa legislação prevê alguns impedimentos matrimoniais, dentre eles os resultantes do parentesco entre as pessoas.

E o que são impedimentos matrimoniais por parentesco?

Pois bem, sabe-se que, em tese, as pessoas são livres para se casarem. No entanto, a legislação prevê certos obstáculos com a intenção de “limitar a natural faculdade de casar”1. Esses “obstáculos” são chamados de impedimentos matrimoniais e estão previstos no artigo 1521 do Código Civil.

Os impedimentos matrimoniais podem ser classificados em três categorias principais: resultantes de parentesco, de casamento anterior e de prática de crime.

No presente artigo, vamos tratar somente sobre os impedimentos matrimoniais resultantes de parentesco. Lembre-se que, o parentesco pode ser em linha reta (descendentes e ascendentes), colateral (ligação entre duas pessoas com um ancestral comum) ou por afinidade – conforme veremos em seguida.

O grau de parentesco, caso haja dúvidas, é contado de acordo com o artigo 1594 do Código Civil: Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente”.

Vamos ver então quais são os impedimentos por parentesco?

De acordo com o artigo 1521 do Código Civil, não podem se casar:

I) os ascendentes com descendentes,

II) os parentes afins em linha reta,

III) o adotante com o cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante,

IV) os irmãos, colaterais até o terceiro grau e

V) o adotado com filho do adotante.

Temos então, que, de acordo com a lei, não podem se casar pais e filhos, avôs e netos… (linha reta, descendente).

Vale lembrar que, o parentesco nesse sentido pode ser biológico ou não (adoção ou socioafetividade), já que não se permite a diferenciação de filhos, independentemente de sua origem.

Para entender melhor sobre a socioafetivade leia o artigo a seguir: “Pai ou mãe é quem cria!”: Descubra como o Direito entende isso” (clique aqui)  

Esta proibição estaria relacionada ao fato de que “os estudos biológicos indicam uma alta probabilidade de malformações físicas e psíquicas das pessoas oriundas de relacionamentos entre parentes. Depois, por força da densidade moral social (coletiva)”2.

Além disso, conforme a previsão legal, não se permite o casamento de “parentes afins”. Mas, quem são eles?

Por certo, você já ouviu a expressão que diz que “sogra é para sempre”, não? A sogra é um exemplo de parente por afinidade.

Os parentes por afinidade, ou “afins”, são aqueles que se tornam nossos parentes em decorrência do casamento ou união estável (são parentes naturais do cônjuge ou do companheiro).

É estabelecido em lei que este vínculo de parentesco por afinidade não se dissolve com o divórcio. Esse é o motivo do “para sempre” contido na expressão mencionada acima.

Assim, tem-se que “dissolvido o casamento ou a união estável que deu origem à afinidade, o viúvo (ou ex-cônjuge) não pode casar com a sogra ou a enteada, porque o parentesco por afinidade em linha reta não se dissolve”3.

No tocante às demais proibições relacionadas aos filhos adotados (III e V), parece-nos que atualmente nem seria necessário que isso fosse expresso em artigo de lei, já que se trata de relação típica de parentesco, sem qualquer diferenciação – conforme supracitado – com os demais filhos, já abrangidos pela disposição antecedente.

Afora isso, temos a situação de casamento entre colaterais. Essa proibição atinge os irmãos, os tios e sobrinhos, “estendendo a pessoas mais distantes a proibição do incesto”4.

Há quem defenda que o impedimento para tios e sobrinhos não deve ser mantido, até porque hoje em dia há meios de verificar a compatibilidade sanguínea, evitando prejuízos à saúde da eventual prole (filhos)5. Há, de outro lado, a moral social.

Portanto, essa é uma questão que ainda gera divergências, em razão de entendimentos diferentes entre os operadores do Direito.

Em resumo, para facilitar o entendimento, podemos dizer que os impedimentos matrimoniais decorrentes de parentesco são os seguintes: ascendentes com descendentes e colaterais (até o terceiro grau), independentemente da origem da relação (biológica ou não), bem como parentes por afinidade, em linha reta.

Como a vedação do casamento vai até o terceiro grau, primos podem casar entre si, de acordo com a legislação.

Estes são os impedimentos matrimoniais decorrentes de parentesco. Para saber sobre os demais impedimentos (casamento anterior e prática de crime), continue acompanhando o Direito Familiar, pois serão tratados nos próximos artigos!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

__________________________________

1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

2 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

3 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

4 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

5 Enunciado nº. 98 da I Jornada de Direito Civil: O inc. IV do art. 1.521 do novo Código Civil deve ser interpretado à luz do Decreto-lei n. 3.200/41, no que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de 3º grau.

Sair da versão mobile