Direito de Família e Psicologia: O luto e o inventário

Foto de Irina Anastasiu

 Quando uma pessoa falece e deixa bens, é necessário verificar quem tem o direito de ficar com este patrimônio deixado pelo de cujus (falecido). A forma de regularizar esta situação acontece por meio do procedimento do inventário e partilha que visa formalizar a transmissão dos bens do falecido para os seus sucessores (herdeiros).

No entanto, passar por esse processo de inventário pode vir a ser doloroso para muitas pessoas, tendo em vista que o prazo é relativamente curto entre digerir tudo o que acontece em nossas vidas quando perdemos um ente querido e abrir o processo de inventário.

Como prezamos muito pela união do Direito de Família à Psicologia, convidamos as psicólogas Mariana Bayer e Paula Leverone, sócias-fundadoras do Instituto Trilhar, cuja missão é promover acesso a ampliação dos conhecimentos e cuidados relativos ao processo de luto, para falar um pouquinho mais sobre o assunto, e partilhar com todos vocês um pouco do trabalho delas.

O luto e o inventário

Mariana Bayer (CRP 08/19103)

Paula Leverone (CRP 08/18775)

A perda de um ente querido traz o luto, um processo natural e psiquicamente trabalhoso. É um período difícil, porém indispensável para a reorganização emocional do indivíduo.

Os impactos desse rompimento de vínculo interferem em diversas áreas da vida, como: social, familiar, escolar, profissional, sexual, entre outras, fazendo com que o enlutado lide com novas sensações, emoções, lembranças e comportamentos. Tarefas que não faziam parte da rotina do indivíduo passam a existir e o inventário é uma delas.

O inventário consiste em verificar quem tem o direito de ficar com os bens da pessoa que faleceu. A família tem aproximadamente 60 dias após o falecimento de seu ente para fazer a abertura do inventário. O tempo é considerado curto e muitas vezes exaustivo para os enlutados que precisam lidar com toda a burocracia, prazos, preocupações e busca por documentos, em paralelo a dor do luto.

O processo do inventário pode ser ainda mais penoso quando ocorre o falecimento de um dos herdeiros neste período, quando há descoberta de novos herdeiros, ou novos bens, dívidas do falecido e/ou a necessidade de sacar saldos em poupanças, PIS, FGTS e etc.

Isso, frequentemente, exige uma comunicação entre familiares, o que por um lado pode proporcionar um contato importante com a dor da perda e a possibilidade de falar sobre ela, mas por outro, pode haver conflitos diante de interesses distintos. Para tais decisões é necessário levar em conta que as mudanças na rotina, ocasionadas pela perda de um ente querido já são, geralmente, drásticas e difíceis, por isso qualquer decisão importante a ser tomada neste processo merece cautela.

Na prática do atendimento psicológico com pessoas enlutadas, lidamos com todas essas questões emocionais relacionadas ao inventário. Nos deparamos comumente com pacientes muito fragilizados quando começam a buscar os documentos exigidos para o inventário, como a certidão de óbito, de casamento, matrícula de imóveis, e quando existe, um testamento.

Também é comum ouvirmos reclamações sobre a quantidade de documentos exigidos e as surpresas em caso de dívidas deixadas pelo falecido, que muitas vezes acabam por comprometer a qualidade de vida da família.

É comum encontrarmos falas como a da seguinte mãe, que perdeu um de seus filhos: “Eu pedi pro meu outro filho fazer. Fiz uma procuração e ele me representou. Mas foi muito sofrido mesmo assim, principalmente quando há muitas desavenças. Inventário é coisa complicada”.

Outra mãe enlutada afirma: “O inventário é muito dolorido de fazer, é uma revolta muito grande saber que seu filho conseguiu tudo com o esforço dele e não usufruiu de nada. Depois você tem que dividir com as pessoas que não ajudaram em nada, e sem dizer que acham que seu filho virou um objeto e não se importam com o seu sentimento de pai ou mãe. Isso não se resolve de um dia para o outro, já faz dois anos e quatro meses que estou mexendo com o inventário e até agora não saiu nada. Sempre tem alguma coisa que o juiz acha de errado e você tem que remexer em todos aqueles documentos de novo e reviver tudo aquilo de novo, aquela dor (…) A vontade é de abandonar tudo e não mexer com nada!”.

Além da cautela nas decisões tomadas neste momento, orientamos que o enlutado respeite seus limites e sentimentos, recorrendo a sua rede de apoio, familiares e amigos, e se necessário busque ajuda de profissionais especializados.

Assim como a morte de um ente querido, o inventário não é algo desejado, mas, da mesma forma que na lei da vida existe a perda, na lei dos homens existe o inventário e o enfrentamento desses dois processos que se entrelaçam se faz necessário para todos.

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Qual é a vantagem de fazer um testamento?

Qual é a vantagem de fazer um testamento?

A vantagem de se fazer um testamento está ligada ao fato de a pessoa poder manifestar o seu desejo sobre a destinação de seus bens depois de seu falecimento. As origens desse desejo podem ser as mais variadas, por exemplo: uma pessoa tem muitos imóveis, mas não tem nenhum herdeiro, apenas parentes muito distantes com quem sequer mantém contato.

No entanto, essa pessoa tem um amigo que sempre esteve presente e sempre o ajudou em sua vida e quer que todo o seu patrimônio seja destinado a essa pessoa, quando vier a falecer. Para que isso ocorra, será necessário um testamento, do contrário, os bens ficarão para os herdeiros, de acordo com a ordem de sucessão.

A vantagem de declarar as vontades em um testamento está muito ligada aos sentimentos do testador em relação às pessoas e à forma como quer distribuir seu patrimônio. Muitas vezes, inclusive, um testamento bem elaborado elimina diversos conflitos familiares que surgem na hora da divisão do patrimônio deixado por aquele que não mais está presente.

O testamento deve ser visto como uma forma de resolver em vida pelo menos parte das questões que surgem quando uma pessoa vem a falecer. Se ela construiu um patrimônio, por que não decidir sobre a destinação dele quando vier a falecer? Se você ajudou muito uma pessoa em vida (ou alguma instituição) ou foi ajudada por ela, por que não deixar algo em seu benefício?

Quantos testamentos posso fazer?

Não existe limite quanto ao número de testamentos que podem ser feitos por uma pessoa. No entanto, é importante lembrar que cada testamento novo que for feito, poderá anular o anterior de forma parcial ou total. Se o novo testamento declarar que revoga o testamento anterior (que o testador desiste dele), então ele será revogado completamente e o novo é que passará a ter validade.

Caso o testador não declare que revoga o testamento anterior, o conteúdo do novo deverá estar coerente com o anterior. Um exemplo disso seria: se “A” fizesse um testamento deixando um apartamento para “B” e anos depois, fizesse um novo testamento deixando o mesmo apartamento para “C”, mas sem informar que a intenção de revogar o anterior, como o objeto é o mesmo, não há como manter os dois testamentos. Portanto, o antigo deixará de ter efeito, automaticamente.

Agora você se pergunta: mas como vou saber qual é o último testamento?

Pois bem, na hora da elaboração do testamento deverá sempre sem preenchida a data em que ele está sendo elaborado. Junto a isso, como vimos anteriormente, os testamentos públicos, cerrados, marítimos, militares e aeronáuticos, deverão ser registrados em cartório. Este registro será direcionado à Central Notarial de Serviços Eletrônicos Compartilhados (CENSEC), que tem a finalidade de gerenciar os bancos de dados com informações sobre a existência de testamento em todos os cartórios do Brasil.

Desse modo, basta pedir uma certidão ao CENSEC para ter em mãos as informações sobre a existência, ou não, de testamentos deixados por alguém que faleceu.

Dito isso, você pode questionar: mas e o testamento particular?

Quanto ao testamento particular, a discussão sempre acaba sendo maior, e a análise sempre requer mais cautela, justamente por não ser um documento que foi registrado em cartório. No entanto, embora não tenha registro, o testamento deverá conter obrigatoriamente a data em que foi elaborado, e o mais recente será o válido.

Infelizmente, não há como ter certeza se o testamento particular apresentado efetivamente é o único, ou ao menos o último deixado pela pessoa que faleceu, cabendo aos interessados questionar a validade do testamento, caso entendam como necessário, bem como apresentar o que efetivamente foi elaborado por último.

Quais bens eu posso dispor por testamento?

Quando a pessoa tiver herdeiros necessários (ex.: filhos, pais, marido/mulher) poderá dispor por testamento somente de 50% do seu patrimônio. A outra metade é chamada de “legítima” e será transmitida para esses herdeiros necessários.

Por exemplo: “A” é solteiro, mas tem dois filhos. Ele quer fazer um testamento e deixar seus bens para um amigo muito próximo. Devido a existência desses dois filhos, por testamento ele só poderá deixar metade de seus bens para o amigo. A outra metade será obrigatoriamente destinada aos filhos, a não ser que a pessoa falecida tenha um motivo relevante que justifique a exclusão de algum herdeiro da sua herança (por exemplo: o filho que tenta matar o próprio pai, pode ser excluído da herança)

Qualquer pessoa pode fazer um testamento?

Não é qualquer pessoa que pode fazer um testamento, sendo exigidos alguns requisitos:

– ser maior de 16 anos;

– estar plenamente capacitada, ou seja, a pessoa não pode estar acometida por alguma doença que prejudique sua capacidade de discernimento sobre suas escolhas, por exemplo, a doença do Alzheimer, ou sob efeito de medicamentos ou substâncias que afetem seu estado mental.

Ainda, devemos elencar situações especiais, que dizem respeito a pessoas estrangeiras, bem como aquelas acometidas por alguma limitação, como os analfabetos, cegos, surdos e mudos.

a) Estrangeiros:

O estrangeiro também pode declarar o testamento público, inclusive em seu idioma, desde que acompanhado por intérprete de confiança. Em relação ao testamento cerrado, os estrangeiros podem formulá-lo no seu idioma e o brasileiro também pode escolher idiomas estrangeiros, “quando pretenda ampliar o segredo de suas disposições”1.

b) Analfabetos:

Os analfabetos podem fazer testamento público (em cartório) e ele será assinado por uma das testemunhas. Nesses casos, a leitura do testamento é de extrema importância e a testemunha que ouvir a leitura será a mais recomendada para assinar o documento.

Em relação ao testamento cerrado, também pode ser feito por analfabetos, desde que saibam assinar, podendo ouvir o conteúdo do escrito por alguém que seja de sua confiança.

c) Mudos, surdos e cegos:

O mudo pode ser testador em testamento público, já que ele pode ouvir a leitura do texto a ser feita pelo tabelião e comunicar-se pelo idioma dos sinais, caso necessário e, preferencialmente, acompanhado de intérpretes.

Para os surdos, a leitura em voz alta pelo testador em caso de testamento público é substituída pela leitura direta do próprio testador. Caso o surdo não saiba ler, pode ser designada uma pessoa de sua confiança para tanto. A função da testemunha passa a ser de confirmar a leitura do testador e, caso ele não saiba escrever, a testemunha poderá assinar o documento em seu lugar.

O cego que puder ler e escrever em braile (sistema de escrita com pontos em relevo que os cegos utilizam para ler pelo tato) também poderá declarar sua vontade em testamento público ou cerrado. Caso ele não consiga ler, porém, não poderá utilizar-se desta modalidade de testamento.

Como podemos observar, o testamento é um instrumento de muita utilidade, no entanto, ainda são poucas as pessoas que optam por formulá-lo. O motivo pode ser o desconhecimento sobre o assunto, ou talvez, uma questão cultural que relaciona o testamento à morte de um ente querido, fazendo com o que o tema muitas vezes passe a ser visto como delicado e, por isso, evitado.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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LÔBO, Paulo. Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013.

Testamento: o que é, como fazer e quais são as modalidades

O testamento é um documento por meio do qual uma pessoa expressa sua vontade em relação à distribuição dos seus bens, que acontecerá depois da sua morte, ou expressa sua vontade sobre questões que envolvem assuntos pessoais e morais.

Por exemplo, “A” faz um testamento para dizer que determinado imóvel pertencente ao seu patrimônio deverá ficar para “B”. Ou então, “A” reconhece, por testamento, “B” como  seu filho, mesmo que não tenha realizado o registro na ocasião do nascimento (sim, isso é possível!).

Dito isso, passamos à seguinte pergunta: Como fazer um testamento?

Para fazer um testamento, basta que o testador manifeste seu desejo e que este seja devidamente documentado. O testamento é, de fato, uma declaração de vontade do testador. Assim, a comprovação da propriedade dos bens que ele eventualmente quiser fazer constar no documento, somente será efetivamente obrigatória quando for necessário abrir o inventário (“O que é inventário e para que serve?” – clique aqui).

Importante observar que há certos procedimentos que devem ser seguidos, tendo em vista a existência de diferentes formas de testamento, podendo ele ser: ordinário (público, cerrado, particular) ou especial (marítimo, aeronáutico, militar ou simplificado).

Explicaremos abaixo, brevemente, sobre cada um deles.

Testamento público: Esta é a modalidade de testamento mais conhecida e mais utilizada pelas pessoas. Para a sua elaboração, a pessoa precisa ditar a sua vontade, em voz alta, ao tabelião (funcionário de um cartório de registros), pessoa  dotada de fé pública, que tem o dever de prevenir invalidades, trazendo assim mais segurança para aqueles que estão elaborando seu testamento público. A vontade ditada pelo testador deverá ser redigida pelo tabelião e, ao final, lida em voz alta para se ter certeza e confirmação sobre que foi escrito.

Ainda, é obrigatória a presença de duas testemunhas. A assinatura do testador também é essencial para a validade do documento, sendo dispensável somente em casos excepcionais. Por ser “público”, presume-se que esse tipo de testamento poderá ser lido por qualquer pessoa.

Testamento cerrado: Nessa modalidade, a própria pessoa redige o seu testamento na presença de duas testemunhas, e o entrega ao tabelião que o registrará se estiver em conformidade com a forma prevista em legislação. Esse testamento será colocado pelo tabelião dentro de um envelope fechado com cera derretida e costurado (por isso o nome “cerrado”), sendo sigiloso o seu conteúdo.

No cartório ficará arquivado o auto de aprovação (que será redigido pelo tabelião e é o único documento lido em voz alta para as testemunhas, ou seja, elas não terão conhecimento do conteúdo do testamento, somente da sua existência), permanecendo o original com o testador. Quando o testador vier a falecer, haverá procedimento judicial, no qual o Juiz(a) determinará a abertura do testamento e o seu  devido registro em cartório e, a partir daí, o documento começará a produzir seus efeitos.

Testamento particular: Pode ser escrito e assinado pelo próprio testador, de próprio punho ou por meio mecânico, ou escrito por terceira pessoa, por meio mecânico, mas assinado pelo testador. Esse tipo de testamento exige a presença de, pelo menos, três testemunhas. Assim como no testamento público, deve ser lido em voz alta para as testemunhas, que tomarão conhecimento do conteúdo do testamento. O documento deverá ser assinado tanto pelo testador quanto pelas testemunhas, que deverão estar devidamente qualificadas.

Nesta modalidade de testamento, como não existe fé pública, pois não é redigido por tabelião, nem registrado junto ao cartório, o testamento precisará ser confirmado judicialmente, ou seja, para que o documento possa produzir efeitos, com a morte do testador, ele deverá ser apresentado perante o Juiz, que determinará sua publicação e o chamamento dos herdeiros, que podem ter interesse em impugná-lo (questionar o conteúdo do testamento).

Importante ressaltar que, o testamento produzirá seus efeitos se ao menos uma das três testemunhas presentes, quando da sua elaboração, estiver viva para confirmar que aquele é, de fato, o testamento do falecido e se o Juiz estiver convencido de que há provas suficientes de que o mesmo é verdadeiro.

No entanto, como em quase tudo no Direito, há uma exceção. A Lei prevê a possibilidade de realização de testamento “simplificado” em circunstâncias excepcionais1, escrito de próprio punho, assinado pelo testador, sem testemunhas, a ser confirmado pelo Juiz.

Isso significa que o Juiz(a) poderá aceitar o testamento que for apenas assinado pelo testador, sem a presença de testemunhas, se restar comprovado de maneira suficiente que o mesmo é verdadeiro e, desde que esteja declarado o motivo excepcional para que não tenha sido declarado perante testemunhas.

Testamento marítimo: Esta modalidade de testamento somente pode ser feita nos casos em que o testador esteja embarcado, em alto-mar, durante uma viagem, e tenha receio de não chegar vivo ou não conseguir manifestar sua vontade na ocasião do retorno. O documento pode ser feito perante o comandante, que desempenhará o papel do tabelião, e na presença de duas testemunhas, que podem ser outros passageiros. No primeiro porto em território brasileiro, o comandante entregará o documento às autoridades.

Testamento aeronáutico: Somente pode ser feito quando o testador estiver em viagem, a bordo de uma aeronave militar ou comercial e quando houver receio de que não chegará vivo ao fim do voo. O comandante da aeronave não pode deixar seu posto, motivo pelo qual o testador pode designar qualquer pessoa para lavrar o documento com as disposições testamentárias. O testamento constará em registro de bordo e deverá ser entregue às autoridades quando da chegada em aeroporto.

Testamento militar: Poderá ser feito por militar e outras pessoas a serviço das forças armadas (ou por seus familiares), em serviço dentro ou fora do país, bem como por militar ou pessoas que estejam em praça sitiada (em lugar cercado por forças militares inimigas, sem possibilidade de afastar-se da tropa ou do acampamento) ou com a comunicação interrompida. O testamento militar se configura mediante declaração de vontade a duas testemunhas, com assinatura delas e do testador. Em casos excepcionais de perigo, o documento pode ser assinado por uma terceira pessoa, pelo comandante ou por oficial de saúde de hospital militar. Ainda, se os envolvidos estiverem em extrema situação de risco que os impeça de escrever, há possibilidade de se testar oralmente às testemunhas.

Essas três últimas modalidades, como podemos ver, são para casos extremamente especiais. Além do mais, elas têm um caráter provisório, pois se considera que a pessoa que elaborou o testamento o fez ante a possibilidade de vir a falecer durante o período em que está embarcado, ou a serviço militar. Assim, caso ela não venha a falecer depois de 90 dias do seu desembarque ou do término da situação de perigo, o testamento caduca, ou seja, deixa de ter validade

Vê-se, portanto, que essas são as formas de testamento previstas no ordenamento jurídico brasileiro, cabendo a cada um analisar, caso seja de seu interesse a elaboração do testamento, qual das modalidades é a mais adequada à sua situação.

Para saber o que pode estar no testamento, quem pode fazer um testamento, entre outras questões, confira o artigo “Qual é a vantagem de fazer um testamento?” (clique aqui).

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 Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho


1 “Extraordinárias são as circunstâncias que impeçam o testador de reunir três testemunhas, para leitura e assinatura do texto que escrever, ou de não poder dispor de meios mecânicos para redigi-lo naquele instante, havendo risco pela demora. (…) Excepcional é o que é fora do comum, que ocorre além dos limites do estabelecido ou do que é normal, frequente ou corriqueiro. Nesse sentido, é excepcional a circunstância de o testador encontrar-se sob ameaça ou limitado em seus movimentos por interessados em sua herança”. LÔBO, Paulo. Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013.

Regime da comunhão parcial de bens – Parte 2

O regime da comunhão parcial de bens é o mais aplicado em todos os casos. Tratou-se sobre ele no artigo “Regime da comunhão parcial de bens – parte 1” (clique aqui).

Porém, no intuito de esclarecer dúvidas que podem ter permanecido, bem como de facilitar o entendimento sobre como o regime é aplicado na prática, o presente texto traz alguns exemplos práticos.

É que, o regime da comunhão parcial de bens, vai muito além da ideia que muitas pessoas têm de que “tudo o que vier depois do casamento é meu também”.

Assim, segue abaixo um breve “passo a passo” para identificar quais bens serão divididos e quais ficarão de fora da partilha em caso de divórcio ou dissolução de união estável, quando o regime for o da comunhão parcial de bens.

1º passo – Identificar a data do bem adquirido.

Exemplo: Já possuía o bem antes de casar?

Se SIM → O bem não integrará o patrimônio comum e não será partilhado na ocasião do divórcio (ou dissolução da união estável); ele fará parte, portanto, dos bens particulares.

Se NÃO → Devemos passar para a análise dos passos seguintes.

2º passo – O bem foi adquirido em substituição a outro bem anterior ao casamento (sub-rogado)?

Exemplo: Eu já tinha um bem antes de casar e, depois de casado, resolvi vender e comprar outro bem com o valor da venda do anterior.

Se SIM → O valor da venda ou o novo bem não integrarão o patrimônio comum.

Se NÃO → O bem foi adquirido a título oneroso (mediante pagamento de valor) ou por fato eventual (prêmio da loteria), durante o casamento (ou união estável), então faz parte do patrimônio comum.

Obs.: Caso o novo bem adquirido tenha custado mais que o bem anterior, o valor que for pago a mais integrará o patrimônio comum. Exemplo: Vendi um carro de 30 mil e comprei um de 50 mil – O valor excedente (20 mil) será partilhável, pois fará parte dos bens comuns.

3º passo – O bem foi recebido pelo cônjuge (ou companheiro/a) a título de doação ou herança?

Se SIM → O bem não integrará o patrimônio comum e não será partilhável.

Se NÃO → Mesma hipótese do exemplo anterior, ou seja, se o bem foi adquirido de forma onerosa depois do casamento (e não por doação ou herança), deverá integrar o rol de bens comuns.

Obs.: Se a doação ou a herança for feita expressamente para o casal, o bem integrará o patrimônio comum.

4º passo – Existe uma obrigação (dívida) assumida somente por um dos cônjuges antes do casamento?

Exemplo: Contraí uma dívida antes de casar, e estou devendo determinada quantia para o banco.

Se SIM → Somente aquele que assumiu a obrigação é responsável pelo seu cumprimento, não recaindo a obrigação sobre a meação do outro cônjuge.

Obs.: No entanto, se a dívida contraída em nome de um dos cônjuges for anterior ao casamento (ou união estável), mas a obrigação foi assumida em proveito do casal (Exemplo: festa de casamento), ambos serão responsabilizados igualmente.

Se NÃO → Não há com o que se preocupar, pois o fato (dívida) não ocorreu.

5º passo: O bem foi adquirido depois do casamento (ou união estável), mas é de uso pessoal, são livros ou são instrumentos de profissão?

Exemplo: Quando o bem sobre o qual se discute a partilha for, por exemplo, livro para advogado, ferramenta para mecânico, instrumento musical para músico ou, ainda, objetos pessoais como documentos, roupas, sapatos, celulares e semelhantes.

Se SIM → Se forem de uso pessoal, livros ou bens relacionados ao exercício da profissão, eles serão somente do cônjuge que os adquiriu e que precisa utilizá-los em seu cotidiano, ainda que os tenha comprado na constância do casamento (ou união estável).

Se NÃO → Se não forem bens de uso pessoal ou profissional, eles integrarão o patrimônio comum do casal.

Importante frisar que não é possível prever todas as hipóteses possíveis para serem abordadas aqui. Desse modo, como cada caso deve ser analisado de acordo com suas particularidades, se necessário, o ideal é entrar em contato com profissionais que atuem na área a fim de que prestem uma orientação mais precisa sobre cada situação.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Qual é a diferença entre herdeiro e meeiro?

É sabido que a linguagem jurídica possui alguns termos que não são de fácil entendimento, mas o objetivo do Direito Familiar é esclarecer da melhor forma possível alguns pontos, para que as pessoas tenham acesso à informação e ao Direito!

Dito isso, é de se mencionar que alguns dos termos que causam confusão são os seguintes: “herdeiro” e “meeiro”. Porém, antes de abordar essas expressões é importante lembrar os conceitos de “herança” e “meação”, para facilitar a compreensão.

A herança é o conjunto de bens deixados pelo falecido; é todo o patrimônio que será herdado diante do falecimento de uma pessoa. Assim, o recebimento de herança é um direito que decorre do óbito de um indivíduo.

Já a meação pode ser entendida como a metade do patrimônio comum do casal, sobre a qual tem direito cada um dos cônjuges (inclusive no que diz respeito à eventual partilha decorrente de divórcio ou dissolução de união estável). O direito à meação, por sua vez, decorre do regime de bens adotado no casamento (ou união estável).

Para melhor ilustração, seguem os seguintes exemplos:

EXEMPLO 1: no regime da comunhão universal de bens, todo o patrimônio adquirido antes ou depois do casamento é comum, ou seja, tudo pertence aos dois (salvo exceções expressas). Portanto, cada um dos cônjuges tem direito a 50% do patrimônio total (a meação de cada cônjuge corresponde a 50% do patrimônio total do casal).

EXEMPLO 2: no regime da comunhão parcial, os bens comuns do casal serão apenas aqueles adquiridos depois do casamento. Com isso, caberá a cada um dos cônjuges a metade dos bens adquiridos durante o casamento (a meação de cada cônjuge corresponde a 50% do patrimônio adquirido na constância do casamento).

De maneira resumida, a meação significa sempre a metade dos bens comuns do casal , que será destinada a cada um dos cônjuges em caso de separação ou divórcio, por exemplo. Contudo, considerando que nem todos os regimes de bens possuem bens comuns, nem sempre haverá meação.

A exemplo disso, tem-se o regime de separação total de bens, no qual os bens do casal não se misturam, pois cada um é dono daquilo que adquirir, ainda que durante o matrimônio, e, portanto, não há que se falar em meação.

Entendidos tais conceitos, a compreensão acerca da diferença entre herdeiro e meeiro torna-se mais fácil.

HERDEIRO é aquele que tem direito a receber os bens deixados por quem faleceu, ou seja, é um sucessor da pessoa falecida; ao passo que MEEIRO é aquele que é possuidor de metade dos bens do falecido, mas não em decorrência do falecimento, e sim, pelo regime de bens adotado quando da união com a pessoa falecida.

Portanto, resta claro que a meação já existe antes do óbito do cônjuge/companheiro e a herança surge a partir do falecimento. Ressalte-se, contudo, que, caso um dos cônjuges (ou conviventes) venha a falecer, o outro ainda receberá sua meação, se isso estiver de acordo com o regime de bens aplicado.

Á título exemplificativo:

“A” e “B” casaram sob o regime de comunhão universal de bens. “A” e “B” são meeiros um do outro, visto que cada um tem direito à metade do patrimônio comum.

Se “A” vier a falecer, “B” será somente meeiro, pois já é “dono” de 50% do patrimônio do casal em decorrência do regime de bens adotado.

Se “A” e “B” tiveram os filhos “C” e “D”, esses serão herdeiros do patrimônio deixado por “A”, cabendo 25% a cada um deles. “B” será apenas o meeiro do patrimônio total, como visto acima.

No entanto, se “A” e “B” não tiverem filhos, e “A” não tiver pais vivos, “B” será, além de meeiro, herdeiro do patrimônio deixado por “A”.

Para ler sobre o regime da comunhão universal de bens, clique aqui e aqui.

O mesmo pode acontecer quando o regime de bens adotado durante o casamento for o da comunhão parcial de bens, por exemplo. Nessa situação, “B” terá direito à herança sobre os bens particulares e também à meação sobre os bens comuns.

Para ler sobre o regime da comunhão parcial de bens, clique aqui e aqui.

Tem-se, portanto, que, dependendo do regime de bens escolhido, o cônjuge ou companheiro(a) poderá ser apenas meeiro, meeiro e herdeiro, ou, apenas herdeiro. Diante disso, importante frisar que cada caso deverá ser analisado individualmente, de acordo com as suas peculiaridades e estrutura familiar.

Se quiser entender melhor como funciona o inventário (partilha de bens decorrente do falecimento) em cada um dos regimes de bens, confira o artigo: “Inventário: herança do cônjuge ou companheiro(a)” (clique aqui).

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

O que é o inventário e para que serve?

Quando uma pessoa falece e deixa bens, é necessário verificar quem tem o direito de ficar com este patrimônio deixado pelo de cujus (falecido). A forma de regularizar esta situação acontece através do procedimento do inventário e partilha que visa formalizar a transmissão dos bens do falecido para os seus sucessores (herdeiros).

O Direito das Sucessões é o ramo do Direito formado pelo conjunto de normas que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que faleceu aos seus sucessores. O termo “patrimônio” não abrange somente bens, ele abarca também alguns direitos e algumas obrigações (com exceção daquelas que somente poderiam ser prestadas pelo próprio falecido, quando em vida).

Euclides de OLIVEIRA e Sebastião AMORIM explicam que a sucessão “tem o sentido de substituição de pessoas ou de coisas” e, assim, quando uma pessoa falece deixando bens, “opera-se a sucessão, pela transmissão da herança ao herdeiro”¹.

A transmissão sucessória é formalizada pelo processo de INVENTÁRIO, sendo esse, portanto, o procedimento por meio do qual “os bens, direitos e dívidas deixados pelo de cujus são levantados, conferidos e avaliados de modo a que possam ser partilhados pelos sucessores”² .

Até o fim do processo de inventário, o conjunto de bens que forma a herança é indivisível, ou seja, há necessidade, por exemplo, de autorização judicial para a venda de bens que façam parte dele.

O prazo previsto em lei para a abertura do inventário é de 60 dias a contar da abertura da sucessão (momento do falecimento). Apesar disso, os herdeiros costumam demorar para pedir a abertura do procedimento de inventário, até mesmo por razões emocionais. Assim, importante dizer que não há sanção específica para o descumprimento do prazo, mas uma das consequências pode ser a imposição de multa de caráter tributário.

A abertura do inventário deve acontecer no último local de domicílio do falecido. Caso ele residisse fora do país, o inventário deve tramitar no último domicílio que ele teve no Brasil. Afora isso, na hipótese de o falecido não ter um domicílio definido, abre-se o inventário no local onde ele tinha seus imóveis.

Importante esclarecer que o inventário não é um processo exclusivamente judicial, sendo admitida sua realização pela via administrativa, ou seja, diretamente em cartório, desde que preenchidos alguns requisitos, como veremos a seguir.

MODALIDADES DE INVENTÁRIO:

  • Judicial

O pedido de abertura do inventário judicial pode ser formulado por qualquer um que demonstre seu legítimo interesse na instauração do processo. Se ninguém pedir a abertura do procedimento, ele poderá ser iniciado também pelo Ministério Público, pela Fazenda Pública, pelo próprio Juízo ou pelos credores (aqueles que deixaram de receber valores devidos pelo falecido ou pelos herdeiros).

Alguns dos documentos essenciais para a abertura do inventário são os seguintes:

– procuração
– certidão de óbito do falecido
– testamento (se houver) ou certidão comprobatória de inexistência do testamento
– certidão de casamento ou prova da união estável
– documentos pessoais dos herdeiros
– escrituras dos bens imóveis
– comprovação de propriedade de outros bens a inventariar
– certidões negativas de débitos fiscais

A apresentação dos documentos mencionados é essencial para que se possa aferir os dados corretamente, evitando erros na partilha e questionamentos por terceiros. Será nomeado um inventariante, o qual assinará um termo de compromisso, ficando responsável por dar andamento ao feito e por cuidar do espólio (conjunto de bens, direitos e obrigações) até o fim do trâmite processual. Se não o fizer com o devido zelo, o inventariante poderá ser removido pelo Juízo.

Há possibilidade de ingressar judicialmente com o pedido de inventário por arrolamento. Nesses casos, o Juízo somente homologará a proposta de partilha apresentada pelos herdeiros, sem maiores discussões. É um processo judicial menos formal. Os documentos, porém, devem ser apresentados da mesma maneira.

  • Extrajudicial

O inventário extrajudicial, por escritura pública, pode ser realizado desde que³:

a) não haja menores de idade ou incapazes na sucessão;
b) haja concordância entre todos os herdeiros;
c) o falecido não tenha deixado testamento;*
d) sejam partilhados todos os bens (vedando-se a partilha parcial);
e) se tenha a presença de um advogado comum a todos os interessados;
f) estejam quitados todos os tributos;
g) o Brasil tenha sido o último domicílio do falecido.

Além dos documentos essenciais ao inventário judicial, também é preciso que se apresente a minuta do esboço do inventário e da partilha para o procedimento extrajudicial. A indicação de inventariante é obrigatória, nos termos do artigo 11 da Resolução nº. 35 do CNJ, e o tabelião do Cartório lavrará a escritura pública, fazendo menção aos poderes decorrentes da inventariança para transferência de propriedade (vender, comprar, receber, ceder, levantar dinheiro, etc.).

Por fim, importante mencionar que o inventário é um procedimento obrigatório, ainda que o falecido não tenha deixado patrimônio. Nesses casos, ocorre o que se costumou chamar de “inventário negativo”, sendo necessário que alguém abra o procedimento para demonstrar a ausência de bens, direitos e deveres.

As questões chamadas de “alta indagação”, quais sejam, aquelas que possuem relação com o inventário, podem ser remetidas pelo juiz para as vias autônomas. A exemplo, tem-se as investigações de paternidade, que podem definir se uma pessoa será ou não herdeira do falecido. Nessas situações, pode-se reservar certa quantia do patrimônio que seria destinada ao possível herdeiro para que, sendo ele declarado filho em uma demanda própria de investigação de paternidade, tenha seu direito à herança resguardado.

*Em recente decisão, o STJ proferiu decisão autorizando a realização de inventário extrajudicial quando existir testamento, desde que preenchidos os demais requisitos. Na prática tem acontecido da seguinte maneira: quando os interessados entram com a ação para registrar o testamento, já devem pedir a autorização para realizar o inventário extrajudicial; se os demais requisitos forem preenchidos, os juízes têm manifestado concordância quanto ao pedido.

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Arethusa Baroni
Flávia Kirilos Beckert Cabral
Laura Roncaglio de Carvalho

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1OLIVEIRA, Euclides de e AMORIM, Sebastião. Inventários e Partilhas. 23a Edição. Editora Universidade de Direito. São Paulo, 2013.
2LÔBO, Paulo. Direito Civil: Sucessões. Editora Saraiva. São Paulo, 2013.
3 CASSETTARI, Christiano. Separação, Divórcio e Inventário por Escritura Pública . 6a Edição. Editora Método. São Paulo, 2013.

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