Utilizando registros de redes sociais como prova em um processo

ata notarialCom o avanço da tecnologia, passamos a nos comunicar por diversos meios que antes não existiam, tais como mensagens de celular e também através das redes sociais.

Assim, é natural que o sujeito envolvido em algum conflito judicial queira utilizar esses registros das conversas ou de fotos, por exemplo, como meios de prova dentro de um processo.

Ocorre que, como se sabe, existem diversos aplicativos e programas que permitem a montagem e a alteração desses dados, o que torna duvidosa a veracidade dos documentos, fazendo com que uma decisão judicial baseada somente nesses registros perca sua “força”.

Diante disso, você pode se perguntar: Como utilizar corretamente os registros de redes sociais como prova dentro de um processo?

E nós respondemos: por meio da ata notarial!

A ata notarial é um instrumento público, lavrado em cartório pelo tabelião de notas, que serve para formalizar a constatação de um fato. É por meio desse documento que os “fatos” existentes nas redes sociais, nas mensagens de celular e também em outros locais serão transformados em meios de prova para serem apresentados em um processo judicial.

E como funciona o procedimento?

O notário é funcionário dotado de fé pública, o que significa dizer que tudo aquilo que ele certifica é presumido como verdadeiro, até que se prove o contrário. Assim, ele averiguará os fatos apresentados por aquele que pedir a elaboração do documento e fará o registro em seu livro. Por conta da fé pública, as informações que forem registradas passam a ter valor de prova e presumem-se verdadeiras.

O notário, para efetivar o registro daquele fato constatado, pode inclusive fazer “print screen” (ou seja, uma cópia, captura) da tela de aparelho eletrônico, bem como reproduzir textos, figuras e vídeos. Assim, se eventualmente aquela prova desaparecer com o tempo ou se for excluída do ambiente virtual, por exemplo, ela terá sido registrada no livro do tabelião, podendo ser utilizada a qualquer tempo.

Importante dizer que o notário “apenas narrará o fato, ele não poderá emitir juízo de valor ou modificar a situação fática”1, ou seja, a ata notarial serve tão somente para que se registre o que aconteceu de fato, sem qualquer análise sobre o fato em si.

Você pode estar se perguntando qual seria a diferença entre a ata notarial e a escritura pública, já que ambos são documentos públicos. Então, vamos às diferenças:

ATA NOTARIAL:

– não há manifestação de vontade

– narração de fatos

– se aquele que requereu o documento recusar-se a assiná-lo, “o tabelião poderá consignar tal ato e mesmo assim, a ata estará perfeita, válida e eficaz”, já que apenas constata uma situação

ESCRITURA PÚBLICA:

– há manifestação de vontade

– constituição de direitos

– se aquele que requereu o documento recusar-se a assiná-lo, ele será considerado incompleto, inválido e ineficaz, vez que trata de direitos

Um exemplo de escritura pública é aquela realizada por pessoas que vivem em união estável e pretendem ver declarada sua união. A escritura declara a vontade dos companheiros e a existência de uma união. Em decorrência disso, constituem-se os direitos advindos daquele relacionamento. A ata notarial, por sua vez, não possui a mesma função.

Dentro do Direito de Família, existem diversas formas de aplicação da ata notarial, a exemplo: “na constatação de cartas, fotografias, escritos, imóveis, residências, automóveis” 2 . Apesar disso, ela é mais utilizada para a constatação de fatos acontecidos no espaço da internet.

Veremos a seguir, alguns exemplos comuns de utilização da ata notarial no Direito de Família:

CONVERSAS VIA E-MAIL OU WHATSAPP: Se você quiser juntar ao processo “prints” de mensagens trocadas por e-mail ou Whatsapp, o ideal é que você leve seu aparelho até um tabelião (cartório) para que ele abra o e-mail/aplicativo e transcreva as mensagens ali constantes. Nesse momento, o tabelião explicará na ata notarial o procedimento que está sendo realizado para acessar as mensagens, informando, além do conteúdo, o remetente e destinatário, ou o número de telefone.

 FOTOS DE REDES SOCIAIS: Juntar fotos obtidas nas redes sociais é algo extremamente comum nos processos que envolvem discussões familiares. Se eventualmente em uma ação de pensão alimentícia , por exemplo, a pessoa está dizendo que tem condições financeiras precárias, mas você quer mostrar pelas imagens que ela aparenta levar uma vida que não condiz com o que fala (ex.: fotos de viagens pelo mundo, usando carros importados, etc.) encaminhe-se ao tabelião (cartório) e solicite que seja feito o mesmo procedimento realizado com as mensagens trocadas via Whatsapp, conforme explicamos acima.

Ressalte-se que os exemplos citados acima não abrangem todas as hipóteses de utilização da ata notarial para constituição de provas dentro de um processo, vez que existem outras possibilidades. No entanto, considerando o crescente uso da tecnologia para comunicação, acreditamos ser importante esclarecer principalmente sobre esses registros. 

É certo que a utilização das atas notariais no Direito de Família sempre deverá ser feita com cuidado, porque envolve situações muito delicadas e de caráter íntimo. Assim, a exposição – e o registro dos fatos – deve ser feita somente depois de ponderação, com a devida responsabilidade que se espera dos operadores do Direito e dos notários, devendo ser analisados os prós e os contras de se realizar uma ata, com a avaliação das possíveis consequências.

Arethusa Baroni

Laura Roncaglio de Carvalho

Flávia Kirilos Beckert Cabral


1 AGAPITO, Priscila. Atas Notariais no Direito de Família . In: Grandes Temas de Direito de Família e das Sucessões. Coordenadores: SILVA, Regina Beatriz Tavares da. CAMARGO NETO, Theodureto de Almeida. Editora Saraiva. São Paulo, 2014.

2 AGAPITO, Priscila. Atas Notariais no Direito de Família. In: Grandes Temas de Direito de Família e das Sucessões. Coordenadores: SILVA, Regina Beatriz Tavares da. CAMARGO NETO, Theodureto de Almeida. Editora Saraiva. São Paulo, 2014

Testamento: o que é, como fazer e quais são as modalidades

O testamento é um documento por meio do qual uma pessoa expressa sua vontade em relação à distribuição dos seus bens, que acontecerá depois da sua morte, ou expressa sua vontade sobre questões que envolvem assuntos pessoais e morais.

Por exemplo, “A” faz um testamento para dizer que determinado imóvel pertencente ao seu patrimônio deverá ficar para “B”. Ou então, “A” reconhece, por testamento, “B” como  seu filho, mesmo que não tenha realizado o registro na ocasião do nascimento (sim, isso é possível!).

Dito isso, passamos à seguinte pergunta: Como fazer um testamento?

Para fazer um testamento, basta que o testador manifeste seu desejo e que este seja devidamente documentado. O testamento é, de fato, uma declaração de vontade do testador. Assim, a comprovação da propriedade dos bens que ele eventualmente quiser fazer constar no documento, somente será efetivamente obrigatória quando for necessário abrir o inventário (“O que é inventário e para que serve?” – clique aqui).

Importante observar que há certos procedimentos que devem ser seguidos, tendo em vista a existência de diferentes formas de testamento, podendo ele ser: ordinário (público, cerrado, particular) ou especial (marítimo, aeronáutico, militar ou simplificado).

Explicaremos abaixo, brevemente, sobre cada um deles.

Testamento público: Esta é a modalidade de testamento mais conhecida e mais utilizada pelas pessoas. Para a sua elaboração, a pessoa precisa ditar a sua vontade, em voz alta, ao tabelião (funcionário de um cartório de registros), pessoa  dotada de fé pública, que tem o dever de prevenir invalidades, trazendo assim mais segurança para aqueles que estão elaborando seu testamento público. A vontade ditada pelo testador deverá ser redigida pelo tabelião e, ao final, lida em voz alta para se ter certeza e confirmação sobre que foi escrito.

Ainda, é obrigatória a presença de duas testemunhas. A assinatura do testador também é essencial para a validade do documento, sendo dispensável somente em casos excepcionais. Por ser “público”, presume-se que esse tipo de testamento poderá ser lido por qualquer pessoa.

Testamento cerrado: Nessa modalidade, a própria pessoa redige o seu testamento na presença de duas testemunhas, e o entrega ao tabelião que o registrará se estiver em conformidade com a forma prevista em legislação. Esse testamento será colocado pelo tabelião dentro de um envelope fechado com cera derretida e costurado (por isso o nome “cerrado”), sendo sigiloso o seu conteúdo.

No cartório ficará arquivado o auto de aprovação (que será redigido pelo tabelião e é o único documento lido em voz alta para as testemunhas, ou seja, elas não terão conhecimento do conteúdo do testamento, somente da sua existência), permanecendo o original com o testador. Quando o testador vier a falecer, haverá procedimento judicial, no qual o Juiz(a) determinará a abertura do testamento e o seu  devido registro em cartório e, a partir daí, o documento começará a produzir seus efeitos.

Testamento particular: Pode ser escrito e assinado pelo próprio testador, de próprio punho ou por meio mecânico, ou escrito por terceira pessoa, por meio mecânico, mas assinado pelo testador. Esse tipo de testamento exige a presença de, pelo menos, três testemunhas. Assim como no testamento público, deve ser lido em voz alta para as testemunhas, que tomarão conhecimento do conteúdo do testamento. O documento deverá ser assinado tanto pelo testador quanto pelas testemunhas, que deverão estar devidamente qualificadas.

Nesta modalidade de testamento, como não existe fé pública, pois não é redigido por tabelião, nem registrado junto ao cartório, o testamento precisará ser confirmado judicialmente, ou seja, para que o documento possa produzir efeitos, com a morte do testador, ele deverá ser apresentado perante o Juiz, que determinará sua publicação e o chamamento dos herdeiros, que podem ter interesse em impugná-lo (questionar o conteúdo do testamento).

Importante ressaltar que, o testamento produzirá seus efeitos se ao menos uma das três testemunhas presentes, quando da sua elaboração, estiver viva para confirmar que aquele é, de fato, o testamento do falecido e se o Juiz estiver convencido de que há provas suficientes de que o mesmo é verdadeiro.

No entanto, como em quase tudo no Direito, há uma exceção. A Lei prevê a possibilidade de realização de testamento “simplificado” em circunstâncias excepcionais1, escrito de próprio punho, assinado pelo testador, sem testemunhas, a ser confirmado pelo Juiz.

Isso significa que o Juiz(a) poderá aceitar o testamento que for apenas assinado pelo testador, sem a presença de testemunhas, se restar comprovado de maneira suficiente que o mesmo é verdadeiro e, desde que esteja declarado o motivo excepcional para que não tenha sido declarado perante testemunhas.

Testamento marítimo: Esta modalidade de testamento somente pode ser feita nos casos em que o testador esteja embarcado, em alto-mar, durante uma viagem, e tenha receio de não chegar vivo ou não conseguir manifestar sua vontade na ocasião do retorno. O documento pode ser feito perante o comandante, que desempenhará o papel do tabelião, e na presença de duas testemunhas, que podem ser outros passageiros. No primeiro porto em território brasileiro, o comandante entregará o documento às autoridades.

Testamento aeronáutico: Somente pode ser feito quando o testador estiver em viagem, a bordo de uma aeronave militar ou comercial e quando houver receio de que não chegará vivo ao fim do voo. O comandante da aeronave não pode deixar seu posto, motivo pelo qual o testador pode designar qualquer pessoa para lavrar o documento com as disposições testamentárias. O testamento constará em registro de bordo e deverá ser entregue às autoridades quando da chegada em aeroporto.

Testamento militar: Poderá ser feito por militar e outras pessoas a serviço das forças armadas (ou por seus familiares), em serviço dentro ou fora do país, bem como por militar ou pessoas que estejam em praça sitiada (em lugar cercado por forças militares inimigas, sem possibilidade de afastar-se da tropa ou do acampamento) ou com a comunicação interrompida. O testamento militar se configura mediante declaração de vontade a duas testemunhas, com assinatura delas e do testador. Em casos excepcionais de perigo, o documento pode ser assinado por uma terceira pessoa, pelo comandante ou por oficial de saúde de hospital militar. Ainda, se os envolvidos estiverem em extrema situação de risco que os impeça de escrever, há possibilidade de se testar oralmente às testemunhas.

Essas três últimas modalidades, como podemos ver, são para casos extremamente especiais. Além do mais, elas têm um caráter provisório, pois se considera que a pessoa que elaborou o testamento o fez ante a possibilidade de vir a falecer durante o período em que está embarcado, ou a serviço militar. Assim, caso ela não venha a falecer depois de 90 dias do seu desembarque ou do término da situação de perigo, o testamento caduca, ou seja, deixa de ter validade

Vê-se, portanto, que essas são as formas de testamento previstas no ordenamento jurídico brasileiro, cabendo a cada um analisar, caso seja de seu interesse a elaboração do testamento, qual das modalidades é a mais adequada à sua situação.

Para saber o que pode estar no testamento, quem pode fazer um testamento, entre outras questões, confira o artigo “Qual é a vantagem de fazer um testamento?” (clique aqui).

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 Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho


1 “Extraordinárias são as circunstâncias que impeçam o testador de reunir três testemunhas, para leitura e assinatura do texto que escrever, ou de não poder dispor de meios mecânicos para redigi-lo naquele instante, havendo risco pela demora. (…) Excepcional é o que é fora do comum, que ocorre além dos limites do estabelecido ou do que é normal, frequente ou corriqueiro. Nesse sentido, é excepcional a circunstância de o testador encontrar-se sob ameaça ou limitado em seus movimentos por interessados em sua herança”. LÔBO, Paulo. Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013.

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