O que é casamento nulo (inválido)?

Casamento nulo (inválido): o que é?

Já vimos em artigos anteriores, que o casamento é a união voluntária de duas pessoasrespeitando alguns requisitos previstos em Leia fim de constituir uma família.

No entanto, há casos em que o casamento, embora tenha sido realizado, não será considerado válido, ou seja, o casamento será considerado nulo.

O tema é um pouco complexo, mas tentaremos explicar à “moda” Direito Familiar!

No Direito, para que um ato seja reconhecido juridicamente, devem ser analisados três planos: o da existência, o da validade e o da eficácia.

A existência é o plano do “ser”, ou seja, é o que considera a presença de elementos fundamentais para aquele ato. Na ausência deles, é como se o ato não existisse para o Direito e, portanto, não merecesse proteção jurídica.

A existência de um casamento pressupõe que foram seguidos os requisitos mencionados no artigo “Casamento civil: como funciona?” (clique aqui), tais como: consentimento, celebração por autoridade e a “fórmula sacramental”. É somente depois disso que se pode considerar o casamento existente.

A validade, por sua vez, “concerne ao ajuste do ato às prescrições estabelecidas em lei”1. Assim, o casamento pode ter existido, mas, se não respeitadas determinadas disposições legais, ele não será legalmente válido.

A ausência de alguns requisitos pode tornar o casamento apenas anulável (de forma que ele, apesar de irregular, ainda poderá ser convalidado – ou seja, será dada posterior validade a ele e, assim, poderá ser mantido).

A falta de outros, porém, torna o casamento nulo (sem validade). Isso quer dizer que, em tese, será como se aqueles que se casaram tivessem que retornar ao estado civil anterior.

A eficáciaterceiro plano – tem relação com a produção de efeitos daquele ato.

Neste artigo, trataremos somente sobre as hipóteses em que o casamento será tido como INVÁLIDO, ou seja, NULO (e não anulável).

Quais são elas?

A nulidade de casamento, pela gravidade de suas consequências, não admite interpretação extensiva, ou seja, ela só acontecerá na hipótese prevista em lei, qual seja: quando um ou ambos os cônjuges incorrerem em impedimento matrimonial.

Os impedimentos matrimoniais estão previstos no artigo 1521 do Código Civil:

Art. 1.521. Não podem casar:

Ios ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;

IIos afins em linha reta;

IIIo adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;

IVos irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;

Vo adotado com o filho do adotante;

VIas pessoas casadas;

VIIo cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.

Sobre os impedimentos decorrentes do parentesco (I a V), já tratamos no artigo “Posso casar com algum parente meu?” (clique aqui).

Quanto aos demais, vê-se a previsão de impedimento no tocante apessoas casadas”. Ou seja, aqueles que já são casados não poderiam, em tese, casar novamente, sob pena de ser considerado nulo o segundo casamento, já que havia causa de impedimento.

Cristiano Chaves de FARIAS e Nelson ROSENVALD 2 explicam que:

Somente desaparece esse impedimento matrimonial através da dissolução do casamento anterior (por morte ou declaração de ausência, divórcio, declaração de nulidade ou anulação do casamento). Até porque o impedimento não decorre do fato da pessoa ter sido casada, mas de ser casada. No que tange à invalidade do primeiro casamento, enquanto não for reconhecida a nulidade das primeiras núpcias, as segundas continuam reputadas inválidas, por conta da bigamia. Uma vez reconhecida a nulidade do primeiro casamento (não tendo produzido qualquer efeito), naturalmente, estará reconhecida a perfeita validade do segundo”.

Além disso, consta o impedimento para o casamento entre o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte. Isso significa dizer, por exemplo, que, se você era casado e alguém matou seu cônjuge, você não poderá casar com o assassino.

Como os impedimentos são “insanáveis e graves, a lei consagra como consequência da sua infringência a nulidade absoluta do casamento”3.

Tem-se, portanto, que, o ato do casamento pode ser considerado nulo em algumas ocasiões, de maior “peso” para o Direito. Em resumo, o casamento será nulo quando houver algum impedimento matrimonial.

Apesar disso, é importante dizer que, por ser um ato existente, ainda que seja inválido (nulo), ele poderá produzir efeitos (plano da eficácia), isso em relação a terceiros, tais como: presunção de paternidade no que diz respeito aos filhos advindos da união e reconhecimento da comunhão de bens.

Vale dizer, ainda, apenas a título de esclarecimento, que, antes da vigência do estatuto da pessoa com deficiência (Lei nº. 13146/2015), havia um dos incisos do artigo citado acima que reputava como inválido o casamento realizado por pessoa mentalmente enferma, em grau que não lhe possibilite entender ou discernir a natureza e as consequências dos atos da vida civil.

No entanto, tal dispositivo foi revogado com o advento do referido estatuto. (Para saber mais sobre o estatuto da pessoa com deficiência, confira o artigo “Curatela: o que é isso?” – clique aqui).

Apesar disso, certo é que o casamento depende de uma decisão na qual se expressa uma vontade e, estando a pessoa com uma deficiência que não lhe permita manifestar devidamente a vontade, isso poderá tornar o ato inexistente (não será nulo pelos requisitos de validade, mas será inexistente – “Casamento Civil: como funciona?” – clique aqui).

Sabemos que o assunto é um pouco complicado, mas esperamos que o texto facilite a compreensão sobre o que é um casamento nulo!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

______________________________

1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

2 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

3 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família. 9ª Edição. São Paulo, 2014.

Curatela: o que é isso?

No artigo “Uma criança perdeu os pais: quem ficará responsável por elas?” (clique aqui), explicamos que a tutela existe para garantir a criação e a educação de crianças ou adolescentes que tenham perdido seus genitores. Isso porque, até que atinjam os 18 anos de idade, entende-se que não teriam capacidade de reger sua própria vida civil.

Mas, para o Direito, o que significa essa “capacidade” afinal? E o que acontece se uma pessoa maior de idade não a possui? É esse o tema do artigo de hoje! Quer entender melhor? Continue lendo!

A capacidade civil é a aptidão de adquirir direitos e de assumir deveres nas relações jurídicas patrimoniais (ex.: comprar, vender, realizar contratos). Ou seja, somente aqueles que são considerados “capazes” para a lei, podem, sozinhos, realizar estes atos.

Por exemplo, uma criança é um sujeito titular de direitos como qualquer outro, mas não lhe é permitido praticar atos jurídicos, pois somente atinge a capacidade total quando completa 18 anos de idade. No caso das crianças e dos adolescentes, geralmente os genitores ou algum dos familiares é que exercerá a guarda ou a tutela (leia sobre as diferenças entre esses dois institutos clicando aqui), sendo eles, portanto, que representarão os interesses dos pequenos até que atinjam a maioridade.

A curatela, por sua vez, segue o mesmo raciocínio. No entanto, ela vale para aqueles que já completaram a maioridade civil (ou seja, já possuem 18 anos ou mais), porém, por conta de alguma doença mental – ou por alguma outra razão, listada em lei – não possuem capacidade de autodeterminação, de gerir seus próprios interesses. Embora eles sejam adultos, que, teoricamente, poderiam exercer os atos jurídicos, a doença (ou o outro motivo) lhes retira a “capacidade” para tanto. E por isso precisam de um representante. Este representante exercerá a “curatela” daquele incapaz.

Então, o que é a curatela afinal?

A curatela é um mecanismo de proteção para aqueles que, mesmo maiores de idade, não possuem capacidade de reger os atos da própria vida. Ela é o “encargo imposto a uma pessoa natural para cuidar e proteger uma pessoa maior de idade que não pode se autodeterminar patrimonialmente por conta de uma incapacidade”1.

E quem pode ser interditado?

O artigo 1767 do Código Civil Brasileiro, foi atualizado pela Lei nº 13.146 de 2015, a qual institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e prevê as seguintes hipóteses de interdição:

a) aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade: Neste ponto, o artigo é bastante genérico, com o objetivo de retirar o estigma de que pessoas com determinadas síndromes, tal como a Síndrome de Down, ou doenças como o Alzheimer, por exemplo, sejam automaticamente inseridas no rol de incapazes.

Portanto, neste contexto, cada situação será analisada considerando suas particularidades. A curatela poderá ser definida, considerando as condições ou estados psicológicos, que podem reduzir a capacidade de discernimento acerca da vida e do cotidiano de cada indivíduo.

Ainda, por causa transitória, por exemplo, podem ser considerados aqueles que encontram-se internados em UTI, mesmo que temporariamente, mas que não possuem condições de manifestar a vontade na situação em que se encontram.

A causa da incapacidade, nesses casos, dependerá de comprovação médica.

b) os ébrios habituais (alcoolistas) e viciados em tóxicos: Importante dizer aqui que, nesses casos, o discernimento é reduzido e não se trata de uso eventual de determinadas substâncias.

c) pródigos: São aqueles que dilapidam seu patrimônio de modo a prejudicar seu próprio sustento. É um desvio comportamental e se exige a presença da psicologia para sua averiguação, não bastando o mero volume de gastos para sua verificação. Nesse caso, pode ser que a interdição seja parcial, ou seja, somente para realizar negócios que envolvam o patrimônio da pessoa.

Ressalte-se que este rol é taxativo, o que significa que somente poderá ser concedida a curatela se a situação se amoldar a uma das hipóteses previstas em lei, não sendo possível requisitá-la em qualquer outra circunstância.

E como ela é instituída?

A curatela é estabelecida por meio de um processo de “interdição”. É exigido que se comprove, dentro do processo, a causa geradora da incapacidade. Como é uma medida drástica que atinge determinados direitos, a curatela não pode ser aplicada sem a devida análise do caso, e deve ter sempre por base a proteção do indivíduo interditado. Além disso, somente se justifica em razão das necessidades dele.

Na sentença, o juiz estabelecerá o grau da incapacidade, pois nem sempre ela será absoluta. Assim, a interdição incidirá somente em determinados atos e situações. O ideal é que o juiz observe o alcance do “comprometimento mental do interditando, procurando assegurar que ele mesmo, pessoalmente, possa continuar, se possível, exercendo seus interesses existenciais”2.

No mais, será nomeado um curador, que exercerá a curatela. Esse curador será, preferencialmente, o cônjuge ou companheiro do interditando, bem como um dos parentes mais próximos (ascendente, descendente ou colateral). Caberá ao juiz verificar quem possui melhores condições de exercer o encargo e quem possui uma relação de afeto e afinidade com o incapaz (ou relativamente incapaz).

O curador terá a obrigação de administrar os bens do curatelado e de prestar contas a cada dois anos (ou a critério do juiz) por meio de um relatório contábil com os comprovantes das despesas. Verificada qualquer irregularidade, ele poderá ser destituído do encargo, providenciando-se a sua substituição.

Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
————————-
1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

O que fazer se o devedor de alimentos se tornar incapaz?

Você sabe o que fazer se o devedor de alimentos se tornar incapaz, seja por ter adquirido alguma doença, sofrido algum acidente, ou por algum outro motivo que tenha retirado sua capacidade de gerir a própria vida?

Por exemplo, podemos imaginar uma situação na qual o alimentado está pedindo judicialmente o cumprimento de uma decisão em relação aos alimentos (leia mais sobre isso: Como faço para cobrar a pensão alimentícia que não é paga?” Clique aqui) e, no entanto, o genitor que está obrigado a prestar a pensão alimentícia sofre algum acidente e acaba ficando em coma ou com sequelas que não lhe permitem exercer função remunerada. Outro exemplo pode ser quando se constata que o devedor de alimentos possui alguma doença mental.

Isso tudo, por certo, dificulta o pagamento dos alimentos de forma adequada. No entanto, a obrigação permanece. Então, o que fazer?

Em artigos anteriores, já mencionamos que, se uma pessoa tem alguma doença (ou outra circunstância) que a impede de praticar os atos da vida civil, ela pode ser considerada “incapaz”. Nesses casos, deve-se buscar a curatela daquele indivíduo (“Curatela: o que é isso? Clique aqui). É claro que nem todas as situações de deficiência ou doença serão tão graves a ponto de fundamentar a curatela. Porém, sendo esse o caso, aquele adulto passará a ser representado por um curador.

Assim, uma das medidas a serem tomadas pelo alimentante incapaz (representado por seu curador) será ingressar com uma ação revisional de alimentos (“O valor da pensão alimentícia pode ser alterado?” Clique aqui), por meio da qual explicará toda a situação e buscará diminuir o valor da pensão alimentícia, se efetivamente não estiver em condições de prestá-la na quantia determinada anteriormente.

Vale lembrar que a interdição (incapacidade), por si só, não necessariamente justifica a mudança do valor dos alimentos. Aquele que possui essa obrigação alimentar deverá demonstrar nos autos que, por conta de doença ou outra situação (custos de medicamentos, internações, incapacidade de trabalhar…), sua condição financeira se modificou e que, em decorrência dos problemas de saúde, sofreu diminuição da sua renda ou aumento das suas despesas (artigo 1699 do Código Civil Brasileiro).

Ademais, grife-se que, ainda que o valor dos alimentos venha a ser alterado – ou que haja eventual exoneração do encargo –, a alteração passará a valer apenas para as parcelas futuras da pensão alimentícia. O curador deverá ficar responsável pelo encargo. As parcelas que não foram pagas e já estiverem sendo cobradas, porém, permanecem.

Assim, estando o processo de cobrança dos alimentos em curso, as circunstâncias pelas quais o executado (devedor) está passando deverão ser informadas nos autos, comprovando-se documentalmente, inclusive, a curatela.

Além disso, se a cobrança estiver tramitando pelo rito da prisão civil, é importante dizer que, embora a dívida permaneça e o processo possa seguir, não poderá continuar pelo rito da coerção pessoal. Isso porque os incapazes não vão para a detenção quando cometem crimes (há outras medidas específicas a serem aplicadas para eles), e também não cabe sua prisão civil, até mesmo pela situação de vulnerabilidade em que se encontram. A alternativa, então, será a penhora dos bens, entre outras medidas que mencionamos no artigo “Novidades sobre a cobrança de pensão alimentícia” (Clique aqui).

Desse modo, deverá ser formulado ao juiz um pedido para que a ação passe a tramitar sob o rito da penhora de bens (sobre o qual falamos no artigo “Como faço para cobrar a pensão alimentícia que não é paga?” Clique aqui), tendo em vista que, ainda que esteja incapacitado de exercer os atos da vida civil, o alimentante pode ter bens que garantirão o sustento do filho e a quitação do débito, ou poderá ser descontado o valor da pensão alimentícia de eventual benefício previdenciário recebido por ele.

Ressalte-se que, embora deva ser considerada a incapacidade do alimentante, o filho – se for menor de idade – também é considerado incapaz e tem o direito de receber auxílio para seu sustento. O genitor incapaz não poderá ser preso, mas, considerando que ele ainda era capaz quando contraiu o débito alimentar, deve ser levado em conta também o superior interesse do menor, que não poderá ser prejudicado porque o genitor, quando tinha condições, deixou de cumprir com seu dever.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Como vender um bem de um familiar curatelado/incapaz?

Real estate concept – businessman signs contract behind home architectural model

Vender um bem de alguém considerado incapaz é uma situação muito comum e que deve ser tratada com muito cuidado.

Apenas para relembrar: “A capacidade civil é a aptidão de adquirir direitos e de assumir deveres nas relações jurídicas patrimoniais (ex.: comprar, vender, realizar contratos). Ou seja, somente aqueles que são considerados “capazes” pela lei, podem, sozinhos, realizar estes atos.”

Se você possui algum familiar ou conhecido incapaz – menor ou maior de idade –, a dúvida sobre como vender um bem de alguém que precisa de um representante para a prática dos atos da vida civil já deve ter passado por sua cabeça.

Neste texto, vamos esclarecer alguns pontos sobre esse tema!

No artigo “Curatela: o que é isso?” (clique aqui), explicamos que a curatela é “um mecanismo de proteção para aqueles que, maiores de idade, não possuem capacidade de reger os atos da própria vida”. É, portanto, o encargo conferido a uma pessoa para cuidar de um adulto (ou seja, de alguém que já é maior de idade), mas que, por algum motivo (enfermidade, deficiência, dependência química, etc.) não é capaz de se autodeterminar e não possui condições de entender e compreender as consequências, o alcance e a importância de seus atos.

Assim, o curador será o responsável por administrar, proteger e cuidar dos bens do curatelado. Então, pode surgir o questionamento: e se for necessário vender o bem de propriedade daquele incapaz? O que se deve fazer?

Pois bem, o primeiro ponto é procurar o atendimento de advogados ou da Defensoria Pública, pois, para a venda do bem de um curatelado é necessária uma autorização judicial, que poderá ser concedida em um processo de “alvará para venda”.

Tem-se, portanto, que um dos requisitos é a autorização judicial.

Porém, existem mais três aspectos essenciais a serem observados: a “real necessidade”, “inequívoca vantagem” e a “avaliação judicial do bem”.

Vamos saber do que se tratam?

REAL NECESSIDADE: a venda de bem de incapaz somente pode ser autorizada em situação de real necessidade porque o seu patrimônio e seus interesses devem ser plenamente resguardados. Mas, o que pode ser considerado real necessidade? Isso vai depender de caso para caso.

De maneira geral, pode-se dizer que os casos de real necessidade são aqueles que envolvem a educação, saúde ou subsistência do incapaz. Além disso, existe a possibilidade de se demonstrar a real necessidade de alienar um bem para a aquisição de outro em seu lugar. A lei, porém, não se preocupa em fornecer um rol preestabelecido de situações nas quais há real necessidade.

A título de exemplo, pode-se mencionar os casos nos quais os envolvidos são pessoas com poucos recursos, nos quais o incapaz está hospitalizado em estado crítico e precisa do valor para arcar com o tratamento; e quando há necessidade do recebimento da quantia para garantir os custeios básicos e essenciais à sobrevivência do incapaz. Ou seja, não é recomendado que se autorize a venda de um bem de incapaz por motivos supérfluos, mas a “real necessidade”, de fato, deverá ser verificada no caso concreto, avaliando-se com cautela as circunstâncias em que vive o incapaz e seus familiares (incluindo seu curador).

INEQUÍVOCA VANTAGEM: de acordo com o artigo 1750 do Código Civil Brasileiro, os imóveis pertencentes aos menores sob tutela somente podem ser vendidos quando houver inequívoca vantagem – ou seja, uma vantagem certa. Esse artigo é aplicável também à curatela (não sendo caso de menor de idade), por conta do disposto no artigo 1774 do Código Civil Brasileiro. Assim, somente será concedida a autorização para a venda de bem de incapaz se for demonstrado no caso, efetivamente, que haverá vantagem para ele.

Importante ressaltar aqui, que a vantagem advinda do negócio deve vir em benefício do incapaz (e não de seu curador ou outras pessoas) e, ainda, que não basta somente a comprovação de ausência de prejuízo.

A título de exemplo, pode-se mencionar que, a eventual venda de bem, sob a justificativa de que se está a arcar com as despesas de manutenção de determinado imóvel, por si só, não deve prevalecer sem que haja prévia e cuidadosa avaliação, demonstrando-se que, além de utilizar os valores da venda para arcar com as despesas de manutenção, o negócio a ser realizado trará vantagem – de fato – ao incapaz.

AVALIAÇÃO DO BEM: a avaliação do bem será necessária até mesmo para que se verifique a presença da inequívoca vantagem na realização do negócio jurídico. Ela serve para que, avaliado o valor do bem a ser vendido e também, se for o caso, do bem a ser adquirido em seu lugar, seja possível analisar se o incapaz não terá prejuízo financeiro.

Com relação ao dinheiro obtido com a venda do bem (não inferior à avaliação), o Código Civil determina que o curador somente poderá ficar em poder de valores necessários para as despesas com o sustento e a administração dos bens da pessoa incapaz. Por este motivo, o valor obtido com a venda, por ser do curatelado, deverá ser depositado em conta judicial vinculada ao processo, e só será liberado mediante novo alvará, comprovada a necessidade do curatelado, e com a posterior apresentação de prestação de contas.

Por fim, será nulo o negócio jurídico quando ausente a prévia autorização judicial e, declarada a nulidade, por força da proibição de enriquecimento sem causa, deve ser restituída ao comprador a quantia paga, garantindo-se ao possuidor de boa-fé o direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis. Ou seja, se alguém comprar o imóvel de incapaz que foi vendido sem autorização judicial, o comprador poderá, dependendo das circunstâncias, ser indenizado quando da anulação do negócio.

Todos esses cuidados são essenciais, tendo em vista a preocupação do Estado em proteger o patrimônio do incapaz e resguardar seus interesses. É extremamente necessária a fiscalização acerca da correta administração de seu patrimônio, para que o incapaz não seja prejudicado e, eventualmente, fique desamparado financeiramente.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Defensoria Pública e Ministério Público: atuação nas Varas de Família

A partir das nossas experiências junto às Varas de Família, percebemos que não é pequeno o número de pessoas que confunde a atuação do Ministério Público e da Defensoria Pública.

Para muitos, este artigo pode soar como algo óbvio, mas garantimos que, depois de alguns anos de atendimentos realizados junto às Varas de Família de Curitiba, muitas pessoas não sabem diferenciá-los.

Portanto, o objetivo deste artigo é esclarecer, resumidamente, a forma como esses dois órgãos atuam – com foco na área no Direito de Família – a fim de facilitar a compreensão daqueles que já buscaram, ou que ainda pretendem buscar o auxílio desses órgãos para a resolução de algum problema.

Vamos lá!

A Constituição Federal tem um capítulo que fala sobre as funções essenciais à Justiça e, dentre elas estão a do Ministério Público e a da Defensoria Pública, órgãos que caminham lado a lado com o Judiciário, garantindo o seu bom funcionamento e tornando o acesso à Justiça o mais amplo possível.

Em outras palavras, podemos dizer que esses dois órgãos auxiliam o Judiciário, pois são responsáveis, dentre outras coisas, por darem início a procedimentos judiciais, bem como por acompanhá-los, com o objetivo de garantir o correto andamento processual de ações que envolvam direitos relevantes e de caráter social.

Embora pareçam órgãos semelhantes, cada um tem sua independência funcional, suas regras de atuação e sua legislação específica.

Para facilitar a compreensão, falaremos separadamente sobre cada um deles em relação à atuação no âmbito do Direito de Família, pois acreditamos que assim ficará mais fácil de entender as diferenças de atuação destes dois órgãos:

DEFENSORIA PÚBLICA:

A Defensoria Pública é um órgão público, como o próprio nome diz, encarregado de prestar assistência jurídica gratuita àqueles que não têm condições de pagar por ela. Ou seja, a pessoa que não tem condições de pagar pelos serviços de um advogado particular para atendê-la, poderá recorrer à Defensoria Pública do seu estado para que ela lhe represente, defendendo seus interesses ao ingressar com um processo.

Importante observar que as Defensorias de cada estado podem ter regras específicas e diferentes, mas sempre respeitarão os limites da Constituição Federal.

MINISTÉRIO PÚBLICO:

O Ministério Público é uma instituição que busca assegurar e efetivar os direitos individuais e sociais mais importantes para a população. Porém, diferentemente da Defensoria Pública, nem sempre ele agirá como representante (ou seja, fazendo o “papel” de advogado) das partes.

Em assuntos relacionados ao Direito de Família, a atuação do Ministério Público acontece de duas maneiras: como fiscal da ordem jurídica e como substituto processual.

Como substituto processual, atuará defendendo direitos indisponíveis, em ações de alimentos, de investigação de paternidade, de guarda e convivência familiar. No entanto, a atuação do Ministério Público acontecerá dessa forma quando não houver Defensoria Pública atendendo a região.

Do contrário, quando a Defensoria Pública estiver presente, por uma questão organizacional e de estrutura, é por meio dela que os processos deverão ter início.

Devemos observar, porém, que existem algumas peculiaridades em relação à atuação do Ministério Público, dependendo da estrutura de cada região.

Em Curitiba, por exemplo, há um centro de apoio operacional das Promotorias de Justiça voltada a atender casos de investigação de paternidade, o chamado Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça das Comunidades, também conhecido como Promotoria de Investigação de Paternidade do CAOP de Proteção aos Direitos Humanos.

Assim, em Curitiba, aqueles que pretendem ingressar com uma ação de investigação de paternidade podem escolher entre procurar o Ministério Público ou a Defensoria Pública – caso não tenham condições de contratar um advogado particular.

Como fiscal da ordem jurídica, o Ministério Público intervirá em processos que envolvam interesses públicos ou sociais e naqueles em que existam interesses de incapazes, tais como crianças, adolescentes, idosos, portadores de deficiência, etc. A atuação do órgão se dá com o objetivo de garantir que os interesses desses grupos de pessoas sejam preservados.

Igualmente, a população pode recorrer ao Ministério Público a fim de buscar orientações sobre como proceder em determinadas situações e tirar dúvidas que possam existir, pois também é papel da instituição atender ao público que o procura e encaminhar os interessados, se for o caso, para os órgãos e locais competentes para resolução de seus problemas.

Importante observar que, na maioria dos processos da área do Direito de Família, o Ministério Público atua como fiscal da ordem jurídica. Nesses casos, ele não se manifestará na ação em nome de uma das partes, pois não exerce a função de advogado, ou seja, ele intervém no processo de forma a verificar se as leis e direitos estão sendo respeitados, principalmente no que diz respeito aos processos que envolvem crianças e adolescentes.

Em poucos casos o Ministério Público será o responsável por dar início aos processos nas Varas de Famílias, principalmente quando tiver sido implantada Defensoria Pública no estado, que faça as vezes.

Podemos concluir, portanto, que, apesar de ambos os órgãos possuírem interesse na efetivação de direitos que são realmente importantes para a sociedade, cada um atuará de acordo com sua esfera e dentro de seus limites.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Sair da versão mobile