Adoção: um ato de amor!

Adoção! Está aí um tema que já apareceu em alguns dos nossos artigos!

Confira nossos artigos sobre adoção clicando aqui!

No post de hoje, no entanto, não queremos falar sobre questões legais relacionadas à adoção e nem explicar conceitos.

Queremos compartilhar com vocês uma história real! Uma história de amor!

Tivemos a oportunidade de conhecer e conversar com a Maria Cláudia! Ela foi adotada ainda bebê e nos contou um pouco sobre como foi o processo de adoção, como ela e a família lidaram com tudo isso.

Como o Direito Familiar gosta de compartilhar bons exemplos, viemos dividir com vocês este nosso bate-papo!

Mas antes disso, um agradecimento especial: Maria Cláudia, obrigada por aceitar dividir a sua história e da sua família com tantas pessoas! Você transbordou amor em cada palavra!

 

Adoção: um ato de amor!

DIREITO FAMILIAR: Maria Cláudia, como foi o processo de adoção? Quanto tempo durou?

MC: Como foi o meu processo de adoção? Pois bem, em 1992 meus pais se habilitaram para adoção na comarca de Rebouças, por incrível que pareça, eles eram os únicos da fila e no mesmo ano adotaram o meu irmão mais velho, Gil, que com dias de vida já estava morando com os meus pais, mas obviamente, em estágio de convivência, e só foi liberado e registrado formalmente alguns dias depois.

Por ele ser bebê o tempo de estágio de convivência foi mais curto, pois a adaptação é mais fácil. Meus pais continuaram habilitados e em 1995 eu nasci e desde bebê fui morar com eles também. O processo não demorou muito, antigamente o procedimento era mais simples.

DIREITO FAMILIAR: Você lembra como ficou sabendo que tinha sido adotada? Como foi esse momento?

MC: Quando pequena, sempre me fiz a pergunta: quando que meus pais me contaram que eu era filha adotiva?

Porque, para mim, parecia até que eu tinha nascido sabendo disso (risos). Certa vez, fiz esse questionamento aos meus pais, pois eu achava incrível eles terem me contado uma coisa dessas e eu não lembrar, não ter ficado uma marca desse momento. Foi então que meus pais disseram que desde que eu era bebê eles me contavam a nossa história, e quando eu fui ficando maiorzinha, já entendia bem e aquilo tudo soava perfeitamente natural.

DIREITO FAMILIAR: O que o ato de adotar significa para você?

MC: Para mim, o ato de adotar, significa amor, puro amor. Acredito que nasci de outra barriga, mas sempre fui filha deles, era para ser assim. A diferença é que tive um caminho diferente para chegar até eles.

Vejo tudo isso com muita naturalidade. Meu irmão mais velho é filho adotivo também e com ele foi a mesma coisa, tudo sempre muito tranquilo, nunca tivemos nenhum episódio de revolta, até porque nem temos motivo para isso. A nossa história nunca foi escondida, sempre soubemos exatamente o que tinha acontecido, e eu acredito que a verdade nessas horas é elemento fundamental, é um sinal que você, como pai, respeita a história de vida no seu filho, e que futuramente caberá a ele decidir o que fazer com essa informação.

DIREITO FAMILIAR: Hoje você trabalha em uma área que está ligada ao assunto, o que isso significa para você e como você enxerga o processo de adoção, hoje?

MC: Atualmente, eu trabalho na Vara da Infância e Juventude, que tem a Adoção como uma de suas competências para atuar. Desde o início, quando fui chamada para uma entrevista para estagiar lá, meu coração torcia com toda a força para que eu conseguisse, pois era algo que eu queria muito saber como funcionava. Muitas vezes, nós, filhos adotivos, nos fazemos diversos questionamentos, como: “porque minha mãe biológica não me quis?”, “como uma mãe faz isso com um filho?” E por eu trabalhar lá há quase dois anos, aprendi muita coisa, e através de outros casos tive respostas para alguns questionamentos que eu sempre me fiz. 

Hoje eu enxergo a adoção de uma maneira diferente, a adoção é um reencontro, é você ir visitar a criança e naquele momento sentir que seu filho nasceu, é por vezes, ter que esperar mais que 09 meses pra ter seu filho nos braços, mas ter a certeza, que dali pra frente, haja o que houver, seu filho vai ser atendido em todas as suas necessidades.

É importante ressaltar também que a adoção não é um ato de solidariedade, de compaixão, de pena, com aqueles que por qualquer motivo que seja, estejam nessa situação buscando por uma família. Adotar um filho não é igual brincar de boneca, que quando “ dá problema” a gente vai lá devolve e pega outra (embora, infelizmente, algumas famílias achem isso). Adotar é viver um sonho em conjunto, o sonho dos pais que tanto desejaram e esperaram por esse filho, e o sonho dessa criança que mais do que ninguém quis e sonhou em viver com uma família cheia de amor.

Depois de acompanhar várias adoções que se consolidaram de maneira incrível e outras que não foram tão boas assim, eu enxergo o processo de adoção de maneira mais crítica. Acho que os cursos preparatórios têm que ser mais extensos, muitos habilitados não estão preparados, não são preparados para tudo que vai vir. Os pais se deslumbram e idealizam o filho perfeito, muitas vezes esquecendo que várias crianças têm traumas e histórias muito fortes, que desencadeiam alguns comportamentos que exigem uma demanda muito maior. Outros, ainda acham que alguns comportamentos existem porque “é filho adotivo”, sendo que são comportamentos comuns de crianças e adolescentes, seja ele filho adotivo ou biológico.

DIREITO FAMILIAR: Você daria algum conselho para aquelas pessoas que foram adotadas mas que se incomodam com este fato?

MC: O conselho que eu dou para quem é filho adotivo e se incomoda com isso, é aceitar que a sua família e a sua vida são normais, assim como de qualquer outra pessoa. Que não existe diferença entre filho adotivo e filho biológico, é tudo fruto do amor. E, se por algum momento alguém não quis ou não pode ficar com você, durante toda uma vida, você teve uma família que te quis mais do que tudo em todos os dias desde que você apareceu para torná-la mais completa.

Aqui, dou um conselho também aos pais que escondem dos filhos a verdade, não há porque se preocupar, seu filho não vai lhe amar menos por causa disso; muito pelo contrário, ele vai admirá-lo ainda mais, e vai ter certeza de que é muito amado. Volto a dizer, não se pode tirar o direito de uma pessoa de saber a sua real história.

                                                  O amor não está ligado ao sangue, e sim ao coração.

Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
 

Casamento: Posso casar com algum parente meu?

Posso casar com algum parente meu?

O casamento é a união voluntária de duas pessoas, nas condições sancionadas pelo Direito, a fim de se estabelecer uma família. Ele é um ato formal submetido a diversos requisitos previstos em lei.

Mas você sabia que não pode casar com qualquer pessoa? É isso mesmo, a nossa legislação prevê alguns impedimentos matrimoniais, dentre eles os resultantes do parentesco entre as pessoas.

E o que são impedimentos matrimoniais por parentesco?

Pois bem, sabe-se que, em tese, as pessoas são livres para se casarem. No entanto, a legislação prevê certos obstáculos com a intenção de “limitar a natural faculdade de casar”1. Esses “obstáculos” são chamados de impedimentos matrimoniais e estão previstos no artigo 1521 do Código Civil.

Os impedimentos matrimoniais podem ser classificados em três categorias principais: resultantes de parentesco, de casamento anterior e de prática de crime.

No presente artigo, vamos tratar somente sobre os impedimentos matrimoniais resultantes de parentesco. Lembre-se que, o parentesco pode ser em linha reta (descendentes e ascendentes), colateral (ligação entre duas pessoas com um ancestral comum) ou por afinidade – conforme veremos em seguida.

O grau de parentesco, caso haja dúvidas, é contado de acordo com o artigo 1594 do Código Civil: Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente”.

Vamos ver então quais são os impedimentos por parentesco?

De acordo com o artigo 1521 do Código Civil, não podem se casar:

I) os ascendentes com descendentes,

II) os parentes afins em linha reta,

III) o adotante com o cônjuge do adotado e o adotado com quem foi cônjuge do adotante,

IV) os irmãos, colaterais até o terceiro grau e

V) o adotado com filho do adotante.

Temos então, que, de acordo com a lei, não podem se casar pais e filhos, avôs e netos… (linha reta, descendente).

Vale lembrar que, o parentesco nesse sentido pode ser biológico ou não (adoção ou socioafetividade), já que não se permite a diferenciação de filhos, independentemente de sua origem.

Para entender melhor sobre a socioafetivade leia o artigo a seguir: “Pai ou mãe é quem cria!”: Descubra como o Direito entende isso” (clique aqui)  

Esta proibição estaria relacionada ao fato de que “os estudos biológicos indicam uma alta probabilidade de malformações físicas e psíquicas das pessoas oriundas de relacionamentos entre parentes. Depois, por força da densidade moral social (coletiva)”2.

Além disso, conforme a previsão legal, não se permite o casamento de “parentes afins”. Mas, quem são eles?

Por certo, você já ouviu a expressão que diz que “sogra é para sempre”, não? A sogra é um exemplo de parente por afinidade.

Os parentes por afinidade, ou “afins”, são aqueles que se tornam nossos parentes em decorrência do casamento ou união estável (são parentes naturais do cônjuge ou do companheiro).

É estabelecido em lei que este vínculo de parentesco por afinidade não se dissolve com o divórcio. Esse é o motivo do “para sempre” contido na expressão mencionada acima.

Assim, tem-se que “dissolvido o casamento ou a união estável que deu origem à afinidade, o viúvo (ou ex-cônjuge) não pode casar com a sogra ou a enteada, porque o parentesco por afinidade em linha reta não se dissolve”3.

No tocante às demais proibições relacionadas aos filhos adotados (III e V), parece-nos que atualmente nem seria necessário que isso fosse expresso em artigo de lei, já que se trata de relação típica de parentesco, sem qualquer diferenciação – conforme supracitado – com os demais filhos, já abrangidos pela disposição antecedente.

Afora isso, temos a situação de casamento entre colaterais. Essa proibição atinge os irmãos, os tios e sobrinhos, “estendendo a pessoas mais distantes a proibição do incesto”4.

Há quem defenda que o impedimento para tios e sobrinhos não deve ser mantido, até porque hoje em dia há meios de verificar a compatibilidade sanguínea, evitando prejuízos à saúde da eventual prole (filhos)5. Há, de outro lado, a moral social.

Portanto, essa é uma questão que ainda gera divergências, em razão de entendimentos diferentes entre os operadores do Direito.

Em resumo, para facilitar o entendimento, podemos dizer que os impedimentos matrimoniais decorrentes de parentesco são os seguintes: ascendentes com descendentes e colaterais (até o terceiro grau), independentemente da origem da relação (biológica ou não), bem como parentes por afinidade, em linha reta.

Como a vedação do casamento vai até o terceiro grau, primos podem casar entre si, de acordo com a legislação.

Estes são os impedimentos matrimoniais decorrentes de parentesco. Para saber sobre os demais impedimentos (casamento anterior e prática de crime), continue acompanhando o Direito Familiar, pois serão tratados nos próximos artigos!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

2 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

3 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

4 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

5 Enunciado nº. 98 da I Jornada de Direito Civil: O inc. IV do art. 1.521 do novo Código Civil deve ser interpretado à luz do Decreto-lei n. 3.200/41, no que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de 3º grau.

Inventário: herança do cônjuge ou companheiro/a conforme o regime de bens

Vou receber herança se meu marido/esposa/companheiro(a) falecer?”

O Direito Sucessório é uma das áreas que pode gerar mais dúvidas nas pessoas que não atuam na área, pois existem vários detalhes que precisam ser considerados a fim de que se possa dar um parecer sobre qualquer situação. A partilha de bens no inventário é diferente da que acontece no divórcio e há diversas circunstâncias importantes a serem ponderadas.

A dúvida acima é uma das que mais aparece e, quando ela surge, o primeiro ponto que deverá ser analisado é o regime de bens do casamento ou da união estável mantida pelo indivíduo.

No artigo “Inventário: Ordem sucessória” (clique aqui) – explicamos sobre a ordem sucessória, ou seja, quem são os herdeiros de uma pessoa quando ela falece.

No artigo “Quais são os regimes de bens existentes?” tratou-se sobre cada um dos regimes para que você tenha conhecimento acerca deles.

O objetivo deste artigo é explicar brevemente como funcionará a partilha de bens decorrente do falecimento de um dos cônjuges ou companheiros/as em cada um dos regimes de bens. No entanto, antes de dar início às explicações, é preciso chamar a atenção para o fato de que cada caso deverá ser analisado de acordo com suas particularidades (pode haver contratos, dívidas, financiamentos, doações, irregularidades, inventários anteriores… muitas hipóteses. E nem todas poderão ser abarcadas aqui, já que o assunto será tratado de forma geral).

As informações mais importantes, além do regime de bens do casamento ou da união estável, estão relacionadas à aquisição do patrimônio. Por exemplo, é necessário verificar a data de início da união e a data de aquisição dos bens, a fim de constatar se ele será partilhado ou não. Além disso, é importante verificar, também, a existência de filhos (que podem ser vivos ou já falecidos), pais vivos, e várias outras possibilidades.

Por isso, desde já deixamos claro que este artigo tem o objetivo de facilitar a compreensão dos leitores sobre o assunto de uma forma ampla. Para esclarecimentos sobre casos específicos, recomenda-se buscar o auxílio de advogados/as especializados/as na área de Direito das Sucessões, que poderão analisar cuidadosamente o caso concreto e suas variáveis.

Feitas tais considerações, passa-se à explicação, de maneira objetiva, acerca de como será analisada a questão patrimonial de uma pessoa que falece que era casadaou que vivia em união estávele que tinha filhos, conforme os regimes de bens que regem o casamento ou a união.

Regime de Comunhão Parcial de bens

Antes de tudo, devemos sempre lembrar que no regime da comunhão parcial de bens existem os bens comuns e os particulares.

Confira a lista de bens comuns e particulares clicando aqui (clique aqui)

Você também pode ler especificamente sobre o inventário na comunhão parcial de bens clicando aqui.

Com o falecimento de um dos cônjuges/companheiros/as, o sobrevivente terá direito à meação (50%) dos bens comuns.

Mas e o restante dos bens? Não há herança? Há herança sim!

Além de meeiro, o cônjuge ou companheiro/a sobrevivente será herdeiro/a também. Isso porque, quando falamos em sucessão no regime da comunhão parcial de bens, o cônjuge concorre (divide o patrimônio) com os demais herdeiros/as legítimos do de cujus (falecido), mas isso em relação aos bens particulares.

Seguem abaixo ilustrações para facilitar a compreensão:

BENS COMUNS

BENS PARTICULARES

Regime de Separação Total de bens

Em relação ao regime de separação total de bens, o entendimento majoritário (da maioria) é de que o cônjuge/companheiro/a será herdeiro/a, concorrendo com os filhos, ou seja, não receberá necessariamente a metade do patrimônio.

Para saber mais sobre o regime da separação total de bens, confira o artigo sobre esse regime clicando aqui.

Poucos são os que têm o entendimento contrário a esse. Quem adota o posicionamento contrário entende que, se o casal escolheu não compartilhar dos seus bens enquanto estavam vivos, essa escolha também deve ser levada em conta no caso de falecimento de um deles. Para quem pensa assim, um não é herdeiro do outro, ou seja, não terá direito a nada da herança dele.

Porém, é uma situação que não está com o entendimento consolidado pelos tribunais, ainda há muita divergência e, por isso, o desfecho do caso vai depender do entendimento de quem estiver analisando.

De qualquer forma, adotando-se o entendimento de que o cônjuge ou companheiro/a será herdeiro/a, aquele que sobreviver terá o direito de receber a herança deixada pelo falecido/a.

Considerando que todos os bens deixados pelo cônjuge/companheiro/a que faleceu são particulares, o sobrevivente concorrerá com os filhos/as em igual proporção, conforme imagem abaixo:

Regime de Comunhão Universal de bens

Se o cônjuge ou companheiro/a e a pessoa que faleceu optaram pelo regime da comunhão universal de bens, aquele que sobreviveu não será herdeiro, apenas meeiro.

Isso acontece porque, automaticamente, 50% do patrimônio total de um dos cônjuges/companheiro que faleceu já pertence ao sobrevivente, a título de meação.

Para entender melhor qual é diferença entre “herdeiro” e “meeiro”, clique aqui.

Podemos observar que o artigo 1829 do Código Civil não faz ressalva quanto à existência, ou não, de bens particulares, como faz ao mencionar o regime da comunhão parcial.

Segue ilustração abaixo para facilitar a compreensão:

PATRIMÔNIO TOTAL

Regime da Separação Obrigatória/legal de bens

Em tese, ao ler o artigo 1829 do Código Civil, veremos que as mesmas regras que se aplicariam ao regime da comunhão universal de bens, serviriam também ao regime da separação obrigatória em relação ao fato de o cônjuge ou companheiro/a não ser herdeiro daquele que faleceu.

O Supremo Tribunal Federal (STF) editou a Súmula 377, que diz o seguinte: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento.” A justificativa para a criação desta súmula foi a de evitar que a imposição legal gere enriquecimento ilícito do cônjuge ou companheiro(a) que, na prática, administra o patrimônio familiar; em detrimento do outro, que apesar de contribuir direita ou indiretamente com a constituição do patrimônio, não o possui em seu nome.

Por conta disso, durante um longo período prevaleceu o entendimento no sentido de que os bens adquiridos na constância da união seriam presumidos como adquiridos pelo esforço comum do casal. Ocorre que, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do julgamento do EREsp 1171820/PR, decidiu que, para a incidência da Súmula 377 do STF, “caberá ao interessado comprovar que teve efetiva e relevante (ainda que não financeira) participação no esforço para aquisição onerosa de determinado bem a ser partilhado com a dissolução da união (prova positiva)”. 

Entende-se, pois, que deve ser realizada uma análise caso a caso, levando em conta se existem bens adquiridos durante a união e se há provas acerca da contribuição de ambos na aquisição do patrimônio. 

Veja abaixo:

BENS PARTICULARES (ANTERIORES A UNIÃO)

Regime de Participação Final nos Aquestos

O regime da participação final nos aquestos é um regime de difícil aplicação, pois exige um controle contábil minucioso.

Para ler mais sobre a participação final nos aquestos, clique aqui.

No caso da sucessão, o entendimento é de que ela acontecerá da mesma forma em que se dá a sucessão na comunhão parcial de bens, tendo em vista que ocorrerá a meação em relação ao bens comuns e herança sobre os bens particulares. No entanto, para apurar os aquestos, será necessária a realização de uma apuração contábil a fim de delimitá-los.

Feitos tais esclarecimentos sobre os regimes de bens, devemos reforçar que os Tribunais e operadores do Direito têm entendimentos diferentes sobre o assunto. Por isso, uma mesma situação pode ter resultados diferenciados, a depender do entendimento daqueles que estão atuando no processo.

Ainda, frise-se que, nos exemplos apresentados, foi considerada a seguinte situação: casal com dois filhos comuns do casamento (ou união estável). Importante esclarecer tal ponto, pois, como dito acima, muitos fatores influenciam na análise do caso concreto, como um número maior de herdeiros e/ou a existência de filhos da pessoa que faleceu nascidos de outro relacionamento.

Dito isso, reforça-se a importância de buscar o auxílio de profissionais especializados em Direito de Família e Sucessões, para que a situação seja analisada cuidadosamente, considerando todos os detalhes relacionados ao caso.

Advogado(a): precisa elaborar um pedido de abertura de inventário? Confira os modelos de petição disponíveis na loja do Direito Familiar (clique aqui)!

Arethusa Baroni

Laura Roncaglio de Carvalho

Empatia aplicada ao Direito de Família!

EMPATIA!

Está aí uma palavra cujo significado é desconhecido por muitas pessoas, mas, talvez, muitas já tenham sido empáticas e não se deram conta, por não saberem seu significado.

Se depois da leitura deste texto, você chegar à conclusão de que é uma pessoa que demonstra empatia, que bom! Aproveite para compartilhar a reflexão e continue assim! O mundo está precisando de empatia!

No entanto, se você se der conta de que não é uma pessoa empática, deixamos desde já nossa sugestão: PRATIQUE A EMPATIA, diariamente! Reflita sobre suas atitudes e comportamento.

Mas vamos lá! Afinal, o que é EMPATIA, Direito Familiar?

Segundo Brené Brown (ph.D. em serviço social; pesquisadora na Universidade de Houston; professora e palestrante premiada), empatia é sentir com as pessoas!

De uma maneira bem objetiva, podemos dizer que é a capacidade de se colocar no lugar dos outros, ou seja, sentir o que os outros estão sentindo, livre de julgamentos. É perceber as situações sem colocar o seu próprio juízo de valores naquilo.

Demonstrar empatia não significa tentar solucionar o problema do outro de forma rápida, mas sim compreender o que aquela pessoa está sentindo.

Para exemplificar o que estamos tentando explicar, vamos utilizar algumas situações que não demonstram empatia:

Maria diz para Ana: “Estava grávida, mas perdi meu bebê.”
Ana diz para Maria: “Ah, mas veja pelo lado bom, pelo menos você já sabe que consegue engravidar.”

João diz para Pedro: “Quebrei meu pé no futebol. Não poderei jogar bola pelos próximos meses.”
Pedro diz para João: “Poderia ser pior, você poderia ter quebrado os dois pés!” Ou “Melhor isso do que eu, que estou com problema no joelho e talvez não volte nunca mais a jogar futebol”.

Joana diz para Carlos: “Amor, o Pedrinho não está indo bem na escola.”
Carlos diz para Joana: “Pelo menos a Paulinha não nos dá problemas com os estudos.”

Agora coloque-se no lugar das pessoas que expuseram seus problemas. Será que as respostas dadas ajudam em alguma coisa? Mudam o sentimento da pessoa ou, ainda, resolvem as angústias compartilhadas?

Cremos que não, não é mesmo?

Competir com a dor da pessoa, minimizar o sentimento dela como se houvesse problemas maiores com que se preocupar, ou dizer que aquilo não é tão ruim quanto parece, são bons exemplos de falta de empatia.

Ter empatia, significa “vestir os sapatos dos outros e caminhar o caminho que eles percorreram”. Ou seja, busque compreender o sentimento do outro a partir do ponto de vista dele, não do seu. Imagine como seria estar no lugar daquela pessoa, coloque-se na situação dela.

Se sentir dificuldade, você pode relacionar a experiência do outro a alguma situação que desencadeou sentimentos parecidos em você. 

Você pode olhar para a pessoa e falar apenas “eu compreendo o que você está sentindo”, “eu compartilho desse sentimento”, “eu entendo sua dor, conte comigo”, “estou do seu lado”. Ou, pode apenas ouvi-la, sem interferências. Às vezes, tentar aconselhar alguém que está expondo a sua vulnerabilidade pode parecer uma forma de oferecer empatia, mas nem sempre é.

Se você realmente quiser compartilhar algo que vivenciou, o faça apenas se achar que ajudará ou acalmará a pessoa, e sempre depois de ouvi-la. Do contrário, você correrá o risco de entrar no “rol” da competição de sentimentos e emoções.

Ainda, devemos ressaltar que empatia é diferente de simpatia. Demonstrar empatia não tem nada a ver com ser simpático!

Trazendo a questão da empatia para o Direito, podemos dizer que, tanto para profissionais que atuam na área do Direito de Família, quanto para as pessoas que estão envolvidas em processos judiciais com conflitos familiares, praticar a empatia é algo de grande valor e extremamente necessário.

Ao nos colocarmos no lugar do outro, podemos enxergar as coisas de outra maneira, encontrar o que realmente ocasionou aquele conflito e procurar as soluções adequadas para diminuir a animosidade entre as partes. É um exercício que pode apresentar certo grau de dificuldade, mas proporciona uma reflexão muito importante e pode apresentar resultados positivos para todos os envolvidos.

Pensemos na seguinte situação: um casamento veio abaixo após a descoberta de uma traição.

Ao consultar um advogado, a parte traída, que está muito abalada com tudo, escuta a seguinte frase: “pelo menos vocês não tiveram filhos.”

Caros advogados, será que ter tido filhos, ou não, minimizaria a dor daquela pessoa? Reflitam!

Prestar atenção a como você reage às emoções que lhe estão sendo abertas pelo seu cliente, com certeza refletirá na relação profissional que vocês terão. Seu cliente deve sentir que está sendo ouvido, e compreendido; o que lhe dará segurança de que você está absorvendo os sentimentos dele e o momento que ele está passando, estando, portanto, apto a apresentar alternativas para solucionar o caso.

Durante o atendimento, tentem fazer uma leitura corporal dos seus clientes, a fim de constatar movimentos de ansiedade, insegurança, retração. Tente deixar seu cliente confortável, para que converse abertamente com você, faça perguntas que demonstrem interesse em saber como seu cliente está se sentindo frente à situação, esteja presente quando ele estiver falando.

E estar presente não significa estar apenas fisicamente presente, significa destinar seu tempo ao cliente, ouvindo-o, sem executar outras tarefas, sem mexer no celular, analisar documentos. Preste atenção no seu cliente, no que está sendo dito por ele!

No vídeo abaixo(1), Brené Brown explica a empatia utilizando uma animação super didática!

Confira!

Conceituar a empatia não é uma tarefa fácil e colocá-la em prática muitas vezes também não é, pois estamos acostumados a rotular situações e fazer pré julgamentos de pessoas e atitudes.

A empatia é um exercício que deve ser praticado diariamente!

E aí? Vamos praticar?

 
Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
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(1) Vídeo extraído do canal do YouTube: <https://www.youtube.com/watch?v=4CU9rjC0R2Y>

Constelação Familiar: “Minha Experiência com a Constelação”

A Constelação Sistêmica é um tema que tem sido bastante estudado atualmente e, constantemente, é relacionado ao Direito de Família. Isso porque foi desenvolvida a técnica da Constelação Sistêmica Familiar, como uma alternativa para a tentativa de resolução de conflitos, e ela permite identificar problemas pessoais que se encontram além da esfera jurídica.

No artigo “O que é Constelação Sistêmica Familiar?”, explicamos como funciona a aplicação desta técnica:

Esse método tem sido aplicado por alguns Tribunais e, por contribuir para que as pessoas identifiquem os seus reais problemas e consigam resolvê-los de forma mais satisfatória – melhorando as relações familiares – auxilia, também, na resolução dos processos judiciais de maneira mais rápida e eficiente, diminuindo, inclusive, a intervenção do Judiciário na esfera pessoal de cada um, especialmente no que diz respeito ao Direito de Família.”

Mesmo com todas as explicações, muitos continuam se questionando sobre o método. Por isso, resolvemos trazer um caso real de uma pessoa que participa de sessões de constelação com pessoas, para contar a vocês como é a experiência!

Frisamos o “com pessoas”, pois as sessões podem ser feitas com bonecos servindo como representantes (como na foto que ilustra o artigo) e até mesmo com cavalos, por serem considerados animas extremamente sensíveis.

Confira abaixo nosso bate-papo com P*, cujo nome será preservado por motivos pessoais!

Minha Experiência com a Constelação Sistêmica Familiar”

Direito Familiar: Olá, P*, conta pra gente, como e quando você conheceu a técnica da Constelação Sistêmica Familiar?

P*: Conheci há aproximadamente 1 ano, talvez um pouco mais. Pedi uma indicação de alguma “terapia” alternativa para uma amiga, e ela me indicou a constelação. No começo, não dei muita importância, mas aos poucos comecei a pesquisar mais sobre o método, e participo de constelações frequentemente há mais ou menos 6 meses.

Direito Familiar: O que te fez ir atrás desse método?

P*: Sou muito ligada às questões energéticas que nos rodam neste mundo. Eu estava com um problema não resolvido e já tinha tentado outras formas de terapia, que muito me ajudaram. Mas por algum motivo, eu sentia que esse problema precisava de uma “solução” complementar. Assim, cheguei na constelação.

Direito Familiar: Você já participou como representante? Como foi a experiência?

(Obs.: Quando você é o representante, você não coloca uma questão sua em tela, apenas participa do método para contribuir na resolução da questão de outra pessoa.)

P*: Sim, desde a primeira vez já fui escolhida para representar. É uma experiência incrível, pois a energia envolvida é muito grande, quase palpável. Quem olha de fora, muitas vezes, não consegue sentir a dimensão. Só mesmo estando participando é que podemos sentir as vibrações, energias, sentimentos que afloram de forma involuntária. É uma entrega total.

Direito Familiar: Você já foi a pessoa “constelada”? Como foi?

P*: Também já levei uma situação minha para que fosse constelada. A experiência para mim foi muito válida, pois pude olhar como espectadora para aquela questão, e ter um certo distanciamento emocional daquilo tudo que estava sendo ali representado. Isso me permitiu ter maior consciência racional do que estava acontecendo e, consequentemente, pude entender como agir. Também pude enxergar alguns “nós” emocionais que não era possível enxergar quando eu estava olhando o problema de dentro, como protagonista.

Direito Familiar: Você já havia utilizado algum outro método para lidar com a situação relacionada a você?

P*: Eu fiz terapia “convencional” por aproximadamente 3 anos. Foi essencial para que eu aprofundasse o conhecimento sobre mim mesma. Me ajudou profundamente a identificar meus sentimentos e saber como agir, ou reagir, diante deles, nas mais diversas questões que enfrento na vida diariamente.

Direito Familiar: O que a constelação representou/representa para você?

P*: Acredito que a constelação representa justamente esse “olhar de fora”, esse distanciamento que às vezes é necessário para que possamos enxergar as coisas de outro ângulo, para agirmos de forma mais assertiva e consciente.

Direito Familiar: Qual o seu nível de satisfação em relação a utilização da técnica? Você recomenda a experiência?

P*: Eu estou muito satisfeita com a técnica. É preciso saber separar a técnica em si para não associá-la ao meu problema. Esse sim ainda não foi resolvido por completo, mas isso não tem nada a ver com a técnica. Então eu recomendo sim, mas para aqueles que estão dispostos a olhar de peito aberto para uma coisa que não é muito convencional na nossa sociedade, e principalmente para aqueles que acreditam que tudo nesse mundo envolve energia. Para que funcione, é preciso estar entregue e acreditar!

E aí? O que você achou?

Já pensou em utilizar a técnica? Já participou de uma sessão?

Conta pra gente! Divida sua experiência e suas percepções sobre o tema!

Clique aqui para nos enviar sua mensagem!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Transgênero: como alterar o nome e o sexo no registro civil?

Atualmente, o assunto “transgênero” tem feito parte de muitos diálogos entre juristas e não juristas, sendo inclusive abordado em telenovelas que passam no horário nobre da televisão brasileira. Quem assiste a novela “A Força do Querer”, transmitida pela Rede Globo, tem acompanhado o drama vivido pela personagem Ivana, que se descobriu transgênero e está dando início à transição, já que pretende ser reconhecida como Ivan.

Falar sobre esse assunto é muito importante! Por isso, o Direito Familiar não poderia ficar de fora dessa! Além do que, precisamos manter nossos leitores atualizados!

De maneira resumida e objetiva, os transgêneros são pessoas que sentem claramente que não são do gênero que fisicamente parecem ser. Antigamente, isso era tratado como um transtorno mental, de “disforia de gênero”.  Porém, em 2018, a Organização Mundial da Saúde publicou uma nova edição da Classificação Internacional de Doenças, na qual a transexualidade foi retirada da lista de transtornos mentais. Ainda assim, ela permaneceu como “incongruência de gênero”, passando a ser vista, contudo, como uma condição relativa à saúde sexual (assim como disfunção erétil ou outras condições).

A pessoa transgênero terá, por exemplo, todas as características físicas de uma mulher – seios, órgãos genitais femininos – no entanto, não se identificará com seu corpo, desejando ter um corpo mais masculino e, ser aceita socialmente. O inverso também pode acontecer, ou seja, em relação àquele que apresenta características físicas masculinas, mas se reconheceria melhor em um corpo feminino.

Frise-se que, o transtorno da identidade sexual não tem a ver com orientação sexual, ou seja, com se relacionar com homem ou mulher. É preciso separar as coisas.

O tema é bastante complexo, motivo pelo qual o objetivo do presente artigo, é, tão somente, explicar como funciona a retificação (correção) do nome e do sexo, no registro civil de pessoas transgêneros.

RETIFICAÇÃO DO NOME:

Manter o prenome(aquele que vem antes do sobrenome)constante no registro civil, para quem sofre de Disforia de gênero, fere gravemente o princípio da dignidade da pessoa. Isso porque,no meio social ela acaba sendo vista e chamada por um nome, enquanto que no seu registro constará nome que diverge de sua aparência.

Explicar no que se baseia a dignidade da pessoa é tarefa difícil, mas é certo que a felicidade é desejo de todo ser humano. Para o transexual, a felicidade está estreitamente ligada ao ajuste da sua realidade psíquica com a biológica. Negar isso seria ignorar a realidade psicológica do indivíduo e condená-lo à infelicidade dentro de um corpo que não reconhece como seu.

Por exemplo, para uma pessoa que na verdade se sente do sexo masculino, manter o nome feminino nos documentos, dificulta sua inserção social, fazendo com que possa vira passar por situações constrangedoras.

Sabe-se que, de acordo com a Lei de Registros Públicos, é permitida a alteração de nome em casos que ele acaba por expor a pessoa ao ridículo, e, portanto, a lei permite essa mutabilidade para garantir a dignidade dos cidadãos.

Vamos usar como exemplo a personagem da novela: Ivana se identifica com o gênero masculino, veste-se como tal e está inclusive fazendo tratamento hormonal a fim de adquirir características masculinas. Ora, por que não adequar seu nome à sua real identificação? Assim, Ivana passará a ser reconhecida como Ivan.

A retificação do nome no registro civil, visando adequar sua identificação à sua verdadeira identidade, influirá de forma decisiva na efetivação de sua cidadania e dignidade, evitando situações vexatórias.

RETIFICAÇÃO DO SEXO:

No que diz respeito à possibilidade de alteração do nome em registro, vimos acima que não há controvérsias e ela pode acontecer. Em relação à adequação do sexo no registro civil, porém, podemos encontrar diferentes entendimentos sobre o assunto.

Esta adequação consiste em alterar o “masculino/feminino” contido no registro de nascimento, para que fique de acordo com a nova identidade da pessoa.

No entanto, há operadores do Direito que entendem que, para corrigir o sexo da pessoa em seu assento de nascimento, é necessária a realização de cirurgia de transgenitalização.

Vamos aos posicionamentos:

Necessidade de cirurgia:

Os que seguem tal entendimento acreditam que os documentos públicos devem conter informações verdadeiras,de modo que, se o sujeito não realizou a cirurgia de mudança de sexo, o nome pode ser alterado, mas o gênero (masculino/feminino) deve permanecer o mesmo no documento, por ser o que representa a “verdade” biológica.

Assim, a alteração quanto ao sexo do indivíduo no registro só poderia acontecer quando ficar comprovado que aquele que pretende a alteração já realizou a cirurgia de redesignação de sexo (anatômico).

Ainda, para estes Operadores do Direito, a certidão de nascimento é um documento que visa atestar o nascimento de uma criança do sexo morfologicamente feminino ou masculino – ou seja, que possui os órgãos sexuais masculinos ou femininos no momento do nascimento.

Quem adota esse posicionamento também defende que manter o sexo no registro de nascimento não colocará a pessoa em situação de constrangimento, já que a maioria dos documentos de porte corriqueiro (RG, CPF, título de eleitor e carteira de motorista) não trazem informações quanto ao sexo da pessoa, bastando a alteração do prenome para que esteja em conformidade com a sua aparência.

Esse entendimento não é o da maioria e os Tribunais, grife-se, têm entendido de maneira diversa, conforme veremos abaixo.

Desnecessidade de cirurgia:

Segundo esta corrente, para que a retificação do sexo no registro civil ocorra, não é necessária a realização da cirurgia de transgenitalização.

Tal assunto inclusive foi tratado junto à 1ª Jornada de Direito da Saúde, promovida pelo Conselho Nacional de Justiça, na qual foram elaborados enunciados nos quais os julgadores podem se basear, dispensando a necessidade da cirurgia.

Ainda, a Constituição Federal tem como objetivos fundamentais a extinção das desigualdades sociais e o respeito à dignidade, de modo que, pessoas transgênero encontram-se constitucionalmente protegidas e possuem direito de viver sem a influência de preconceitos.

A afirmação da identidade de gênero compreende a realização do direito à vida digna, refletindo a realidade vivenciada por cada um, sem discriminações ou direitos negados.

Para os adeptos deste posicionamento, considera-se, também, que existem transexuais que não têm interesse em adequar a sua genitália à sua identidade de gênero. Tal escolha pode advir tanto de aspectos econômicos, da própria convicção pessoal ou religiosa, dos riscos possíveis da cirurgia e até de resultados insatisfatórios.

Manter no assento/registro de nascimento o sexo da pessoa transgênero, em detrimento de sua atual realidade psicossocial e morfológica, criaria obstáculos à inserção social e impediria a prática dos atos da vida civil (qualquer ato que exija a apresentação de documentos de identificação) de maneira digna, ou seja, sem que tenha de passar por situações constrangedoras.

Podemos imaginar, por exemplo, que a pessoa que não tenha cirurgia e, por isso, tenha eventualmente negado o pedido em relação à alteração do sexo no documento, acabaria tendo que prestar certas explicações quando do preenchimento de formulários, matrículas, etc. – já que o nome não corresponderia ao sexo declarado ali. É esse tipo de situação que se quer evitar – independentemente da realização de cirurgia.

Negar a alteração, pois, seria ignorar a realidade psicológica do indivíduo e, por conseguinte, condená-lo à infelicidade dentro de um corpo que não vê como seu.

Devemos observar que o procedimento de retificação de nome e sexo deverá correr judicialmente e deverão ser apresentados laudos psiquiátricos, psicológicos, endocrinológicos, que atestem a disforia de gênero; bem como certidões emitidas por cartórios distribuidores, de antecedentes criminais e cartórios eleitorais, a fim de verificar eventuais pendências no nome da pessoa que pretende alterá-lo.

Tal cuidado serve para garantir direitos de terceiros, tendo em vista que as retificações dificultariam a localização e correta identificação da pessoa.

ATUALIZAÇÃO:

Recentemente, o STF deu seu posicionamento sobre o tema, e, pelo julgamento da ADI 4275, reconheceu aos transgêneros a possibilidade de alteração de registro civil sem mudança de sexo!

Confira a notícia com detalhes da decisão: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=371085

Ainda, a Corregedoria Nacional de Justiça publicou o Provimento 73/2018, que normatiza a alteração dos documentos dos transgêneros, permitindo que seja realizada diretamente nos cartórios. 

 

Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho

Procuração: o que é e para que serve?

Você sabe o que é procuração? Geralmente quando as pessoas precisam entrar com algum processo judicial, uma das primeiras coisas com a qual se deparam quando conversam com um advogado é a necessidade de “assinar uma procuração”.

Mas afinal, o que é isso?

Para que o advogado possa representar o seu cliente no processo judicial, é necessário que a ele sejam concedidos poderes para atuar em seu nome. Ou seja, a procuração – no âmbito jurídico – é uma autorização que o cliente dá ao seu advogado para que ele possa praticar todos os atos necessários dentro do processo. É somente com a procuração assinada pelo cliente que o advogado pode iniciar e dar continuidade ao processo.

A procuração é, portanto, um documento formal e legal, que pode ser realizada por instrumento público (em cartório) ou particular. Nesse último caso (particular), a assinatura de quem confere os poderes (o cliente, no caso dos processos judiciais) é essencial, sendo em alguns casos necessário também o reconhecimento de firma.

Geralmente, nos processos judiciais, as procurações são “ad judicia”, ou seja, elas concedem poderes gerais para o advogado agir no processo (como apresentar contestação, comparecer em audiência, arrolar testemunhas, apresentar documentos, etc.).

Porém, para que o advogado possa praticar alguns atos específicos, é preciso que na procuração também constem poderes especiais. Estes atos estão enumerados no artigo 1051 do Novo Código de Processo Civil, quais sejam:

receber citação

confessar

reconhecer a procedência do pedido,

transigir

desistir

renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação

receber e dar quitação

firmar compromisso

assinar declaração de hipossuficiência econômica.

Vale lembrar que, por serem poderes específicos, não é necessário que todos eles constem da procuração, podem ser colocados apenas alguns deles (por exemplo – para receber citação). Neste caso, o ideal é conversar com o seu advogado para determinar exatamente o que será necessário ser praticado no processo, além dos poderes gerais acima mencionados.

Para que seja válida, a procuração deve conter o nome do advogado, o número de inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil e o endereço completo. Caso o advogado faça parte de uma sociedade de advogados, a procuração também deve conter o nome da sociedade, o número de registro na Ordem dos Advogados do Brasil e o endereço completo. Além disso, é necessário conter todos os dados do outorgante (no caso, do cliente).

Em regra, a procuração outorgada ao advogado é eficaz para todas as fases do processo, inclusive para o cumprimento de sentença (execução). Somente não será assim se houver menção expressa na procuração de que ela só é eficaz para determinadas fases (por exemplo, deve estar expresso na procuração que ela só será eficaz até a sentença do Juiz de primeiro grau ou que somente serve para aquela ação).

E ai? Entendeu qual seria o conceito e a importância de uma “procuração” para o meio jurídico? Se você tiver dúvidas sobre outros termos, verifique os artigos “10 termos jurídicos para entender melhor seu processo!” ou “11 termos jurídicos para entender melhor seu processo!”. Caso não encontre o termo que procura lá, escreva para a gente com sua pergunta! Pode ser por e-mail ou em nossas redes sociais!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1Art. 105/CPC. A procuração geral para o foro, outorgada por instrumento público ou particular assinado pela parte, habilita o advogado a praticar todos os atos do processo, exceto receber citação, confessar, reconhecer a procedência do pedido, transigir, desistir, renunciar ao direito sobre o qual se funda a ação, receber, dar quitação, firmar compromisso e assinar declaração de hipossuficiência econômica, que devem constar de cláusula específica.

União estável e casamento entre pessoas do mesmo sexo

o sexo é tão inerente ao ser humano como respirar, amar, ou sofrer. 

Pena que alguns teimem em transformá-lo em tabu.” 

(RODRIGUES, Humberto).

 

A possibilidade de uniões estáveis e de casamento entre pessoas do mesmo sexo é um assunto que já gerou muita polêmica. Aqui, no Direito Familiar, nunca foi escrito um artigo especificamente sobre isso, por entendermos que o casamento – e a união estável – de homossexuais, em nada difere das demais entidades familiares.

No entanto, para aqueles que se interessam pela matéria, achamos que seria pertinente tecer uma explicação de como essas uniões passaram a ser reconhecidas efetivamente pelo ordenamento jurídico brasileiro. Quer entender melhor como isso aconteceu? Vamos lá!

Em diversos artigos, já mencionamos que a família passou por transformações ao longo dos anos, tendo em vista que em épocas anteriores a entidade familiar formada pelo matrimônio era a única reconhecida pelo Direito e que, com o passar do tempo, a família veio a ser identificada por outro aspecto principal: o afeto.

Assim, considerando que as mudanças da sociedade exigiram uma adaptação da legislação, as alterações advindas da Constituição Federal de 1988 reconheceram as diversas formas de família, sejam elas formadas pelo casamento ou não.

Segundo Giselda HIRONAKA1, a família atual é “mais sincera, digamos assim, no sentido de que as hipocrisias e as simulações de antes já não encontram mais lugar em cena”, ou seja, aquelas famílias – não formadas pelo casamento – sempre existiram, apenas não recebiam proteção jurídica, o que passou a acontecer com essa “humanização” do Direito e valorização da dignidade humana.

Embora apresentem diversidade no que diz respeito ao gênero dos envolvidos, as uniões homossexuais são constituídas pelas mesmas características das heterossexuais, tendo como elemento principal o afeto. Entende-se, pois, que não podem algumas entidades familiares serem protegidas e outras não.

Antes do reconhecimento pela Constituição Federal de todas as entidades familiares, aqueles que mantinham um relacionamento que não fosse nos moldes da lei, quando da separação, precisariam dissolver a união na Vara Cível, na qual a família era tratada como uma “sociedade de fato”. Um dos parceiros poderia até receber indenização ou parte do patrimônio adquirido, por exemplo, mas isso seria em razão da “sociedade” que fizeram e não da “família” e da comunhão de vida instituída.

Os primeiros avanços foram notados quando a jurisprudência (“O que é jurisprudência?” clique aqui) passou a admitir que os casos envolvendo a separação de casais homossexuais fossem analisados nas Varas de Família, sob o viés das normas pertinentes à união estável (ano 2001). Tal circunstância veio a ser reforçada, posteriormente, pelo enunciado 524 das Jornadas de Direito Civil2.

Em 2011, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a união estável homossexual como entidade familiar e atribuiu direitos aos casais formados por pessoas do mesmo sexo. Em seguida, o “Tribunal, ainda por votação unânime, julgou procedente as ações, com eficácia erga omnes e efeito vinculante”3, o que significa dizer que esse seria um posicionamento a ser seguido pelos demais juristas do país4.

Assim, entende-se que o artigo 226, §3o, da Constituição Federal, segundo o qual “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher”, embora não tenha sido efetivamente alterado, deve ser lido de outra maneira. Portanto, onde se lê “o homem e a mulher”, a interpretação que passou a ser dada é de que se leia “pessoas”.

Em junho de 2011, foi convertida a primeira união estável homossexual em casamento, via judicial (é possível a conversão de uma união em casamento). Depois desse pedido, outros também começaram a ser concedidos judicialmente.

Conrado Paulino da ROSA5 explica que “o Brasil passou a figurar no rol de países que possibilitam e aceitam juridicamente o casamento gay, ainda que na forma de conversão, em uma patente demonstração de acatamento das diferenças, sem hipocrisias, possibilitando, acima de tudo, a felicidade de seus cidadãos”.

Se a união estável homossexual passou a poder ser convertida em casamento, por qual motivo não se reconhecer o matrimônio homossexual diretamente? Isso não faria sentido. Assim, passou-se a reconhecer, também, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, ainda que com a eventual necessidade de intervenção judicial para tanto – em caso de negativa por parte dos cartórios em relação à celebração.

Em 2013, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Resolução nº. 175/2013, o que caracterizou mais um avanço, na medida em que determina que as autoridades (cartórios) não podem rejeitar a celebração do casamento homossexual e nem a conversão da união estável em casamento. Caso exista tal recusa, isso deve ser comunicado ao juiz corregedor para a adoção das medidas adequadas.

É certo que, da mesma forma que acontecia outrora em relação a outros tipos de família, as uniões homossexuais não deixarão de existir por não estarem regulamentadas, do mesmo modo que elas não aumentarão somente em decorrência do reconhecimento legal.

Ao não se reconhecer uma união homossexual, fere-se o princípio da dignidade. Com o não reconhecimento, a Justiça estaria a colaborar, de fato, para a criação de injustiças, já que estaria “fechando os olhos” para sujeitos que merecem igualdade de proteção.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1HIRONAKA, Giselda. A incessante travessia dos tempos e a renovação dos paradigmas. In: SOUZA, Ivone Maria Candido Coelho de (coord.). Direito de Família, diversidade e multidiciplinariedade. IBDFAM, Porto Alegre, 2007.
2524) Art. 1.723. As demandas envolvendo união estável entre pessoas do mesmo sexo constituem matéria de Direito de Família.
3ROSA, Conrado Paulino da. Curso de Direito de Família Contemporâneo. Editora Juspodvm. Salvador, 2016.
4“Enquanto isso, os Poderes Judiciário e Executivo, atendendo a clamor social de justiça e equilíbrio, apesar das resistências e preconceitos, começam a dar efetividade às normas e aos princípios constitucionais e a dispensar tratamento especial ao tema, objetivando não mais excluí-lo, pois a orientação de cada ser humano especialmente no campo sexual, deve ser respeitada.” ROSA, Conrado Paulino da. Curso de Direito de Família Contemporâneo. Editora Juspodvm. Salvador, 2016.
5ROSA, Conrado Paulino da. Curso de Direito de Família Contemporâneo. Editora Juspodvm. Salvador, 2016.

Curatela: o que é isso?

No artigo “Uma criança perdeu os pais: quem ficará responsável por elas?” (clique aqui), explicamos que a tutela existe para garantir a criação e a educação de crianças ou adolescentes que tenham perdido seus genitores. Isso porque, até que atinjam os 18 anos de idade, entende-se que não teriam capacidade de reger sua própria vida civil.

Mas, para o Direito, o que significa essa “capacidade” afinal? E o que acontece se uma pessoa maior de idade não a possui? É esse o tema do artigo de hoje! Quer entender melhor? Continue lendo!

A capacidade civil é a aptidão de adquirir direitos e de assumir deveres nas relações jurídicas patrimoniais (ex.: comprar, vender, realizar contratos). Ou seja, somente aqueles que são considerados “capazes” para a lei, podem, sozinhos, realizar estes atos.

Por exemplo, uma criança é um sujeito titular de direitos como qualquer outro, mas não lhe é permitido praticar atos jurídicos, pois somente atinge a capacidade total quando completa 18 anos de idade. No caso das crianças e dos adolescentes, geralmente os genitores ou algum dos familiares é que exercerá a guarda ou a tutela (leia sobre as diferenças entre esses dois institutos clicando aqui), sendo eles, portanto, que representarão os interesses dos pequenos até que atinjam a maioridade.

A curatela, por sua vez, segue o mesmo raciocínio. No entanto, ela vale para aqueles que já completaram a maioridade civil (ou seja, já possuem 18 anos ou mais), porém, por conta de alguma doença mental – ou por alguma outra razão, listada em lei – não possuem capacidade de autodeterminação, de gerir seus próprios interesses. Embora eles sejam adultos, que, teoricamente, poderiam exercer os atos jurídicos, a doença (ou o outro motivo) lhes retira a “capacidade” para tanto. E por isso precisam de um representante. Este representante exercerá a “curatela” daquele incapaz.

Então, o que é a curatela afinal?

A curatela é um mecanismo de proteção para aqueles que, mesmo maiores de idade, não possuem capacidade de reger os atos da própria vida. Ela é o “encargo imposto a uma pessoa natural para cuidar e proteger uma pessoa maior de idade que não pode se autodeterminar patrimonialmente por conta de uma incapacidade”1.

E quem pode ser interditado?

O artigo 1767 do Código Civil Brasileiro, foi atualizado pela Lei nº 13.146 de 2015, a qual institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e prevê as seguintes hipóteses de interdição:

a) aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade: Neste ponto, o artigo é bastante genérico, com o objetivo de retirar o estigma de que pessoas com determinadas síndromes, tal como a Síndrome de Down, ou doenças como o Alzheimer, por exemplo, sejam automaticamente inseridas no rol de incapazes.

Portanto, neste contexto, cada situação será analisada considerando suas particularidades. A curatela poderá ser definida, considerando as condições ou estados psicológicos, que podem reduzir a capacidade de discernimento acerca da vida e do cotidiano de cada indivíduo.

Ainda, por causa transitória, por exemplo, podem ser considerados aqueles que encontram-se internados em UTI, mesmo que temporariamente, mas que não possuem condições de manifestar a vontade na situação em que se encontram.

A causa da incapacidade, nesses casos, dependerá de comprovação médica.

b) os ébrios habituais (alcoolistas) e viciados em tóxicos: Importante dizer aqui que, nesses casos, o discernimento é reduzido e não se trata de uso eventual de determinadas substâncias.

c) pródigos: São aqueles que dilapidam seu patrimônio de modo a prejudicar seu próprio sustento. É um desvio comportamental e se exige a presença da psicologia para sua averiguação, não bastando o mero volume de gastos para sua verificação. Nesse caso, pode ser que a interdição seja parcial, ou seja, somente para realizar negócios que envolvam o patrimônio da pessoa.

Ressalte-se que este rol é taxativo, o que significa que somente poderá ser concedida a curatela se a situação se amoldar a uma das hipóteses previstas em lei, não sendo possível requisitá-la em qualquer outra circunstância.

E como ela é instituída?

A curatela é estabelecida por meio de um processo de “interdição”. É exigido que se comprove, dentro do processo, a causa geradora da incapacidade. Como é uma medida drástica que atinge determinados direitos, a curatela não pode ser aplicada sem a devida análise do caso, e deve ter sempre por base a proteção do indivíduo interditado. Além disso, somente se justifica em razão das necessidades dele.

Na sentença, o juiz estabelecerá o grau da incapacidade, pois nem sempre ela será absoluta. Assim, a interdição incidirá somente em determinados atos e situações. O ideal é que o juiz observe o alcance do “comprometimento mental do interditando, procurando assegurar que ele mesmo, pessoalmente, possa continuar, se possível, exercendo seus interesses existenciais”2.

No mais, será nomeado um curador, que exercerá a curatela. Esse curador será, preferencialmente, o cônjuge ou companheiro do interditando, bem como um dos parentes mais próximos (ascendente, descendente ou colateral). Caberá ao juiz verificar quem possui melhores condições de exercer o encargo e quem possui uma relação de afeto e afinidade com o incapaz (ou relativamente incapaz).

O curador terá a obrigação de administrar os bens do curatelado e de prestar contas a cada dois anos (ou a critério do juiz) por meio de um relatório contábil com os comprovantes das despesas. Verificada qualquer irregularidade, ele poderá ser destituído do encargo, providenciando-se a sua substituição.

Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
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1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

O que são uniões paralelas?

Você sabe o que são uniões paralelas? Talvez você já tenha visto em filmes, novelas, ou até mesmo conheça alguém que vive sob estas circunstâncias. Mas, como o Direito entende essas situações? Esse é o tema deste artigo!

Sabe-se que a família passou por diversas transformações ao longo dos anos e a legislação precisou se adaptar às mudanças para atender aos anseios da sociedade. Em um primeiro momento, as disposições da legislação buscavam assegurar a indissolubilidade do vínculo criado com o matrimônio, enquanto as relações fora do casamento não recebiam proteção do Direito de Família.

Com o advento da Constituição Federal de 1988, reconheceram-se as mais diversas formas de família e, pode-se dizer que a família adquiriu um caráter muito menos patrimonial, passando a ser reconhecida como a constituída pelo afeto e pela liberdade de cada indivíduo – não apenas pelo casamento.

Além disso, a atual Constituição Federal não determina qualquer tipo específico de família a ser protegido, o que faz presumir que podem ser atribuídas consequências jurídicas a quaisquer tipos de família, desde que os integrantes do núcleo familiar se reconheçam como tal.

Dentro desse contexto de transformação social e de reconhecimento das mais diversas formas de entidades familiares, observa-se que a legislação novamente “tem se mostrado incapaz de acompanhar a evolução, a velocidade e a complexidade dos mais diversos modelos de núcleos familiares que se apresentam como verdadeiras entidades familiares”1. Um exemplo disso seriam as uniões paralelas.

As uniões paralelas são aquelas que acontecem simultaneamente. A “simultaneidade familiar diz respeito à circunstância de alguém se colocar concomitantemente como componente de duas ou mais entidades familiares diversas entre si”2. Ou seja, é a situação em que uma mesma pessoa possui duas uniões ao mesmo tempo, mas uma teve início antes da outra.

Apesar de a Constituição Federal não deixar as diversas formas de família existentes atualmente desamparadas juridicamente, as uniões paralelas, para muitos, não poderiam ser reconhecidas.

No entanto, de acordo com Giselda HIRONAKA, embora ainda seja lenta a evolução no sentido de reconhecer as uniões paralelas, “aqui e ali, já se apresentam decisões que, corajosamente, têm chancelado a possibilidade de reconhecimento”3.

É certo que o avanço nesse sentido não tem sido rápido e, apesar de já se ter admitido a possibilidade das uniões paralelas4, ainda existem diversos posicionamentos no que diz respeito às consequências jurídicas do reconhecimento dessas entidades familiares para os envolvidos.

São três principais correntes:

1. As uniões paralelas não podem ser reconhecidas: se uma pessoa é casada ou vive em união estável e mantém outro relacionamento paralelo, mesmo que tal relação seja duradoura e dela advenham filhos, não há a possibilidade de reconhecer o relacionamento como uma entidade familiar.

Se da relação resultou a aquisição de patrimônio por esforço comum, tal situação será regulada pelo direito civil (e não familiar). O princípio da monogamia (que veda mais de uma união) deve prevalecer.

Em setembro de 2022, o STJ entendeu que não é possível o reconhecimento de união estável paralela ao casamento, mesmo que iniciada antes do matrimônio. Segundo constou,  a preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes impede o reconhecimento de novo vínculo, em virtude da consagração da monogamia pelo ordenamento jurídico brasileiro. Ainda assim, reconheceu-se a união como uma “sociedade de fato”, sendo possível a partilha dos bens adquiridos, desde que comprovado esforço comum na construção patrimonial. 

2. Possibilidade de reconhecimento da união estável de quem estiver de boa-: o reconhecimento das uniões paralelas deve considerar a existência de união estável somente quando um dos membros da família é impedido de iniciar outro relacionamento (por já estar em uma relação anterior) e o outro, apesar disso, acredita que não há impedimento.

Assim, para aquele que estiver de boa-fé dentro da relação, ela será reconhecida e produzirá efeitos. Isso porque se pretende, por exemplo, evitar o enriquecimento indevido daquele que foi infiel. O princípio da monogamia, portanto, é relativizado.

3. Todas as uniões poderiam ser reconhecidas: o conhecimento sobre uma união anterior “não pode ter o condão de tornar juridicamente irrelevante a existência de família constituída em concomitância com a originária”5. Para os adeptos deste pensamento, a monogamia deve ser considerada somente uma regra moral, mas não um princípio no qual se baseia o Direito.

Mais do que a monogamia, valorizam-se a autonomia, a liberdade de escolha e a intimidade dos indivíduos no momento da constituição de sua família.

Assim, diante de entidades familiares paralelas, merecedoras da chancela jurídica, o estado precisaria assumir o encargo de proteger o livre desenvolvimento da personalidade e os planos de vida dos cidadãos.

Importante dizer que, não se trata de criticar a orientação da monogamia. Afinal, cada um pode escolher viver e se relacionar da forma que bem entender. Trata-se, porém, de respeitar e conferir proteção estatal àqueles que escolhem uma diferente configuração familiar.

Agora, fica a pergunta para nossos leitores: com qual corrente vocês concordam? Escrevam para a gente contando!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1HIRONAKA, Giselda. Famílias paralelas. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewFile/67983/70840. Acesso em 07/2017.
2PIANOVSKI, Carlos Eduardo. Famílias simultâneas e monogamia. Disponível em:http://www.ibdfam.org.br/_img/congressos/anais/9.pdf. Acesso em: 07/2017.
3 HIRONAKA, Giselda. Famílias paralelas. Disponível em: http://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/viewFile/67983/70840. Acesso em 07/2017.
4 SILVA, Marcos Alves da. Da Monogamia: a sua superação como princípio estruturante do Direito de Família. Editora Juruá. Curitiba, 2013. “No Direito Civil brasileiro contemporâneo já existem significativas manifestações que apontam na direção da superação da monogamia como princípio estruturante do estatuto jurídico da família. O tema da simultaneidade de famílias foi suscitado só recentemente. Ele não tinha lugar na pauta das reflexões daqueles que se debruçavam sobre o Direito de Família. Antes da Constituição de 1988, só era tangenciado, quando se tratava do concubinato adulterino. O novo enfoque constitucional dado à família ou às famílias, termo ultimamente preferido por alguns doutrinadores, abriu espaço ao debate. O fato que estava posto à margem do âmbito jurídico foi trazido para o centro de acaloradas discussões e alcançou dignidade de tratamento reflexivo e não mais apenas a pecha irrefletida”.

5SILVA, Marcos Alves da. Da Monogamia: a sua superação como princípio estruturante do Direito de Família. Editora Juruá. Curitiba, 2013.

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