Como vender um bem de um familiar curatelado/incapaz?

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Vender um bem de alguém considerado incapaz é uma situação muito comum e que deve ser tratada com muito cuidado.

Apenas para relembrar: “A capacidade civil é a aptidão de adquirir direitos e de assumir deveres nas relações jurídicas patrimoniais (ex.: comprar, vender, realizar contratos). Ou seja, somente aqueles que são considerados “capazes” pela lei, podem, sozinhos, realizar estes atos.”

Se você possui algum familiar ou conhecido incapaz – menor ou maior de idade –, a dúvida sobre como vender um bem de alguém que precisa de um representante para a prática dos atos da vida civil já deve ter passado por sua cabeça.

Neste texto, vamos esclarecer alguns pontos sobre esse tema!

No artigo “Curatela: o que é isso?” (clique aqui), explicamos que a curatela é “um mecanismo de proteção para aqueles que, maiores de idade, não possuem capacidade de reger os atos da própria vida”. É, portanto, o encargo conferido a uma pessoa para cuidar de um adulto (ou seja, de alguém que já é maior de idade), mas que, por algum motivo (enfermidade, deficiência, dependência química, etc.) não é capaz de se autodeterminar e não possui condições de entender e compreender as consequências, o alcance e a importância de seus atos.

Assim, o curador será o responsável por administrar, proteger e cuidar dos bens do curatelado. Então, pode surgir o questionamento: e se for necessário vender o bem de propriedade daquele incapaz? O que se deve fazer?

Pois bem, o primeiro ponto é procurar o atendimento de advogados ou da Defensoria Pública, pois, para a venda do bem de um curatelado é necessária uma autorização judicial, que poderá ser concedida em um processo de “alvará para venda”.

Tem-se, portanto, que um dos requisitos é a autorização judicial.

Porém, existem mais três aspectos essenciais a serem observados: a “real necessidade”, “inequívoca vantagem” e a “avaliação judicial do bem”.

Vamos saber do que se tratam?

REAL NECESSIDADE: a venda de bem de incapaz somente pode ser autorizada em situação de real necessidade porque o seu patrimônio e seus interesses devem ser plenamente resguardados. Mas, o que pode ser considerado real necessidade? Isso vai depender de caso para caso.

De maneira geral, pode-se dizer que os casos de real necessidade são aqueles que envolvem a educação, saúde ou subsistência do incapaz. Além disso, existe a possibilidade de se demonstrar a real necessidade de alienar um bem para a aquisição de outro em seu lugar. A lei, porém, não se preocupa em fornecer um rol preestabelecido de situações nas quais há real necessidade.

A título de exemplo, pode-se mencionar os casos nos quais os envolvidos são pessoas com poucos recursos, nos quais o incapaz está hospitalizado em estado crítico e precisa do valor para arcar com o tratamento; e quando há necessidade do recebimento da quantia para garantir os custeios básicos e essenciais à sobrevivência do incapaz. Ou seja, não é recomendado que se autorize a venda de um bem de incapaz por motivos supérfluos, mas a “real necessidade”, de fato, deverá ser verificada no caso concreto, avaliando-se com cautela as circunstâncias em que vive o incapaz e seus familiares (incluindo seu curador).

INEQUÍVOCA VANTAGEM: de acordo com o artigo 1750 do Código Civil Brasileiro, os imóveis pertencentes aos menores sob tutela somente podem ser vendidos quando houver inequívoca vantagem – ou seja, uma vantagem certa. Esse artigo é aplicável também à curatela (não sendo caso de menor de idade), por conta do disposto no artigo 1774 do Código Civil Brasileiro. Assim, somente será concedida a autorização para a venda de bem de incapaz se for demonstrado no caso, efetivamente, que haverá vantagem para ele.

Importante ressaltar aqui, que a vantagem advinda do negócio deve vir em benefício do incapaz (e não de seu curador ou outras pessoas) e, ainda, que não basta somente a comprovação de ausência de prejuízo.

A título de exemplo, pode-se mencionar que, a eventual venda de bem, sob a justificativa de que se está a arcar com as despesas de manutenção de determinado imóvel, por si só, não deve prevalecer sem que haja prévia e cuidadosa avaliação, demonstrando-se que, além de utilizar os valores da venda para arcar com as despesas de manutenção, o negócio a ser realizado trará vantagem – de fato – ao incapaz.

AVALIAÇÃO DO BEM: a avaliação do bem será necessária até mesmo para que se verifique a presença da inequívoca vantagem na realização do negócio jurídico. Ela serve para que, avaliado o valor do bem a ser vendido e também, se for o caso, do bem a ser adquirido em seu lugar, seja possível analisar se o incapaz não terá prejuízo financeiro.

Com relação ao dinheiro obtido com a venda do bem (não inferior à avaliação), o Código Civil determina que o curador somente poderá ficar em poder de valores necessários para as despesas com o sustento e a administração dos bens da pessoa incapaz. Por este motivo, o valor obtido com a venda, por ser do curatelado, deverá ser depositado em conta judicial vinculada ao processo, e só será liberado mediante novo alvará, comprovada a necessidade do curatelado, e com a posterior apresentação de prestação de contas.

Por fim, será nulo o negócio jurídico quando ausente a prévia autorização judicial e, declarada a nulidade, por força da proibição de enriquecimento sem causa, deve ser restituída ao comprador a quantia paga, garantindo-se ao possuidor de boa-fé o direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis. Ou seja, se alguém comprar o imóvel de incapaz que foi vendido sem autorização judicial, o comprador poderá, dependendo das circunstâncias, ser indenizado quando da anulação do negócio.

Todos esses cuidados são essenciais, tendo em vista a preocupação do Estado em proteger o patrimônio do incapaz e resguardar seus interesses. É extremamente necessária a fiscalização acerca da correta administração de seu patrimônio, para que o incapaz não seja prejudicado e, eventualmente, fique desamparado financeiramente.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Doação de bens: “Tenho dois filhos, posso doar um imóvel apenas para um deles?”

Muitos pais desejam doar seus bens aos filhos, mas não sabem ao certo como isso funciona.

As seguintes dúvidas são frequentes entre as pessoas:

“Se eu doar um imóvel para um filho, também tenho que doar para o outro, pois eles têm direitos iguais?”

“Se eu doar para um, o outro pode pedir parte do bem que eu doei, quando eu vier a falecer?”

Neste artigo, pretendemos esclarecer esses pontos e explicar o que deve ser levado em consideração quando se opta por realizar doações de bens de pais para filhos.

Continue lendo para evitar problemas futuros, caso venha a doar algum dos seus bens.

O primeiro ponto a ser esclarecido é: DOAÇÃO É DIFERENTE DE VENDA!

Essa diferenciação é importante. Para vender um bem a um de seus filhos é necessário que os outros concordem com isso, o que não ocorre na doação. Na doação não existe a necessidade de consentimento dos outros filhos para que seja feita.

Cabe ainda observar que, se os filhos forem casados, dependendo do regime de bens do casamento será necessária a concordância do respectivo cônjuge em relação à venda. Em relação a este ponto, devemos ressaltar que, se um pai deseja doar um bem à filha casada, mas não quer que o marido dela tenha direitos sobre o bem – em decorrência do regime de bens de casamento da filha – deverá ser adicionada uma cláusula de incomunicabilidade à escritura de doação, que afastará os direitos do marido sobre o bem doado a ela.

Um segundo ponto muito importante diz respeito à quantidade do patrimônio que está sendo doado. Tal fato está relacionado à herança. Como vimos no artigo “Qual a diferença entre herdeiro e meeiro?” (clique aqui): “a herança é o conjunto de bens deixados pelo falecido; é todo o patrimônio que será herdado diante do falecimento de uma pessoa. Assim, o recebimento de herança é um direito que decorre do óbito de um indivíduo”.

Isso significa que, se você têm filhos, eles terão, automaticamente, direitos sobre seus bens, depois do seu falecimento. As Leis brasileiras garantem que, quando você falecer, 50% dos seus bens serão destinados aos seus herdeiros necessários, dentre os quais estão incluídos os filhos em primeiro lugar na ordem sucessória. Em relação aos outros 50% você poderá dispor da maneira que quiser.

Portanto, com o objetivo de assegurar que nenhum dos filhos saia “prejudicado”, assegure-se de que você está doando algum bem dentro daqueles inseridos nestes 50% do patrimônio disponível, deixando isso claro no ato de doação. Do contrário, se você estiver doando parte do patrimônio que ultrapassa essa quota parte disponível, o outro filho deverá ser compensado. No entanto, isso acontecerá somente quando você vier a falecer e o seu o inventário for aberto.

Você deve estar se perguntando: “mas como isso funciona?”

Vamos utilizar o seguinte exemplo para ilustrar a situação e facilitar sua compreensão:

Você tem 2 apartamentos e uma casa. Um apartamento custa 200 mil, o outro 150 mil e a casa 50 mil. Seus únicos herdeiros são seus dois filhos: João e José.

Em vida, você doou para João o apartamento de 200 mil e não doou nada para José. Quando você vier a falecer, deverá ser aberto o seu inventário (leia sobre inventário aqui), momento em que seu patrimônio será avaliado para ser divido entre seus herdeiros. Mesmo que você tenha doado em vida o apartamento de 200 mil para João, tal situação será informada na ação de inventário, por meio de um ato chamado “colação”, que consiste justamente na verificação de eventual adiantamento da herança, o que ocorreu no presente caso mencionado acima.

Nesse momento, para que ambos os filhos recebam igualmente o patrimônio que até então pertencia a seu pai, João, por já ter recebido o apartamento doado por seu pai, não receberá parte do outro imóvel, nem da casa, como forma de compensação. Somando esses outros dois bens, temos o valor de 200 mil, exatamente o valor do apartamento de João. Assim, José será compensado com a herança em sua totalidade, pois João já foi beneficiado pela doação em vida.

No entanto, se o pai de João e José tivesse deixado claro que o apartamento doado a João correspondia a 50% do seu patrimônio disponível, a história seria outra.

Veja bem: Se somados os valores dos três imóveis, termos um patrimônio total de 400 mil. Desses 400 mil, com a metade o pai de João e de José poderá fazer o que bem entender, inclusive doar para João o apartamento de 200 mil, declarando por escrito que ele representa 50% dos bens disponíveis.

Neste caso, quando aberto o inventário, João e José terão direito a receber 50% dos bens restantes. O imóvel de 150 mil e a casa de 50 mil, por sua vez, serão divididos igualmente entre os dois.

Portanto, a fim de evitar eventuais conflitos familiares que envolvam questões patrimoniais, é muito importante consultar um advogado especializado na área, para que ele lhe ajude a avaliar seu patrimônio e lhe oriente da melhor maneira possível em relação a forma como você deseja dispor seus bens em vida, para que no futuro não surjam discussões desagradáveis na família que poderiam ter sido evitadas com a orientação jurídica adequada.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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