a) Guarda
A guarda pode ser atribuída em duas situações distintas:
1) Quando os pais de uma criança ou adolescente não vivem juntos, é preciso decidir quem ficará responsável pelos cuidados dos filhos (se apenas um dos pais, ou os dois), bem como com quem eles efetivamente morarão. Como na maioria dos casos os casais separados não moram juntos, essa decisão é importante e extremamente necessária, já que os filhos precisam ter um responsável direto por eles.
Desta forma, existirá a guarda unilateral, ou a conjunta, sobre as quais já falamos nos seguintes artigos: “Guarda de filhos: modalidades existentes” (clique aqui), “O que é guarda compartilhada? (clique aqui)” e “As diferenças entre a guarda compartilhada e a guarda alternada” (clique aqui).
Essas formas de atribuição de guarda estão relacionadas à autoridade parental, que é o conjunto de direitos e deveres que os pais exercem igualmente em relação aos filhos, sobre o qual também já tratamos no artigo “O que é autoridade parental?” (clique aqui).
2) Quando a criança está sob os cuidados daqueles que não são seus pais biológicos, é necessário regularizar essa situação. A guarda, nesses casos, não deriva da autoridade parental.
Assim, como a criança está inserida num contexto familiar que não é formado por ela e por seus pais, é preciso definir um guardião legal para assumir as responsabilidades em relação a ela. Importante observar que essa situação não faz com que os pais percam a autoridade parental sobre os seus filhos, existe apenas o objetivo de regularizar a real situação da criança e permitir que aquele que efetivamente está exercendo os cuidados tenha autonomia para tomar decisões sobre ele (tal situação pode ser alterada a qualquer momento, desde que em benefício da criança ou adolescente).
b) Tutela
A tutela, por sua vez, somente é outorgada ao responsável pela criança quando não mais existir a autoridade parental, seja pelo falecimento de ambos os pais, ou porque a autoridade lhes foi destituída ou suspensa.
Assim, para que a tutela seja concedida, tanto o pai quanto a mãe da criança já devem ser falecidos, ou a autoridade parental deve ter sido retirada de ambos. Não é possível obter a tutela de uma criança quando um dos pais ainda exercer a autoridade parental em relação a ela.
Importante esclarecer que, se os pais não tiverem nomeado previamente um tutor para o seu filho, existe uma ordem, indicada em lei, a ser seguida sobre quem deve ser nomeado como tutor: parentes consanguíneos da criança – em primeiro lugar os ascendentes, preferindo o mais próximo (avós, bisavós…); e depois os colaterais, também preferindo os mais próximos (irmãos, tios, primos, etc…).
Porém, esta ordem não precisa ser seguida à risca, já que pode haver o desinteresse dos avós, por exemplo, em exercer a tutela dos netos, e o interesse de um dos irmãos, desde que seja maior de idade. A escolha será feita pelo Juiz, analisando de acordo com aquilo que corresponder ao interesse do menor.
Para facilitar o entendimento, vamos aos exemplos*:
Guarda:
– João e Maria são casados e têm uma filha, Ana. Eles estão passando pelo divórcio e devem decidir sobre quem ficará com a filha após o término da relação. Mesmo se o processo de divórcio não for consensual, a guarda da filha deverá ser atribuída a um deles, se não for compartilhada (o que seria a regra). Importante esclarecer que, mesmo após o divórcio dos pais, a autoridade parental continua a existir para os dois. Portanto, o caso será de guarda derivada da autoridade parental.
– Ana é uma criança que não tem pai registral e sua mãe a deixou aos cuidados da avó materna. A avó pode entrar na Justiça para pedir a regulamentação da guarda da neta e, se for concedida, ela será a responsável legal por Ana. Neste caso, a autoridade parental da mãe ainda assim existirá, ela apenas não exercerá o conjunto de obrigações inerentes a tal dever, por exemplo a guarda. Portanto, o caso será de guarda com colocação do menor em família substituta (ou seja, não formada por seus pais).
No caso do exemplo acima, as crianças que também possuem pai registral (ou seja, as crianças que têm pai e mãe na certidão de nascimento) também podem ter a sua guarda outorgada para um terceiro (pode ser os avós, tios, irmãos, ou até mesmo alguém que não tenha parentesco com a criança, desde que com o consentimento dos pais).
Tutela:
– O pai de Ana faleceu no ano de 2008 e a mãe faleceu em 2016. A avó materna deve entrar com um pedido de tutela da neta, já que Ana não tem mais os pais e, portanto, ninguém que exerça a autoridade parental sobre ela. Importante esclarecer que a autoridade parental não será exercida pelo tutor, já que é um direito/dever apenas dos pais, mas a avó será a responsável legal de Ana.
No curso do processo, a guarda provisória de Ana poderá ser atribuída à avó materna, mas ela terá um caráter provisório, ou seja, prevalecerá somente até a finalização do processo, quando então a avó será nomeada a tutora (responsável pela tutela) de Ana.
Assim, se ambos os genitores de uma criança vêm a falecer, os avós, por exemplo, podem ingressar com um pedido na Justiça, demonstrando que estão responsáveis pelo neto e, então, a eles será concedida a tutela do pequeno, se respeitado o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente. O caso, portanto, será de aplicação da tutela, já que ambos os pais faleceram.
– Ana não foi registrada pelo pai e sua mãe, Maria, foi destituída da autoridade parental Seu irmão, José, pode pedir na Justiça a tutela de Ana, quando então ele passará a ser o responsável legal por ela. Neste caso, os avós poderão ser chamados para dizer se concordam com o pedido (em razão da ordem estabelecida em lei) e o Juiz poderá averiguar se, realmente, é o irmão quem está exercendo os cuidados com Ana. Assim, o caso será de pedido de atribuição de tutela.
Observa-se, portanto, que ambos os institutos de guarda e tutela têm o objetivo de proteger e garantir a efetivação dos direitos daqueles que estão em situação de vulnerabilidade, por estarem em fase de desenvolvimento – que demanda uma atenção especial.
Ainda assim, cada um será aplicado em situações diferentes, de acordo com suas particularidades e com a previsão legal, devendo sempre ser analisada a situação com cuidado para que se possa determinar se é caso de aplicação da guarda ou da tutela.
* Importante esclarecer que estes são apenas exemplos para um melhor entendimento. As situações de guarda e tutela não se esgotam apenas nos exemplos acima citados.
Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho