Direito de Família e Psicologia: violência emocional

Você sabe o que é violência emocional?

De acordo com notícia divulgada em agosto de 2016 no site Agência Brasil1, o número da Central de Atendimento à Mulher em Situação de Violência registrou um aumento de 133% nos relatos envolvendo violência doméstica e familiar no referido ano, em comparação com o ano de 2015.

Segundo a secretária especial de Políticas para Mulheres, os números não refletem necessariamente o aumento da violência em si, mas sim o crescimento da busca por informação pelas vítimas, que se sentem mais encorajadas a prestar queixas.

Todos os dias, lemos notícias sobre agressões sofridas por mulheres e, junto a isso, vê-se também a ampliação da discussão sobre a necessidade de se procurar auxílio especializado. O que nem sempre é discutido é o fato de existirem outras formas de agressão, que não a física.

A violência emocional é um tipo de violência doméstica e, por não deixar marcas tão visíveis, acaba sendo menos considerada. Ela é uma forma de fazer o outro se sentir inferior, omisso, dependente ou culpado, ou seja, é manifestada por meio de comportamentos que acabam afetando a saúde psicológica do outro.

Considerando que este é um assunto que está em alta, e tendo em vista os pedidos que recebemos para falarmos sobre o tema, convidamos a psicóloga Mirca Morva Longoni para explicar um pouco sobre violência emocional e como se pode agir nesses casos! Confira:

Violência emocional

Por Mirca Morva Longoni (CRP 08/06755-0)

Psicóloga Clínica e Psicoterapeuta Familiar e Casal

A violência emocional pode ser entendida como uma conduta que causa dano emocional e diminuição da autoestima ou prejuízos ao desenvolvimento de outra pessoa, por meio da degradação, manipulação, chantagem ou ridicularização de suas ações.

Muitas vezes, a violência emocional é silenciosa. Ainda assim, pode doer mais do que a violência física. Ela geralmente acontece em relações amorosas nas quais alguém se submete ao relacionamento por medo e/ou por desejo de agradar ao outro, tornando-se submisso, inferiorizado, desqualificado e humilhado.

Aquele que sofre uma violência emocional passa a acreditar na sua culpa, incutida pelo outro, e na imagem que foi criada a seu respeito, o que gera uma rotina de justificativas advindas da impossibilidade de enxergar com clareza as atitudes do agressor. Assim, a vítima acaba anulando a sua própria vida e trabalhando intensamente para manter o outro feliz e realizado.

O agressor, por sua vez, minimiza os argumentos do outro, desqualificando suas prioridades e enaltecendo apenas os seus desejos, afirmando que seriam mais importantes. O outro passa a ser sempre responsabilizado por todas as situações negativas ou frustrantes de suas vidas.

É importante dizer que a violência emocional não aparece somente no sistema conjugal, ela pode afetar também outros sistemas familiares, de modo que os outros membros são atingidos.

Na intenção de se neutralizarem os efeitos da violência de forma racional, muitos procuram ajuda profissional. Porém, é interessante notar que esse auxílio pode ser, também, desqualificado pelo agressor. Ou seja, ele pode desqualificá-lo por meio de chantagens emocionais, argumentando que a culpa da falência da relação será do outro caso aceite ajuda. Isso pode ter por consequência a volta ao domínio pelo agressor e do ciclo vicioso, afastando a vítima, eventualmente, até mesmo de seus amigos e familiares.

Em um primeiro momento, a intenção de ajudar quem está passando por alguma situação de violência emocional deve partir de uma pessoa da família ou algum amigo de confiança daquele que vem sofrendo as agressões, pois a aproximação será facilitada.

O diálogo deverá ser a primeira ferramenta a ser utilizada, e a escuta e o apoio serão prioridades, deixando-se de lado as críticas e os julgamentos, para que, em um segundo momento, se possa incentivar a procura de uma ajuda profissional, visando resgatar o sentido de sua vida.

Informações para contato: mircalongoni@hotmail.com

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1http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2016-08/queixas-de-violencia-domestica-pelo180-aumentam-133-este-ano-em-relacao-2015

4 frases que não devem ser ditas na frente dos filhos!

No artigo “Direito de Família e Psicologia: como apresentar um(a) novo(a) companheiro(a) para seus filhos? (clique aqui) – convidamos a psicóloga Mirca Longoni, para contar um pouco sobre como os pais devem abordar essa situação com seus filhos.

Toda separação tende a ser dolorosa, e em relação a isso não temos dúvidas. No entanto, no nosso dia a dia dentro das Varas de Família, pudemos perceber a grande dificuldade que as pessoas têm em aceitar um novo membro na família – isso serve tanto para os “ex’s” quanto para os filhos e demais parentes.

Deve ficar claro que essa não aceitação nem sempre é injustificada. Em determinados casos, ela acontece não por mera “birra” dos filhos, mas porque os pais não souberam amenizar as circunstâncias traumáticas geradas pela separação, deixando que aqueles aspectos negativos repercutissem no desenvolvimento das crianças, o que pode interferir na aceitação delas de uma nova pessoa em suas vidas.

Em decorrência das mágoas que ficaram depois do término da relação, algumas pessoas acabam “metendo os pés pelas mãos” e, por vezes, falam coisas que não deveriam ser ditas. Tal situação pode gerar conflitos, acirrar a animosidade existente entre as partes e, por fim, interferir no desenvolvimento daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade: os filhos.

Com o objetivo de ilustrar essas situações, trouxemos hoje alguns exemplos de frases que devem ser evitadas pelos pais depois do término da relação, a fim de não prejudicar os filhos!

Vamos lá?

1 – “Essa é sua nova mamãe!” ou “Esse é seu novo papai!”

Devemos sempre lembrar que os pais devem separar a conjugalidade da parentalidade. O que isso significa? Significa que o que terminou foi o relacionamento entre os pais, ou seja, as questões pessoais do relacionamento não podem interferir na relação com os filhos.

Não é porque o casal se separou que simplesmente um deles vai deixar de ser pai ou mãe. Geralmente essa situação ocorre com aquele que “deixou” o lar, mas vale lembrar que, apesar da separação, é direito do filho conviver com ambos os genitores, até porque isso contribuirá para a completa formação de sua personalidade (leia mais sobre isso clicando aqui).

Além disso, as obrigações inerentes à parentalidade permanecem. A nova figura que surge ao lado do pai ou da mãe, em que pese possa acrescentar, não virá em substituição. Toda essa situação pode gerar grandes discussões e atrapalhar de maneira grave o desenvolvimento regular de uma criança.

2 – “Você ficou doente porque ele(a) não cuidou direito de você”

Essa situação é muito comum quando o casal enfrenta problemas em relação ao exercício da guarda e convivência com os filhos. A culpa por qualquer problema de saúde que a criança venha a ter, acaba sendo imputada ao genitor que estava com a criança no dia em que ela adoeceu.

Mas espera aí, será que a criança realmente ficou doente ou teve mal estar em decorrência da negligência de um dos genitores? Será que a criança não está manifestando tais sintomas em virtude do estresse que ela está vivenciando?

Se cada vez que ela for visitar um dos genitores, tal momento for permeado de discussões e acusações, a situação pode tornar-se traumática, e ela poderá, inclusive negar-se a realizar as visitas, para evitar passar por todo esse desgaste emocional. Assim, ela poderá começar a ter sintomas de uma criança ou adolescente com um desenvolvimento emocional conturbado.

Falamos um pouco sobre isso no artigo “Conflitos durante um processo: como lidar?” (clique aqui):

Dificilmente as partes reconhecem que qualquer enfermidade ou mudança de humor da criança pode ser em decorrência do conflito travado entre eles, e não simplesmente da eventual alegada má adaptação à casa do outro ou até mesmo à falta de cuidado por parte do outro genitor.”

Ainda, no artigo “Direito de Família e Psicologia: quando o relacionamento dos pais prejudica os filhos”, a psicóloga Karina de Paula Menezes Santana falou um pouco sobre esses casos, vale a pena conferir, clicando aqui.

3 – “Ele/Ela brigou com a mamãe/papai e foi embora” ou “Ela/Ele arranjou outra pessoa e saiu de casa”

Por que expor os filhos a essas situações?

Como falamos acima: separe a conjugalidade da parentalidade. Não jogue a culpa pelo término da relação para uma pessoa só. Não queira transformar o pai ou a mãe em um “monstro” que abandonou ou trocou a família por outra pessoa.

Os filhos não têm que tomar as dores de um dos pais, a relação conjugal não deu certo, mas os laços entre pais e filhos devem ser mantidos.

4 – Seu pai/mãe foi fazer uma viagem e não vai voltar.

Será que mentir para criança ou adolescente realmente é a melhor saída? Por mais novos que sejam, os filhos conseguem perceber que algo está acontecendo. A tarefa de explicar para os filhos que seus pais estão se separando pode ser muito delicada, disso não temos dúvida. Mas será que uma mentira, por menor que seja, não pode vir a precisar de outra mentira para encobrir essa primeira, e criar um círculo vicioso? Mentira atrás de mentira? Quais os efeitos disso quando a verdade for descoberta? Qual é o exemplo de conduta que será repassado ao filho?

Como os efeitos dessa situação são incertos, é extremamente aconselhável procurar o amparo de profissionais especializados da área da psicologia, principalmente aqueles com experiência em atendimento familiar, a fim de receber a orientação adequada para lidar com a situação.

Devemos lembrar que cada pessoa é única e, que cada uma enfrenta seus problemas da maneira que lhe convém. Nem todas as pessoas reagem da mesma forma nessas situações, por isso é muito importante conhecer o comportamento e entender os sentimentos de cada indivíduo do núcleo familiar, para que seja feita a abordagem correta, a fim de evitar traumas, que, por vezes, podem vir a ser irreversíveis na vida de uma pessoa.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Até que ponto o Judiciário pode interferir na sua vida?

Se você é nosso leitor e nos acompanha há algum tempo, já deve ter percebido que sempre indicamos que o melhor seria que todas as questões familiares fossem resolvidas por meio do diálogo, ainda que com intermédio de profissionais terapêuticos.

Isso porque acreditamos que as próprias partes – melhor do que outras pessoas que não estão vivendo aquela relação – é que são as mais capacitadas para decidir sobre seu próprio destino e o dos filhos.

Determinadas situações devem ser levadas ao Judiciário, especialmente quando há algum caso de vulnerabilidade dos envolvidos ou de risco para as crianças, que estão em fase de desenvolvimento. No entanto, no artigo de hoje, falaremos sobre a ideia de “intervenção mínima do Estado nas famílias” ou de “Direito de Família mínimo”.

O que isso quer dizer?

Pois bem, como já falamos em textos anteriores, as leis que regem o Direito de Família estão em constante transformação, até porque as mudanças sociais exigem que as leis também mudem para se adaptar aos padrões da sociedade, atendendo às suas necessidades. Tendo isso em vista, podemos imaginar que, no passado, o estado interferia muito mais nas relações particulares das pessoas e, com o decorrer do tempo, passou-se a valorizar uma intervenção mínima.

Explicamos:

A título de exemplo, podemos mencionar que, em outros tempos, se um casal quisesse se separar, a lei determinava que eles deveriam ter, pelo menos, dois anos de casados (sendo amigável) para formular o pedido na Justiça, ou um deles deveria demonstrar a culpa do outro pelo fim do relacionamento (sendo litigioso). É certo, porém, que se tratava de uma intervenção desnecessária do Estado.

É que, se duas pessoas se casaram, se elas não querem mais viver juntas, e se existe a possibilidade do divórcio (ou da separação), qual seria o sentido de se manter a obrigatoriedade, por lei, de que ficassem casadas por dois anos, antes de poderem se separar?

O que acontece é que, antigamente, o matrimônio possuía um caráter muito mais patrimonial e nem sempre era baseado no amor e no afeto. Contudo, com o aumento da liberdade e com a valorização da dignidade da pessoa, a norma que impunha as condições mencionadas acima deixou de fazer sentido, motivo pelo qual foi posteriormente alterada.

Atualmente, até mesmo por conta da Constituição Federal de 1988, as pessoas podem pedir o divórcio a qualquer momento, desde que não tenham mais vontade de permanecer juntas, como já visto no artigo Quero me divorciar, e agora?” e essa norma parece corresponder muito mais à liberdade das pessoas, que é um direito fundamental.

Podemos também dar um exemplo no qual o estado continua intervindo. Conforme explicamos no artigo Quais são os regimes de bens existentes?”, os interessados em se casar podem escolher o regime de bens de seu casamento, ou seja, possuem liberdade para optar pelas formas previstas em lei e, caso entendam como necessário, podem pactuar uma forma diversa.

Mas existem algumas situações específicas nas quais essa liberdade de escolha é proibida pelo Direito. Por exemplo, para que as pessoas maiores de 70 anos possam se casar, a lei obriga que o regime seja o da separação de bens (leia mais sobre esse regime de bens aqui), ou seja, eles não possuem escolha. Ou é assim, ou não casam. Existe essa imposição do Estado porque se presume que sejam pessoas em um estado de maior vulnerabilidade, o que justificaria a intervenção na escolha, embora para outras pessoas ela permaneça sendo livre.

Em relação aos processos envolvendo crianças, tais como os de guarda e de convivência, o que se vê é que os pais, muitas vezes, não conseguem conversar de forma equilibrada e sensata, agindo somente na busca de seus interesses, com acusações mútuas, o que não contribui para o crescimento sadio dos filhos.

Nestes casos, os genitores esquecem, ou não se atentam para o fato de que o Judiciário não possui os instrumentos necessários para decidir pequenas questões do cotidiano dos filhos – seja por falta de conhecimento aprofundado da relação das partes, seja pela falta de estrutura física e funcional dentro dos Fóruns – que poderiam ser melhor resolvidas caso os genitores mantivessem um diálogo amigável, ao menos em relação às questões ligadas aos filhos, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.

Por isso, é importante pensar na ideia do “Direito de Família mínimo”, ou seja, pensar que, apesar de o Juiz poder tomar diversas medidas dentro de um processo judicial quando verificar que existem situações de risco que justifiquem estas medidas, ele não está envolvido naquele relacionamento, e dificilmente saberá o que é melhor, de fato, para a rotina dos filhos e da própria família.

Ele atuará, portanto, visando o interesse da criança, com o auxílio de uma equipe de psicólogos e assistentes sociais, tendo por objetivo minimizar os danos que os conflitos dos pais podem causar ao filho.

Assim, entendemos que, antes de recorrer ao Judiciário, as pessoas precisam parar para refletir sobre o que elas preferem: tomar as decisões sobre as próprias vidas, ou deixar isso na mão do judiciário?

Pensem: Até que ponto o Judiciário vai ser tão eficaz em resolver todos os seus problemas familiares? Será que não existem situações que podem ser tratadas fora do âmbito judicial, quem sabe com o auxílio de terapeutas especializados na área ou até mesmo se os envolvidos estiverem abertos a resolver as questões amigavelmente?

O ideal é que os genitores, sempre em nome do amor e da preocupação que devotam aos filhos, possam se entender através do diálogo e do bom senso, a fim de que os pequenos deixem de ser expostos a situações que comprometam seu desenvolvimento.

Além disso, o diálogo e o entendimento se mostram a melhor saída não só em relação aos filhos, mas também para o relacionamento dos genitores e de todos os envolvidos nestas disputas familiares, que tendem a crescer quando todos estão “cegos” pelas brigas e desentendimentos.

Percebe-se que muitas vezes as situações de brigas e desentendimentos não se amenizam com a existência de um processo judicial. Pelo contrário, as partes tornam-se mais inflexíveis e fechadas para um diálogo, com a ilusão de que o Juiz resolverá todos os seus problemas familiares.

O Judiciário e a lei devem cumprir seu papel, mas é certo que nem sempre uma “sentença” consegue resolver todas as questões. Apesar de mostrar um “caminho” em alguns casos, a decisão judicial, por si só, não faz cessar os conflitos se as partes não estiverem abertas para isso.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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