Já vimos em artigos anteriores, que o casamento é a união voluntária de duas pessoas – respeitando alguns requisitos previstos em Lei – a fim de constituir uma família.
No entanto, há casos em que o casamento, embora tenha sido realizado, não será considerado válido, ou seja, o casamento será considerado nulo.
O tema é um pouco complexo, mas tentaremos explicar à “moda” Direito Familiar!
No Direito, para que um ato seja reconhecido juridicamente, devem ser analisados três planos: o da existência, o da validade e o da eficácia.
A existência é o plano do “ser”, ou seja, é o que considera a presença de elementos fundamentais para aquele ato. Na ausência deles, é como se o ato não existisse para o Direito e, portanto, não merecesse proteção jurídica.
A existência de um casamento pressupõe que foram seguidos os requisitos mencionados no artigo “Casamento civil: como funciona?” (clique aqui), tais como: consentimento, celebração por autoridade e a “fórmula sacramental”. É somente depois disso que se pode considerar o casamento existente.
A validade, por sua vez, “concerne ao ajuste do ato às prescrições estabelecidas em lei”1. Assim, o casamento pode ter existido, mas, se não respeitadas determinadas disposições legais, ele não será legalmente válido.
A ausência de alguns requisitos pode tornar o casamento apenas anulável (de forma que ele, apesar de irregular, ainda poderá ser convalidado – ou seja, será dada posterior validade a ele e, assim, poderá ser mantido).
A falta de outros, porém, torna o casamento nulo (sem validade). Isso quer dizer que, em tese, será como se aqueles que se casaram tivessem que retornar ao estado civil anterior.
A eficácia – terceiro plano – tem relação com a produção de efeitos daquele ato.
Neste artigo, trataremos somente sobre as hipóteses em que o casamento será tido como INVÁLIDO, ou seja, NULO (e não anulável).
Quais são elas?
A nulidade de casamento, pela gravidade de suas consequências, não admite interpretação extensiva, ou seja, ela só acontecerá na hipótese prevista em lei, qual seja: quando um ou ambos os cônjuges incorrerem em impedimento matrimonial.
Os impedimentos matrimoniais estão previstos no artigo 1521 do Código Civil:
Art. 1.521. Não podem casar:
I – os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II – os afins em linha reta;
III – o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do adotante;
IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;
V – o adotado com o filho do adotante;
VI – as pessoas casadas;
VII – o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte.
Sobre os impedimentos decorrentes do parentesco (I a V), já tratamos no artigo “Posso casar com algum parente meu?” (clique aqui).
Quanto aos demais, vê-se a previsão de impedimento no tocante a “pessoas casadas”. Ou seja, aqueles que já são casados não poderiam, em tese, casar novamente, sob pena de ser considerado nulo o segundo casamento, já que havia causa de impedimento.
Cristiano Chaves de FARIAS e Nelson ROSENVALD 2 explicam que:
“Somente desaparece esse impedimento matrimonial através da dissolução do casamento anterior (por morte ou declaração de ausência, divórcio, declaração de nulidade ou anulação do casamento). Até porque o impedimento não decorre do fato da pessoa ter sido casada, mas de ser casada. No que tange à invalidade do primeiro casamento, enquanto não for reconhecida a nulidade das primeiras núpcias, as segundas continuam reputadas inválidas, por conta da bigamia. Uma vez reconhecida a nulidade do primeiro casamento (não tendo produzido qualquer efeito), naturalmente, estará reconhecida a perfeita validade do segundo”.
Além disso, consta o impedimento para o casamento entre o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o seu consorte. Isso significa dizer, por exemplo, que, se você era casado e alguém matou seu cônjuge, você não poderá casar com o assassino.
Como os impedimentos são “insanáveis e graves, a lei consagra como consequência da sua infringência a nulidade absoluta do casamento”3.
Tem-se, portanto, que, o ato do casamento pode ser considerado nulo em algumas ocasiões, de maior “peso” para o Direito. Em resumo, o casamento será nulo quando houver algum impedimento matrimonial.
Apesar disso, é importante dizer que, por ser um ato existente, ainda que seja inválido (nulo), ele poderá produzir efeitos (plano da eficácia), isso em relação a terceiros, tais como: presunção de paternidade no que diz respeito aos filhos advindos da união e reconhecimento da comunhão de bens.
Vale dizer, ainda, apenas a título de esclarecimento, que, antes da vigência do estatuto da pessoa com deficiência (Lei nº. 13146/2015), havia um dos incisos do artigo citado acima que reputava como inválido o casamento realizado por pessoa mentalmente enferma, em grau que não lhe possibilite entender ou discernir a natureza e as consequências dos atos da vida civil.
No entanto, tal dispositivo foi revogado com o advento do referido estatuto. (Para saber mais sobre o estatuto da pessoa com deficiência, confira o artigo “Curatela: o que é isso?” – clique aqui).
Apesar disso, certo é que o casamento depende de uma decisão na qual se expressa uma vontade e, estando a pessoa com uma deficiência que não lhe permita manifestar devidamente a vontade, isso poderá tornar o ato inexistente (não será nulo pelos requisitos de validade, mas será inexistente – “Casamento Civil: como funciona?” – clique aqui).
Sabemos que o assunto é um pouco complicado, mas esperamos que o texto facilite a compreensão sobre o que é um casamento nulo!
Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho
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1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.
2 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.
3 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito de Família. 9ª Edição. São Paulo, 2014.
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