Dupla maternidade: casos de inseminação artificial caseira

A inseminação artificial caseira acontece quando quem pretende engravidar utiliza o material genético do doador e o insere (geralmente com uma seringa) para tentar a fecundação, sem que seja mantida uma relação sexual.

Para facilitar a visualização sobre uma situação assim, segue o exemplo de um caso prático: um casal homoafetivo de duas mulheres, vivendo em união estável[1], deseja ter um filho (ou filha), porém, não possui condições de arcar com os custos de uma reprodução assistida realizada por meio de clínicas médicas.

Assim, decidem utilizar o material genético de um terceiro, a fim de que uma delas engravide. Nesse caso, quem será considerada mãe? Quais são as implicações de tal conduta?

Existem duas principais situações que podem surgir relacionadas à inseminação artificial caseira: a) o filho já nasceu, possui certa idade, e desenvolveu uma relação de afetividade com a companheira não gestante – o que autorizaria o reconhecimento do vínculo familiar pela socioafetividade; ou b) a criança ainda não nasceu, mas deve ser pleiteada autorização judicial para que se registre a maternidade de ambas companheiras quando de seu nascimento – caracterizando-se, então, a dupla maternidade.

Como se sabe, o conceito de família independe do gênero e da sexualidade das pessoas que a compõem, conforme reconheceu a Suprema Corte no julgamento da ADPF nº 132: “A Constituição de 1988, ao utilizar-se da expressão ‘família’, não limita sua formação a casais heteroafetivos nem a formalidade cartorária, celebração civil ou liturgia religiosa. […] Isonomia entre casais heteroafetivos e pares homoafetivos que somente ganha plenitude de sentido se desembocar no igual direito subjetivo à formação de uma autonomizada família” (ADPF 132, Rel. Min. Ayres Britto, j. 5-5-2011).

Além disso, as várias mudanças de comportamento na sociedade atual resultaram em transformações nas suas estruturas de convívio, notadamente a familiar.

Assim, o Direito de Família passou a reconhecer a afetividade como elemento identificador dos vínculos familiares, desprendendo-se da verdade biológica ou registral, para reconhecer a socioafetividade como parâmetro em lides que se discutem a parentalidade.

É nesse contexto que o fenômeno da inseminação artificial heteróloga – com material genético doado por um terceiro – encontra guarida, pois a parentalidade, que antes era obtida apenas biologicamente ou gestacionalmente, passou a ser obtida também por meio dos laços de afetividade.

Voltando a atenção ao caso mencionado, de “inseminação artificial caseira”, tem-se que seria uma forma de inseminação heteróloga, porém, sem a participação de profissionais da saúde (clínicas médicas de reprodução assistida).

O método da inseminação artificial caseira, vale dizer, não é cientificamente reconhecido e tampouco recomendado, ainda que seja realizado com intuito admirável e em decorrência da falta de recursos financeiros. No referido formato de reprodução, há maiores riscos para a saúde da mulher, tais como a transmissão de doenças, tendo em vista a introdução de material biológico sem avaliação adequada.

Afora isso, o Conselho Federal de Medicina, na Resolução 2013/2013, determina que a doação de material genético deve ser anônima e sem trocas financeiras entre as partes. Os pais também precisam ter, no máximo, 50 anos de idade. Tais circunstâncias, contudo, não são fiscalizadas quando é feita a inseminação caseira.

Nessa situação, ao contrário do que acontece nas inseminações artificiais com acompanhamento médico, o doador não costuma ser completamente anônimo e há o risco, pois, de que o genitor venha a reivindicar o reconhecimento da paternidade em algum momento.

Existem os casos nos quais o material genético é recebido porque as pessoas buscam em grupos aqueles interessados em realizar a doação. Há quem opte, inclusive, por realizar um contrato, no qual o doador “abre mão” de seus direitos relacionados à paternidade. Apesar disso, a validade jurídica do documento está condicionada a um julgamento isolado, já que envolve menores de idade e o procedimento não é regulamentado aqui no Brasil.

As resoluções do Conselho Federal de Medicina regulamentam, de certo modo, as reproduções assistidas no Brasil, todavia, acerca das situações nas quais não há a participação de médicos – como na inseminação caseira – não podem ser aplicadas tais resoluções.

Afora isso, o Provimento 63/2017, do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, possibilitou o reconhecimento extrajudicial das filiações socioafetivas e registro dos filhos havidos por métodos de reprodução assistida, mas não tratou da inseminação caseira. No referido provimento, são exigidos diversos documentos que aqueles que realizam a inseminação caseira não poderão apresentar (como documentos médicos).

Restando pendente de regulamentação a dupla maternidade em caso de nascimento de criança gerada por inseminação caseira, é somente por meio de uma determinação judicial que se torna possível a realização do registro em nome daquelas que pretendem o projeto parental.

Apesar de ser um tema polêmico, com diversos desdobramentos, a inseminação caseira já conta com adeptos no país, cabendo ao Direito, então, responder as causas que surgirem, mesmo que novas e inusitadas – sob pena de omissão da tarefa da prestação jurisdicional.

Em que pese não haja uma regulamentação na qual se enquadre a inseminação caseira, também não há previsão de penalidades quando da sua realização, até porque o CFM não é um órgão legislativo. Contata-se, portanto, uma “lacuna”.

O fato de não existir regramento que ampare a inseminação artificial caseira não pode servir, contudo, no entender do Direito Familiar, como fundamento para que as famílias originadas deste procedimento sejam impedidas de receber proteção jurisdicional.  

Nesse sentido, compartilha-se o entendimento do Elton COSTA, servidor junto ao TJMA[2]:

“Como a efetivação, na prática, da tutela jurisdicional protetiva do afeto e da pluralidade das conformações familiares, bem assim que não podemos olvidar, jamais, das situações reais vivenciadas pelas pessoas, tampouco ignorar as consequências jurídicas dessas relações. O Direito das Famílias não se revela contemplativo quando observado tão somente sob a fria letra da lei, muito menos sob a gélida ótica da sua ausência. O fato de não existir regramento legal que ampare a inseminação artificial caseira não pode servir como fundamento para que as famílias originadas deste procedimento sejam impedidas de receber o seu devido amparo jurídico. Em suma, família é amor, é afeto, é busca pela felicidade dos seus integrantes e não nos cabe – sociedade e/ou Estado-juiz – questionar de que modo ela se configura”.

Como se sabe, o Direito é um fenômeno sujeito à mutabilidade de conceitos sociais e precisa adaptar-se às mudanças de costumes.

Impedir o reconhecimento da dupla maternidade, por não ter a inseminação artificial sido realizada em uma clínica, centro ou serviço de reprodução humana violaria, pois, de forma frontal os princípios constitucionais da isonomia e da proteção à família, positivados nos artigos 5º, inciso I, e 226, caput, da Constituição Federal.

Isso não quer dizer, contudo, que eventual decisão judicial autorizando o pedido de dupla maternidade será proferida sem observar nenhum critério. Em qualquer ocasião, entende-se que o juízo deve avaliar alguns pontos relacionados ao caso, antes de decidir. Por exemplo, caso o bebê ainda não tenha nascido, deve-se verificar como se deu a construção daquele plano parental, e se contou com a manifestação de vontade expressa de ambas as envolvidas.

Caso se esteja a pleitear o reconhecimento da maternidade socioafetiva por aquela que não gestou, os requisitos a serem averiguados serão os mencionados no texto “’Pai ou mãe é quem cria!’: entenda o que é a parentalidade socioafetiva” (clique aqui).

Arethusa Baroni

Laura Roncaglio de Carvalho

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[1] Se falássemos em casamento, abriríamos outra discussão, sobre a presunção da paternidade/maternidade, que não deve ser o foco do presente texto.

[2] Disponível em: https://ocivilista.com.br/2020/12/19/sentenca-sobre-inseminacao-artificial-caseira-no-maranhao/

ADOÇÃO: 8 tópicos importantíssimos que você precisa saber!

Adoção

  1.  Eu quero adotar, qual é a primeira medida que devo tomar? 

O primeiro passo é procurar a Vara da Infância e Juventude de seu município e obter as informações acerca de quais são os documentos que devem ser apresentados. Alguns deles são:  identidade; CPF; certidão de casamento ou nascimento; comprovante de residência; comprovante de rendimentos ou declaração equivalente; atestado ou declaração médica de sanidade física e mental; certidões cível e criminal. Para dar início ao processo de habilitação à adoção, é preciso contratar um advogado (ou ser representado pela Defensoria Pública) que ingressará com o pedido para que seu nome passe a fazer parte do cadastro de pretendentes à adoção.

  1. Há uma preparação específica para quem pretende adotar?

Sim. É necessário fazer um curso de preparação psicossocial e jurídico, além de realizar avaliação psicossocial (com entrevistas por psicólogas e assistentes sociais, bem como visita domiciliar). O formato da preparação pode variar de estado para estado. Depois da aprovação nessa fase, aquele que pretende adotar entrará na “fila” de espera para a adoção, e aguardará até que apareça uma criança ou adolescente com o perfil compatível, para que seja proposta a demanda. 

O processo de preparação é importante para que fiquem bem claras as consequências de uma adoção, que são muito sérias. Algumas razões apresentadas pelos que querem adotar (como por exemplo solidão; perda de um ente querido; superar crise conjugal) podem fazer com que se verifique que essa pessoa não está apta a adotar. Além disso, é preciso lembrar que a criança ou adolescente possui uma história antes daquela família e, por isso, passará por uma fase de adaptação que, em alguns casos, pode ser conturbada . É essencial que quem pretende adotar tenha conhecimento disso para lidar com eventuais dificuldades. 

  1. A adoção pode ser realizada por estrangeiros?

Sim. Sendo esse o caso, ela será considerada internacional. Mesmo se o adotando for brasileiro, se o destino de residência dos adotantes for fora do país, será considerada adoção internacional. A adoção internacional somente será concedida quando forem esgotadas todas as tentativas de manutenção da criança em seu país de origem e com os pais biológicos, sendo exigido estágio de convivência no Brasil.

  1. Existe adoção após a morte do adotante?

Ela pode acontecer, desde que o adotante tenha manifestado expressamente sua vontade de adotar em vida (ou seja, se já estiver tramitando a ação de adoção). Há quem entenda que a morte do(a) candidato(a) antes da adoção deveria ter por consequência a interrupção e extinção do processo, no entanto, o Estatuto da Criança e do Adolescente admitiu a conclusão do procedimento, visando resguardar os laços de afetividade com outros familiares eventualmente estabelecidos durante o processo.

  1. A partir de que momento a adoção começa a produzir efeitos?

Em regra, a sentença de adoção produz efeitos após o seu trânsito em julgado (que ocorre quando não existe mais a possibilidade de recurso). No caso de adoção póstuma (ou seja, após a morte do adotante), entretanto, os efeitos da sentença retroagirão ao momento da morte do adotante (o que quer dizer que a sentença “valerá” a partir do falecimento de quem estiver adotando).

  1. Há o rompimento com os pais biológicos?

A adoção é uma forma de constituição da filiação e tem por consequência a extinção da relação familiar mantida pela criança ou adolescente com sua família anterior (ao menos formalmente), garantindo-se a segurança jurídica e a proteção do(a) adotado(a).

O procedimento de adoção e a sentença transitada em julgado fazem com que se estabeleça uma nova relação de parentesco entre o adotante e o adotado. Inclusive, a autoridade parental será concedida ao adotante. Desse modo, os filhos e netos do adotado também serão parentes do adotante, e enquanto os irmãos biológicos, por exemplo, deixam de ter vínculo com o adotado, exceto para os impedimentos matrimoniais (artigo 1.521, incisos I, III e V, do Código Civil).

  1. Como são feitas as alterações do registro de nascimento do(a) adotado(a)?

O adotado receberá o nome do adotante e será procedida a alteração da Certidão de Nascimento, sem referências ao procedimento de adoção. Caso os adotantes já tenham outros filhos, o sobrenome atribuído ao adotado deve ser o mesmo, para que não aconteça qualquer discriminação. Existe a possibilidade de alteração do primeiro nome também, desde que isso esteja de acordo com os interesses do adotado. Em caso de divergência, o Juízo decidirá.

  1. Aquele que foi adotado(a) pode procurar seus pais biológicos no futuro?

Não há a possibilidade de se investigar a parentalidade (https://direitofamiliar.com.br/o-que-e-investigacao-de-paternidade/) após a adoção. Apesar disso, o adotado pode buscar sua ascendência genética, sem efeitos patrimoniais, ou seja, em regra não há  como alterar a filiação e requerer que sejam produzidos os efeitos (nome, herança, pensão alimentícia…), mas aquele que foi adotado pode querer saber seus laços consanguíneos (https://direitofamiliar.com.br/investigacao-de-paternidade-x-investigacao-de-ascendencia-genetica/) ou ter acesso ao processo de adoção, depois de completar 18 anos.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Multiparentalidade: entenda esse novo conceito

Multiparentalidade

Vocês já se depararam com notícias como as seguintes?

  • Uma decisão inédita na Justiça Acreana garantiu que a menor A. Q. da S. e S. passe a ter o nome de dois pais em sua certidão de nascimento: o que a registrou e o biológico. (Acre)1.
  • A Justiça de Vitória da Conquista (BA), de forma inédita, homologou acordo concedendo adoção de uma criança a um casal de mulheres sem destituir o poder familiar da genitora, reconhecendo a tese da multiparentalidade. A criança terá o nome das três mães no registro de nascimento. (Bahia)2
  • A juíza Ana Maria Gonçalves Louzada, presidente do IBDFAM/DF, com base na tese da multiparentalidade, decidiu que deve ser reconhecida tanto a paternidade socioafetiva como a biológica, com todos os seus efeitos legais, devendo constar no registro de nascimento da menor de idade a dupla paternidade e estabeleceu a guarda em favor da mãe e do pai afetivo, com a convivência livre a favor do pai biológico. (Distrito Federal)3
  • Uma criança da comarca de Nova Lima terá em seu registro o nome de duas mães e de um pai. Constará no documento o nome da mãe biológica e dos pais adotivos. (Minas Gerais)4
  • Agora, pela primeira vez no país, uma decisão judicial admite acrescentar ao registro de nascimento de menor adotado, o nome de seu genitor e de seus avós paternos, mantendo-se a paternidade adotiva e registral, com o acréscimo do patronímico do pai biológico. (Pernambuco)5
  • A Justiça do Rio de Janeiro reconheceu o direito de três irmãos terem duas mães, a biológica e a socioafetiva, em seus registros de nascimento. (Rio de Janeiro)6

Nem todas as notícias citadas acima são muito recentes (2014), mas, todas elas dizem respeito a casos em que foi reconhecida a MULTIPARENTALIDADE! De um modo geral, esse é um tema que pode ser considerado relativamente novo para o Direito de Família e é o assunto deste artigo.

Para começar, precisamos tecer um breve histórico para entendermos como o ordenamento jurídico brasileiro recebeu a multiparentalidade.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 reconheceu as diversas formas de se constituir uma entidade familiar, abrindo espaço para um padrão diferente da família, com preocupações voltadas ao desenvolvimento individual dos integrantes do núcleo familiar e, principalmente, com a valorização da afetividade, perdendo força o caráter matrimonial e essencialmente patrimonial da família de outrora, construída quando da vigência do Código Civil de 1916.

Com o crescimento da importância dada à afetividade e com o reconhecimento da igualdade entre todos os filhos, o afeto passou a ser juridicamente mais relevante. Importante lembrar que, o afeto, juridicamente falando, não possui o mesmo significado da psicologia ou da filosofia, conforme já mencionamos no artigoPai ou mãe é quem cria!: Descubra como o Direito entende isso” (clique aqui). No âmbito legal, ele é demonstrado por condutas do cotidiano e não pelo mero sentimento em si.

Embora nem todas as inclinações afetivas gerem o vínculo socioafetivo de filiação, esta forma de exercício da parentalidade passou a ser recebida pela doutrina e pela jurisprudência, gerando, inclusive, todos os efeitos decorrentes da relação paterno-filial (ou materno-filial), ainda que não haja lei específica a regulamentando.

Primeiramente, com o reconhecimento das famílias homoafetivas (formada por pessoas do mesmo gênero – feminino/ masculino), abriu-se um precedente para a inclusão de mais de um pai ou mais de uma mãe no registro de nascimento dos filhos, já que, nesses casos, aconteceria sempre uma “dupla maternidade” ou “dupla paternidade”.

Verificou-se, ademais, que, embora os padrastos e madrastas não tenham, por lei, determinadas obrigações em relação aos seus enteados, com o aumento das famílias reconstituídas (formadas por quem já teve um casamento ou relacionamento anterior), aumentaram também as chances de aparecimento de laços afetivos que geram efetivamente uma relação de filiação socioafetiva.

Assim, nas famílias reconstituídas e nas demais modalidades familiares que possam surgir, algumas situações passaram a merecer ponderação, nas quais se cria uma relação de socioafetividade (que exige seu reconhecimento) sem que se desconsidere o valor e o contato com o genitor biológico.

Nesses casos, a multiparentalidade, ou seja, o estabelecimento de vínculo do filho com mais de um pai ou com mais de uma mãe, apresenta-se como solução ao novo impasse trazido pelas contemporâneas relações familiares. Com a aplicação da multiplicidade de vínculos, nenhum dos pais será excluído da relação familiar, o que, em muitos casos, vem em benefício do filho.

A multiparentalidade pode ser simultânea, quando ambos os pais (ou mães) exercem de fato a função que lhes cabe ou, ainda, temporal, quando um dos genitores faleceu e, no entanto, alguém assumiu o papel de pai ou de mãe, tornando-se referência para a criança ou adolescente.

Vale deixar claro que, a multiparentalidade gera todos os efeitos da filiação para os envolvidos e, por isso, somente deve ser estabelecida quando, de fato, ela estiver presente para os filhos, pois o principal vetor observado na resolução dos conflitos acerca de causas dessa natureza é o do melhor interesse da criança.

Conclui-se, portanto, que a multiparentalidade pode ser avaliada como uma das consequências do reconhecimento da filiação socioafetiva no Brasil.

Entende-se que a ausência de legislação específica sobre a multiparentalidade não impede que ela seja aplicada, até porque a maioria das questões que envolvem este assunto pode ser resolvida com base nas leis vigentes, sendo necessária, contudo, a interpretação de maneira distinta, com o intuito de proteger as entidades familiares, nos termos propostos pela Constituição e objetivando-se a adequação da regra ao caso concreto.

É preciso analisar profundamente cada hipótese de multiparentalidade que se apresentar, isso para que não sejam empreendidas injustiças e também para que fiquem sempre aparentes os efeitos dessa multiplicidade parental, evitando-se, desse modo, possíveis danos aos filhos e aos demais envolvidos.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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2 http://www.ibdfam.org.br/noticias/5483/Acordo+garante+a+crian%C3%A7a+o+direito+de+ter+tr%C3%AAs+m%C3%A3es

3 http://www.ibdfam.org.br/noticias/5329/Multiparentalidade+preserva+interesse+do+menor

4 http://www.tjmg.jus.br/portal/imprensa/noticias/crianca-tera-duas-maes-e-um-pai-em-seu-registro.htm#.VBtGxRYXM_I

5http://www.tjpe.jus.br/agencia-de-noticias?p_p_auth=UioV2Mmm&p_p_id=101&p_p_lifecycle=0&p_p_state=maximized&p_p_mode=view&_101_struts_action=%2Fasset_publisher%2Fview_content&_101_assetEntryId=435557&_101_type=content&_101_urlTitle=artigo-adocao-multiparental&redirect=http%3A%2F%2Fwww.tjpe.jus.br%2Finicio%3Fp_p_id%3D3%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dmaximized%26p_p_mode%3Dview%26_3_groupId%3D0%26_3_keywords%3DMULTIPARENTALIDADE%26_3_struts_action%3D%252Fsearch%252Fsearch%26_3_redirect%3D%252Finicio

“Adoção à brasileira”: o que é isso?

Adoção à brasileira”

No artigo O que é adoção?” (clique aqui) explicamos que “a adoção é o ato pelo qual se cria um vínculo de filiação, até então inexistente, em que não há laço natural (genético).

Para que uma adoção se concretize, existem requisitos previstos em lei: decisão judicial, consentimento dos pais biológicos (a não ser que sejam destituídos do poder familiar), consentimento do adotando (se maior de 12 anos), estágio de convivência, entre outros. É preciso passar por todo um processo para que ela venha, então, a ser concedida.

Apesar de todo esse procedimento ser obrigatório, você já deve ter se deparado com situações como as que seguem:

  • Conheci um rapaz quando estava grávida do meu ex, ele estava ciente da situação e quis assumir. Enquanto eu estava na maternidade e tinha acabado de ganhar a bebê, ele foi registrar minha filha sem meu consentimento. Mas como eu estava com ele na época, eu não recorri.”

  • Tenho uma menina de 10 anos registrada só no meu nome. O meu esposo criou desde a barriga e agora gostaria de registrá-la”.

  • Meu caso é, me separei do meu marido e me relacionei com outra pessoa e engravidei, ele não quis assumir a criança e me abandonou, contei tudo para o meu marido e ele sabe que a criança não é filha dele, mas, mesmo assim, decidiu criá-la e registrá-la como se fosse filha dele”.

  • Minha filha teve uma filha com um rapaz e este rapaz foi preso no dia que tinha que registrar a criança, agora ela está em outro relacionamento e quer registrar com o nome de outro”.

No presente artigo, falaremos um pouco mais sobre a ADOÇÃO À BRASILEIRA!

Ela é caracterizada em casos como os mencionados acima, nos quais alguém registra como se fosse seu um filho que sabe ser de outra pessoa, ou seja, o que acontece é uma adoção irregular, já que não seguiu todos os trâmites legais necessários. A essa adoção irregular é dado o nome de “adoção à brasileira”.

As situações citadas acima são algumas das que vemos diariamente nas Varas de Família e, por isso, resolvemos escrever este texto para alguns esclarecimentos!

A “adoção à brasileira” é ilícita – contrária à norma jurídica – e não pode ser comparada ao ato formal e solene de adoção. Inclusive, a prática de “adoção à brasileira” – ou seja, registrar um filho de outra pessoa como se fosse seu – caracteriza um crime, previsto no artigo 242 do Código Penal:

Art. 242Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil:

Pena – reclusão, de dois a seis anos.

Parágrafo únicoSe o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza:

Pena – detenção, de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar a pena.

Podemos observar, então, que as situações que envolvem esse tipo de registro devem ser analisadas com muita cautela.

É que, se de um lado aquela adoção é ilícita – não podendo, em tese, tornar-se válida –, de outro lado também temos no Direito o que se chama de filiação “socioafetiva”.

Esse tipo de filiação decorre da relação entre pais, mães e filhos, cuja origem vem do vínculo afetivo existente entre eles, não sendo necessário que haja um vínculo genético, ou seja, para ser mãe ou pai, não é preciso ter sido aquele que gerou o filho, mas sim, aquele que exerce, de fato, a função paterna ou materna.

Para saber mais sobre o assunto, você pode conferir o artigo “Pai ou mãe é quem cria!: Descubra como o Direito entende isso” (clique aqui).

Entende-se, portanto, que, em relação à prática de uma conduta ilícita, isso vem sendo bem relativizado no Direito de Família (que é diferente da criminal), cabendo ao juiz competente analisar criteriosamente todas as circunstâncias que envolvem cada caso.

Por exemplo, para Rolf MADALENO, o intuito de se dedicar como pai e mãe, dando afeto aos filhos “constrói a paternidade ou maternidade socioafetiva e retira por sua intenção altruísta a conotação pejorativa e ilícita, porque trata dos pais do coração”1.

Assim, tem-se que, dependendo do caso, embora a adoção à brasileira seja um comportamento criminoso, fato é que, existindo o vínculo socioafetivo, o registro irregular, assim como a adoção, torna-se irrevogável, ou seja, não pode ser facilmente desfeito, por conta do superior interesse das crianças e dos adolescentes.

Estabelecido o registro, “será possível vislumbrar uma relação jurídica paterno filial decorrente do vínculo socioafetivo, não se recomendando, às vezes, a sua extinção, sob pena de comprometimento da própria integridade física e psíquica do reconhecido”2.

Muitas vezes, o que acontece é que o registro é efetuado sem que se tenha noção de suas consequências e, por conta disso, aquele pai – por exemplo – que realizou o registro, tenta posteriormente negar aquela paternidade, alegando a ausência de ligação biológica (“Registrei uma criança que não é meu filho biológico, e agora?” – clique aqui).

Geralmente, esses pedidos de desconstituição da paternidade aparecem depois do término da relação afetiva com a mãe daquele filho que foi reconhecido indevidamente.

Nesses casos, o entendimento predominante é o de que, apesar de o registro ter sido realizado de forma irregular, estando presente a paternidade socioafetiva, ele será mantido e quem registrou será considerado pai para todos os fins (especialmente se o pai biológico também não é presente).

Assim, embora a “adoção à brasileira” não possa ser considerada tecnicamente uma adoção, ela poderá ter seus efeitos jurídicos protegidos (direitos e deveres decorrentes da relação de filiação), até porque não faria sentido permitir um tratamento diferenciado, aceitando-se eventualmente o arrependimento de quem praticou o ato de forma irregular com consciência de que o estava praticando de forma equivocada.

Situações como as que citamos acima são mais comuns do que você pode imaginar. Certo é que, como sempre falamos em nossos artigos, cada caso deverá ser analisado levando em conta as suas particularidades. Cada pessoa tem uma história de vida, e isso conta muito na hora da análise do caso concreto.

E aí!? Você conhece algum caso de “adoção à brasileira”?

Compartilha com a gente CLICANDO AQUI!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1 MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 4ª Ed. Editora Forense. Rio de Janeiro, 2011.

2 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

“Barriga de Aluguel”: Gestação em útero alheio

Você já deve ter ouvido falar sobre “barriga de aluguel”, não é mesmo? São aquelas situações nas quais a mulher, por algum motivo médico, não possui condições de gerar o filho em seu útero e a gestação, por conta disso, será exercida por outra pessoa.

Em que pese se diga barriga “de aluguel”, vamos ver neste artigo que, no Brasil, o recebimento de valores para gestar é proibido! Tal proibição está entre um dos demais requisitos para que o procedimento aconteça, sobre os quais trataremos em seguida.

Importante dizer, primeiramente, que a gestação em útero alheio não está prevista na legislação civil brasileira, mas é regulamentada por Resolução do Conselho Federal de Medicina 1.

Há duas modalidades: uma é aquela em que a mulher é tida somente como “portadora”, já que apenas cede o útero para a gestação e a outra em que é considerada “mãe de substituição” por oferecer, além do útero, seus óvulos.

O procedimento pode ser indicado quando a mulher possui: idade avançada, pobre resposta ovariana, má qualidade dos óvulos, sucessivas falhas em tentativas de inseminação artificial, endometriose avançada e abortos de repetição com causa desconhecida.

Existem, contudo, exigências para que se possa efetivar a gestação em útero alheio. Os requisitos mais relevantes para que ela aconteça são os seguintes:

a) a mãe gestacional deve pertencer à mesma família dos interessados em realizar a gestação;

b) o empréstimo do útero deverá ter caráter gratuito e

c) a técnica somente poderá ser aplicada nos casos em que a mulher efetivamente não puder ficar grávida por razões médicas 2.

O ideal, portanto, é que a gestação em útero alheio seja realizada somente em casos mais extremos, nos quais se demonstrou efetivamente que a gravidez seria prejudicial à saúde da mulher.

Caso seja realizada a doação de óvulos – além da cessão de útero – ela também não poderá envolver fins lucrativos (similarmente ao que acontece nas situações em que se busca o banco de sêmen, embora não exista, ainda, banco de óvulos no Brasil).

Em relação ao reconhecimento dos filhos, sabe-se que o mais comum seria a presunção de que mãe é aquela que pariu o filho. Porém, nas situações de gestação em útero alheio, há necessidade de se avaliar com mais cuidado:

Tradicionalmente, ou segundo as leis vigentes, a verdadeira mãe é aquela que dá a luz à criança, ou a que pariu. […] Tal concepção, no entanto, não pode ser acolhida. Nos tempos atuais, não revela um caráter de verdade sólida, diante do fato da fecundação artificial. E nesta forma de procriar a vida, partiu-se para um fundamento da paternidade ou maternidade diferente da tradicional. A paternidade ou maternidade passou a fundar-se em nova explicação: o ato preciso da vontade3.

Conclui-se, então, que a vontade das partes, nesses casos, externada pela concordância com o procedimento fecundante, seria fator decisivo para se determinar a relação de filiação.

É imprescindível, portanto, a concordância dos envolvidos para a regularidade do ato, a fim de que as partes comprometam-se com a situação, e até mesmo para a proteção da criança que nascerá, evitando-se, com isso, que os envolvidos venham, futuramente, a repelir a filiação instituída.

Assim, “se surgir algum conflito entre a mãe gestante e aqueles que contrataram com ela, o caso deverá ser resolvido em função de suas particularidades e do superior interesse da criança”4, não importando somente a realidade biológica, mas os outros vínculos advindos, primeiramente, do desejo dos pais de terem o filho em sua companhia.

Caso seja, por um equívoco, declarada a maternidade da mãe gestacional no registro da criança, devem ser tomadas as medidas cabíveis no sentido de resguardar os pais que manifestaram a vontade de ser genitores e procuraram a realização do procedimento. Dessa maneira, será resguardado, além do interesse dos genitores, também o direito do filho de ser criado pelos pais que efetivamente o desejaram e esperaram.

Tem-se, assim, que a presunção da maternidade perdeu seu caráter absoluto de outrora. Para a eventual averiguação da filiação, deverão ser analisados outros quesitos além do laço consanguíneo, pois não se estabelece vínculo de filiação com a mãe gestacional ou com eventual doador de sêmen, vez que não houve a intenção de paternidade e maternidade.

O elo de filiação deve ser dimensionado de acordo com os aspectos biológicos, mas também em conformidade com a sua extensão social.

Conforme já se tratou em diversos artigos do canal, a família contemporânea é “orientada pelo princípio da solidariedade em função da afetividade e laços emocionais conjuntos”5 e, por isso, o paradigma que a define atualmente parece ser muito mais afetivo do que meramente biológico.

Sobre a socioafetividade, sugere-se a leitura do seguinte artigo: “’Pai ou mãe é quem cria!’: Descubra como o Direito entende isso” (clique aqui).

Conclui-se, então, que, embora algumas pessoas acreditem que um contrato de gestação em útero alheio não terá efeitos, se ele for elaborado dentro dos parâmetros recomendados, há uma relação jurídica que deverá ser protegida.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1 Resolução CFM 2121/2015. VII – Sobre a gestação de substituição (doação temporária de útero). As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em caso de união homoafetiva.

2 Resolução CFM 2121/2015. VII – Sobre a gestação de substituição (doação temporária de útero). As clínicas, centros ou serviços de reprodução humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contraindique a gestação na doadora genética ou em caso de união homoafetiva. 1 – As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família de um dos parceiros num parentesco consanguíneo até o quarto grau (primeiro grau – mãe; segundo grau – irmã/avó; terceiro grau – tia; quarto grau – prima). 2 – A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.

3 RIZZARDO, Arnaldo. Direito de Família. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

4 MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

5GRISARD FILHO, Waldyr. Famílias Reconstituídas. São Paulo: RT, 2010.

Utilizando registros de redes sociais como prova em um processo

Com o avanço da tecnologia, passamos a nos comunicar por diversos meios que antes não existiam, tais como mensagens de celular e também através das redes sociais.

Assim, é natural que o sujeito envolvido em algum conflito judicial queira utilizar esses registros das conversas ou de fotos, por exemplo, como meios de prova dentro de um processo.

Ocorre que, como se sabe, existem diversos aplicativos e programas que permitem a montagem e a alteração desses dados, o que torna duvidosa a veracidade dos documentos, fazendo com que uma decisão judicial baseada somente nesses registros perca sua “força”.

Diante disso, você pode se perguntar: Como utilizar corretamente os registros de redes sociais como prova dentro de um processo?

E nós respondemos: por meio da ata notarial!

A ata notarial é um instrumento público, lavrado em cartório pelo tabelião de notas, que serve para formalizar a constatação de um fato. É por meio desse documento que os “fatos” existentes nas redes sociais, nas mensagens de celular e também em outros locais serão transformados em meios de prova para serem apresentados em um processo judicial.

E como funciona o procedimento?

O notário é funcionário dotado de fé pública, o que significa dizer que tudo aquilo que ele certifica é presumido como verdadeiro, até que se prove o contrário. Assim, ele averiguará os fatos apresentados por aquele que pedir a elaboração do documento e fará o registro em seu livro. Por conta da fé pública, as informações que forem registradas passam a ter valor de prova e presumem-se verdadeiras.

O notário, para efetivar o registro daquele fato constatado, pode inclusive fazer “print screen” (ou seja, uma cópia, captura) da tela de aparelho eletrônico, bem como reproduzir textos, figuras e vídeos. Assim, se eventualmente aquela prova desaparecer com o tempo ou se for excluída do ambiente virtual, por exemplo, ela terá sido registrada no livro do tabelião, podendo ser utilizada a qualquer tempo.

Importante dizer que o notário “apenas narrará o fato, ele não poderá emitir juízo de valor ou modificar a situação fática”1, ou seja, a ata notarial serve tão somente para que se registre o que aconteceu de fato, sem qualquer análise sobre o fato em si.

Você pode estar se perguntando qual seria a diferença entre a ata notarial e a escritura pública, já que ambos são documentos públicos. Então, vamos às diferenças:

ATA NOTARIAL:

– não há manifestação de vontade

– narração de fatos

– se aquele que requereu o documento recusar-se a assiná-lo, “o tabelião poderá consignar tal ato e mesmo assim, a ata estará perfeita, válida e eficaz”, já que apenas constata uma situação

ESCRITURA PÚBLICA:

– há manifestação de vontade

– constituição de direitos

– se aquele que requereu o documento recusar-se a assiná-lo, ele será considerado incompleto, inválido e ineficaz, vez que trata de direitos

Um exemplo de escritura pública é aquela realizada por pessoas que vivem em união estável e pretendem ver declarada sua união. A escritura declara a vontade dos companheiros e a existência de uma união. Em decorrência disso, constituem-se os direitos advindos daquele relacionamento. A ata notarial, por sua vez, não possui a mesma função.

Dentro do Direito de Família, existem diversas formas de aplicação da ata notarial, a exemplo: “na constatação de cartas, fotografias, escritos, imóveis, residências, automóveis” 2 . Apesar disso, ela é mais utilizada para a constatação de fatos acontecidos no espaço da internet.

Veremos a seguir, alguns exemplos comuns de utilização da ata notarial no Direito de Família:

CONVERSAS VIA E-MAIL OU WHATSAPP: Se você quiser juntar ao processo “prints” de mensagens trocadas por e-mail ou Whatsapp, o ideal é que você leve seu aparelho até um tabelião (cartório) para que ele abra o e-mail/aplicativo e transcreva as mensagens ali constantes. Nesse momento, o tabelião explicará na ata notarial o procedimento que está sendo realizado para acessar as mensagens, informando, além do conteúdo, o remetente e destinatário, ou o número de telefone.

 FOTOS DE REDES SOCIAIS: Juntar fotos obtidas nas redes sociais é algo extremamente comum nos processos que envolvem discussões familiares. Se eventualmente em uma ação de pensão alimentícia , por exemplo, a pessoa está dizendo que tem condições financeiras precárias, mas você quer mostrar pelas imagens que ela aparenta levar uma vida que não condiz com o que fala (ex.: fotos de viagens pelo mundo, usando carros importados, etc.) encaminhe-se ao tabelião (cartório) e solicite que seja feito o mesmo procedimento realizado com as mensagens trocadas via Whatsapp, conforme explicamos acima.

Ressalte-se que os exemplos citados acima não abrangem todas as hipóteses de utilização da ata notarial para constituição de provas dentro de um processo, vez que existem outras possibilidades. No entanto, considerando o crescente uso da tecnologia para comunicação, acreditamos ser importante esclarecer principalmente sobre esses registros. 

É certo que a utilização das atas notariais no Direito de Família sempre deverá ser feita com cuidado, porque envolve situações muito delicadas e de caráter íntimo. Assim, a exposição – e o registro dos fatos – deve ser feita somente depois de ponderação, com a devida responsabilidade que se espera dos operadores do Direito e dos notários, devendo ser analisados os prós e os contras de se realizar uma ata, com a avaliação das possíveis consequências.

Arethusa Baroni

Laura Roncaglio de Carvalho

Flávia Kirilos Beckert Cabral


1 AGAPITO, Priscila. Atas Notariais no Direito de Família . In: Grandes Temas de Direito de Família e das Sucessões. Coordenadores: SILVA, Regina Beatriz Tavares da. CAMARGO NETO, Theodureto de Almeida. Editora Saraiva. São Paulo, 2014.

2 AGAPITO, Priscila. Atas Notariais no Direito de Família. In: Grandes Temas de Direito de Família e das Sucessões. Coordenadores: SILVA, Regina Beatriz Tavares da. CAMARGO NETO, Theodureto de Almeida. Editora Saraiva. São Paulo, 2014

O que é investigação de paternidade?

Antes de falarmos sobre a ação de investigação de paternidade, é preciso definir o termo “filiação”. Em um conceito geral, podemos resumir a filiação como sendo a relação entre pais e filhos, cujo vínculo pode ser de origem genética/biológica, afetiva ou registral. O direito a este vínculo de filiação é indisponível, ou seja, ninguém pode “abrir mão” dele.

Importante frisar que falaremos neste post sobre a investigação de paternidade considerando a hipótese de uma pessoa não ter sido registrada com o nome paterno, contendo apenas em sua certidão de nascimento o nome da mãe, a fim de traçar brevemente o caminho que será perseguido para se investigar a paternidade nessas situações.

Inúmeras são as causas que podem dar origem ao registro de um filho somente pela mãe, dentre elas: o pai ser desconhecido, existir dúvida sobre quem pode ser o pai, o suposto pai falecer antes do nascimento da criança ou não ser casado com a mãe, dentre várias outras hipóteses que podem existir.

A filiação se prova, em regra, pela certidão do termo de nascimento no Registro Civil. Conforme mencionamos acima, existem casos em que o filho nasce e não é reconhecido pelo pai biológico, ou até mesmo a própria mãe da criança deixa de informar quem é o pai. Quando isso ocorre é possível ingressar na Justiça com a ação de investigação de paternidade.

Mas como é o procedimento?

Pois bem, inicialmente, devemos esclarecer que, quando uma criança é registrada somente pela mãe, o cartório do registro de nascimento deverá informar essa situação ao Ministério Público, que tentará entrar em contato com a genitora e com o suposto pai, a fim de que se tente o reconhecimento da paternidade de forma mais rápida e amigável. Caso o genitor não seja encontrado ou se negue a reconhecer a paternidade sem a necessidade de um processo, o caminho será, então, pelo ingresso de uma ação judicial. Este procedimento poderá ser iniciado a qualquer momento, inclusive, independentemente da atuação do Ministério Público.

O procedimento de averiguação se dará da seguinte maneira: a pessoa interessada deverá informar ao Judiciário quem é o suposto pai. Sendo o autor da ação menor de idade, ele deverá estar representado por sua genitora, ou, por outro responsável legal, que indicará logo no início da ação todos os dados do possível pai, para que esse tome conhecimento da ação (por meio da citação por oficial de justiça) e apresente sua defesa.

A maneira mais eficaz de descobrir se há vínculo de paternidade entre o suposto pai e o filho é realizando o exame de DNA. Em data a ser designada pelo Juiz, geralmente depois da apresentação da defesa, será agendada a coleta do material genético tanto da criança, quanto do suposto pai (e, às vezes, da mãe também), para realização do exame.

E se o suposto pai não quiser fazer o exame de DNA?

Quando a parte investigante pede a realização do exame de DNA, é comum ouvirmos que alguns homens se recusam a realizá-lo, por não serem obrigados a “produzirem provas contra si mesmos”.

Apesar disso, é importante deixar claro que o não comparecimento do suposto pai na realização do exame de DNA, sem qualquer motivo justificado, faz surgir a presunção de paternidade, ou seja, se ele não comparecer na data da coleta do material genético, ficará subentendido que é efetivamente o pai do investigante (será uma prova contra ele, portanto), mesmo sem a comprovação real pelo exame de DNA.

Essa presunção é o que se pode chamar no meio jurídico de “relativa”. Isso porque o juiz precisará analisar a recusa do pai em fazer o exame de DNA em conjunto com as outras provas juntadas ao processo.

E se o suposto pai não for encontrado?

Se o suposto pai não for encontrado para responder a ação (pode ser que ele more em local desconhecido ou então que a genitora não tenha todas as informações necessárias sobre ele), ou caso não se realize o exame de DNA, a parte investigante terá que comprovar, com o depoimento de testemunhas, a existência de relacionamento afetivo entre ela e o suposto pai.

O ideal é que as testemunhas sejam pessoas que tiveram contato com as partes, como amigos do pai e da mãe ou parentes do possível pai. Além disso, o investigante pode promover a juntada aos autos de fotos, a fim de demonstrar a semelhança física, ou de outras provas que entender necessárias.

E se o suposto pai já tiver falecido?

Sendo o suposto pai falecido, os seus herdeiros serão chamados ao processo. Observe-se, porém, que, por se tratar de ato personalíssimo, os herdeiros não podem reconhecer voluntariamente o filho (autor da demanda), vez que esse reconhecimento somente poderia ser realizado pelo próprio genitor, quando vivo. Será necessária, nessa hipótese, a produção de provas para a efetiva declaração da paternidade, dentre elas, podemos citar como exemplos a realização de exame de DNA com os herdeiros do suposto pai falecido, ou até mesmo com os restos mortais do investigado – quando isso for possível.

Realizado todo o procedimento e, sendo constatado o vínculo de paternidade, ele será declarado por sentença judicial. Feito isso, será expedido um documento chamado de “mandado de averbação”, com as novas informações que deverão ser incluídas no registro de nascimento, tais como o nome do pai e dos avós paternos. Esse documento deve ser encaminhado (pelas próprias partes ou pela Vara de Família) ao cartório em que foi realizado o registro, para que sejam feitas as alterações devidas.

Questões que envolvem a discussão acerca da paternidade vão muito além do que as que foram tratadas no presente artigo e serão abordadas conforme suas peculiaridades em outros posts. Continue acompanhando!

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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