Tabela de despesas para calcular pensão alimentícia

Elaborar uma tabela de despesas para calcular o valor da pensão alimentícia é algo necessário quando nos deparamos com processos judiciais que estão discutindo valores que devem ser pagos.

Se você já leu alguns artigos do Direito Familiar sobre pensão alimentícia, deve ter entendido que, embora o nome seja “pensão alimentícia”, esse instituto na verdade trata de um valor destinado àquele que não pode prover seu próprio sustento. Ou seja, embora estejamos falando de “alimentos”, a quantia estabelecida por um juiz ou juíza em sentença ou em um acordo entre as partes não será destinada somente à alimentação dos filhos, mas a todas as despesas essenciais deles.

Para ler o que é “sentença”, clique aqui.

No artigo “Pensão alimentícia de pais para filhos” (clique aqui), explicamos que “a obrigação de prestar alimentos decorre da autoridade parental, que é o conjunto de direitos e deveres dos genitores em relação à prole” e salientamos que “o termo pensão alimentícia abrange todo tipo de assistência aos filhos, não só alimentos propriamente ditos, ou seja, inclui habitação, vestuário, lazer, saúde e educação”.

No referido artigo, constou também que, em que pese muitos acreditem que o valor dos alimentos sempre será fixado em 33% dos rendimentos do outro genitor, essa é uma ideia equivocada. Isso porque “as possibilidades financeiras daquele que deve pagar a pensão devem ser consideradas, comparando-se com as necessidades dos filhos”.

Mas então, como fazer essa comparação dentro de um processo?

O ideal é que aquele que está pedindo a fixação dos alimentos apresente uma tabela de suas despesas mais significativas, inclusive mostrando no processo documentos que comprovem tais gastos (conta de luz, de água, boleto da mensalidade escolar, entre outros).

E quais seriam essas despesas mais significativas?

Por conta de algumas dúvidas dos nossos leitores em relação a isso, resolvemos elaborar uma tabela que pode servir como base para quem está pensando em pedir judicialmente o estabelecimento de pensão alimentícia para os/as filho/as. Vejam só:

GASTOS COM:

R$

MERCADO

HABITAÇÃO (ALUGUEL)

ALIMENTAÇÃO

HIGIENE

EDUCAÇÃO

(MENSALIDADE ESCOLAR)

EDUCAÇÃO (MATERIAL ESCOLAR)

 Taxa anual – valor dividido por 12

EDUCAÇÃO (ATIVIDADES EXTRACURRICULARES)

VESTUÁRIO

DESPESAS DE CASA:

  • ENERGIA ELÉTRICA

  • ÁGUA

  • INTERNET

  • GÁS

Somar e dividir pela quantidade de moradores do local

PLANO DE SAÚDE

DESPESAS MÉDICAS

LAZER

Aqui podem entrar saídas (cinema e teatro), presentes para festas de aniversário, parque de diversões, viagens, entre outros.

TOTAL:

Importante dizer que existem certas situações que devem ser observadas. Por exemplo, conforme colocado na tabela, os valores das despesas da residência como um todo não podem ser considerados gastos exclusivos dos/as filhos/as, de modo que devem ser levados em conta os demais moradores do local para a definição da quantia que seria destinada à prole.

Além disso, existem gastos – tais como com material escolar – que acontecem somente uma vez ao ano, em regra. Assim, o valor deve ser dividido entre todos os meses do ano. Quando houver alteração (porque sabemos que o processo pode durar mais de um ano, infelizmente), tais quantias podem ser atualizadas. O recomendado é apresentar uma nova tabela de despesas sempre que houver qualquer alteração.

Caso o/a filho/a já tenha completado a maioridade, o interessante é que se demonstre que está frequentando instituição de ensino. Portanto, a tabela acima também pode ser utilizada por ele, desde que comprove documentalmente as circunstâncias justificadoras da fixação de pensão alimentícia.

Para ler o artigo “Filho(a) maior de 18 anos pode continuar a receber os alimentos?”, clique aqui.

Para os casos em que já foram fixados alimentos anteriormente e o que se pretende é a alteração da quantia, também pode ser utilizada esta tabela como exemplo. Lembre-se, porém, que, para a alteração da pensão alimentícia é necessário demonstrar no processo a modificação fática que levou à necessidade de mudança do valor.

Para ler o artigo “Como alterar o valor da pensão alimentícia”, clique aqui.

Ressalte-se, ainda, que mesmo quando os pais optam ou o juiz estabelece a guarda compartilhada, existe a possibilidade de fixação de alimentos a serem pagos por um dos genitores e, então, a tabela também poderá ser utilizada.

Isso porque, conforme já tratamos no artigo “Os alimentos na guarda compartilhada” (clique aqui), “o que se deve levar em conta, mais do que a guarda em si, são os princípios e as regras relativas ao dever de sustento dos pais aos filhos, não sendo, portanto, o compartilhamento da guarda um obstáculo à determinação de pensão alimentícia” e pode ser que os genitores possuam diferentes condições financeiras, podendo, eventualmente, um arcar com mais despesas do que o outro.

Grife-se que, a tabela que trouxemos tem o intuito de auxiliar quem está passando por alguma situação envolvendo um processo em que se discute a fixação de pensão alimentícia. No entanto, é certo que cada caso poderá trazer despesas diferenciadas e mais específicas. A tabela acima serve como um modelo de referência, mas cada caso deve ser sempre analisado de acordo com as suas particularidades.

De qualquer forma, com a tabela dentro do processo, o juiz poderá fazer uma análise acerca do binômio necessidade possibilidade (leia mais sobre isso aqui) e poderá comparar as necessidades do filho com os ganhos e gastos daquele genitor que deverá prestar os alimentos. Assim, torna-se mais rápida e eficaz a resolução de um processo de pensão alimentícia.

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Planejamento sucessório: Como dividir meu patrimônio em vida?

O planejamento sucessório nada mais é do que, quando ainda em vida, o autor de uma herança já deixa seus herdeiros todos identificados, bem como indica seu patrimônio e a forma como ele deverá ser divido e administrado pelos herdeiros, quando vier a falecer.

A primeira impressão é de que é algo extremamente simples de se fazer, mas muitas pessoas ficam desconfortáveis com essa situação e não sabem bem ao certo como pode ser feito, principalmente por estar relacionado a morte de alguém.

Conforme as psicólogas Mariana Bayer e Paula Leverone:

Pouco se fala sobre a morte, enquanto ela não está presente. Muitos postergam ou evitam o contato com o tema, movidos por defesas que buscam afastar a angústia do desconhecido e a ideia de sofrimento que as perdas podem trazer.”

Para saber mais, confira o artigo: “Direito de Família e Psicologia: Por que é tão difícil falar sobre testamento?” – (clique aqui).

Por tal motivo, é raro que as pessoas parem para pensar sobre o assunto, e reflitam sobre os benefícios de um planejamento sucessório. Alguns podem considerar até uma falta de respeito, ou uma indelicadeza antecipar tal discussão, enquanto a pessoas está ali, viva. Muito provavelmente isso aconteça em virtude da dificuldade que as pessoas têm em lidar com a perda de entes queridos.

Mas você tem ideia do quão importante pode ser fazer um planejamento sucessório?

Pois bem, ele pode evitar muitos conflitos familiares e acelerar bastante um procedimento de inventário e partilha de bens. Temos de convir que as leis brasileiras que tratam de direitos sucessórios são de difícil compreensão e, às vezes, não atendem às reais vontades do autor da herança.

Ora, se uma pessoa construiu um patrimônio, considerável, ou não, mas que é seu, nada mais justo do que ela poder dispor dele da forma que desejar, desde que respeitando, também, os limites impostos pelas leis.

Devemos olhar para o planejamento sucessório como algo que tornará muito mais leve e simples passar por este momento do luto e de todo processo de inventário.

Uma das formas de fazer esse planejamento sucessório é através da elaboração de um testamento.

Como vimos no artigo “O que é testamento e quais são as modalidades existentes?” (clique aqui):

O testamento é um documento por meio do qual uma pessoa expressa sua vontade em relação à distribuição dos seus bens, que acontecerá depois da sua morte, ou expressa sua vontade sobre questões que envolvem assuntos pessoais e morais.”

Em outro artigo, falamos sobre as vantagens de se fazer um testamento:

A vantagem de declarar as vontades em um testamento está muito ligada aos sentimentos do testador em relação às pessoas e à forma como quer distribuir seu patrimônio. Muitas vezes, inclusive, um testamento bem elaborado elimina diversos conflitos familiares que surgem na hora da divisão do patrimônio deixado por aquele que não mais está presente.” (leia o artigo na íntegra clicando aqui) 

Importante deixar claro que fazer o planejamento sucessório não exclui a necessidade de entrar com o procedimento de inventário, ele servirá, em tese, para facilitar e, possivelmente, acelerar todo o processo.

Outra forma de fazer o planejamento sucessório é através da criação de uma Holding familiar.

Esse termo é pouco conhecido pelas pessoas, tendo em vista que sua aplicação geralmente se dá quando a família possui empresas, investimentos, grandes propriedades, etc.

De maneira extremamente simplificada, podemos dizer que uma Holding familiar consiste na criação de uma sociedade (pessoa jurídica) formada pelo patrimônio da família, ou seja, os familiares tornam-se sócios. Por meio dessa Holding, poderão ser estabelecidas regras em relação à participação de cada membro família, à administração dos bens e até mesmo conter a indicação dos sucessores que dirigirão a empresa.

Outras vantagens da criação de uma Holding familiar dizem respeito à não incidência de alguns impostos relativos à transferência de bens para a Holding, bem como ao fato de, por vezes, ser dispensável a realização de inventário e partilha de bens, tendo em vista a possibilidade de doação de quotas e ações da Holding familiar em favor dos sucessores.

Ou seja, quando do falecimento do autor da herança, se ele não tiver bens particulares, deverá ser apenas formalizado o inventário negativo, que servirá somente para declarar que o falecido não deixou bens particulares para serem inventariados e partilhados.

É de se ressaltar que, fazer um planejamento sucessório requer certos conhecimentos  e muito cuidado para não gerar problemas futuros. Portanto, é extremamente importante procurar o auxílio de um advogado/a especializado/a na área, para que avalie o seu caso e indique o caminho mais adequado.

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

O que é “bem de família”?

Em artigos anteriores publicados no Direito Familiar, falou-se sobre as formas que existem de cobrar judicialmente a pensão alimentícia devida e não paga. Uma dessas formas diz respeito à penhora dos bens daquele que deveria prestar os alimentos.

Para ler sobre o cumprimento de sentença de uma decisão de alimentos, clique aqui.

No entanto, talvez você já tenha ouvido falar sobre um dos bens que não pode, em regra, ser penhorado, e ele é chamado “bem de família”. Mas, o que isso significa? É o que veremos no artigo de hoje!

Em diversos artigos do blog, mencionamos que a família vem passando por diversas transformações ao longo dos anos e que ela foi adquirindo um caráter mais afetivo do que meramente biológico. Isso aconteceu também porque, desde o advento da Constituição Federal de 1988, preza-se mais pela dignidade da pessoa, sendo um princípio norteador das demais normas jurídicas.

Inserida na ideia de dignidade da pessoa, temos o que se pode chamar de “direito ao mínimo existencial”, o que significa dizer que deveria ser garantido a todos o mínimo necessário à sua sobrevivência digna. Assim, é possível uma reflexão acerca de quais bens seriam indispensáveis às necessidades básicas das pessoas. É aí que entra o conceito do “bem de família”.

O bem de família é aquele que deve ser protegido, por ser um patrimônio mínimo necessário para se viver com dignidade e, por isso, não pode ser penhorado, ou seja, em se tratando de um imóvel residencial, por exemplo, mesmo que o proprietário daquele bem possua dívidas, ele não poderá perder aquele determinado imóvel para quitar o débito, por ser um bem necessário à sua subsistência.

Existem duas formas de se classificar um bem de família:

CONVENCIONAL – é aquele que a família escolhe para ser seu bem protegido. Depende de ato voluntário, ou seja, os interessados devem comparecer em cartório de imóveis e declarar a situação do bem em escritura pública, a fim de gerar a inalienabilidade e impenhorabilidade. Vale dizer que, em que pese ele seja um “bem de família”, existirá ainda a possibilidade de penhora em determinados casos, como na ausência do pagamento de tributos.

LEGAL – a Lei 8009/1990 determina que o imóvel residencial próprio de uma entidade familiar, bem como seus “adornos suntuosos”, são impenhoráveis e não responderão por qualquer tipo de dívida. Por “adornos suntuosos” pode-se entender aqueles bens que guarnecem a residência e são indispensáveis à moradia. Assim, tais bens são considerados “de família” por lei e não por vontade das partes.

Apesar disso, é certo que a lei será interpretada de acordo com as circunstâncias de cada caso. Isso porque o/a juiz/a deve analisar, em cada situação, se a proteção jurídica deve ser dedicada ao patrimônio do/a devedor/a ou ao direito apresentado pelo/a credor/a, de receber determinada quantia. Ou seja, as hipóteses autorizadoras da penhora justificam-se pelo critério da ponderação de direitos.

Por exemplo, se um devedor/a possui uma televisão de plasma, com elevado custo no mercado, pode ser autorizada a penhora do bem. De outro lado, se o bem do devedor for uma cadeira de rodas de uma pessoa com deficiência locomotora, entende-se que é um bem necessário à manutenção da dignidade da pessoa, não sendo, por isso, penhorável.

Importante dizer que, de acordo com a Súmula 364 do Superior Tribunal de Justiça, “o conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas”, de modo que a proteção alcança todas as pessoas, ainda que sozinhas, o que vai ao encontro dos princípios constitucionais atuais.

Como começamos o texto mencionando a questão da pensão alimentícia, é essencial ressaltar que, o “bem de família” pode ser penhorado em algumas situações específicas. São as exceções previstas no artigo 3o da Lei 8009/1990, quais sejam: créditos de natureza trabalhista; impostos (predial, taxas e contribuições); pensão alimentícia; dívida de fiança concedida em contrato de locação.

Diante disso, vê-se que, em que pese a regra seja a impenhorabilidade do bem de família, para a proteção da dignidade da pessoa, em algumas situações a própria dignidade da pessoa exige que o bem seja penhorado, ainda que seja o de família.

Em relação à pensão alimentícia, por exemplo, o que se observa é que, utilizando o critério da ponderação, aquele/a que recebe os alimentos (geralmente criança ou adolescente) está em uma situação mais vulnerável e necessita do valor para sua subsistência, de modo que deve ser favorecido/a. É certo, porém, que devem ser tentadas outras formas de recebimento da quantia antes da penhora do “bem de família”, que deve ser excepcional.

Para saber sobre as outras formas de recebimento da quantia, confira o artigo “Novidades sobre a cobrança de pensão alimentícia” (clique aqui).

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

O que é “coisa julgada”? E como ela se aplica no Direito de Família?

Quem tem um ou mais processos na Justiça, provavelmente já ouviu a expressão “coisa julgada”, mas pode não entender muito bem o que isso significa, principalmente se não tiver formação em Direito.

No texto de hoje, vamos explicar o que é a tal da “coisa julgada” e como ela é aplicada no Direito de Família.

Já falamos em alguns artigos que o Juiz (ou juíza), depois de analisar todos os fatos e provas dos processos, proferirá uma sentença, decidindo sobre o assunto que está em discussão. A parte insatisfeita com esta decisão do Juiz/a, pode tentar modificá-la, no prazo determinado pela Lei, por meio da interposição do que chamamos no Direito de “recurso”. Em regra, é somente por meio dos recursos que se pode alterar uma sentença.

Porém, quando não existir mais a oportunidade de interpor nenhum recurso (seja porque passou o prazo, ou porque já foram interpostos todos os recursos possíveis), a sentença se torna imutável, ou seja, ela não pode mais ser alterada. E a isso se dá o nome de “coisa julgada”. Portanto, podemos dizer que coisa julgada é uma característica da sentença que não pode mais ser alterada e, que existe para dar segurança às relações jurídicas e aos processos judiciais.

No ramo do Direito, é muito comum ouvirmos a expressão “a sentença fez coisa julgada”. E agora você já sabe o que isso significa: essa decisão não pode mais ser alterada, é válida e precisa ser cumprida rigorosamente.

Isso significa que, em tese, não pode ser aberto um novo processo para discutir algo que já tem uma decisão a respeito. Tanto que, normalmente, quando isso acontece, nem é dado prosseguimento ao processo, pois o Juiz/a irá verificará logo de início que já existe coisa julgada sobre aquele assunto e que este novo processo deverá ser extinto sem nem mesmo discutir a questão apresentada.

Acontece que, no Direito de Família, por tratar de questões dinâmicas, que dizem respeito à vida particular das pessoas, as circunstâncias podem mudar e, consequentemente, uma decisão tomada em um processo pelo Juiz/a pode não ter mais efetividade na prática. Por isso, dizemos que em muitos processos do Direito de Família a coisa julgada é relativa, sendo aceitável que se ingresse com uma nova demanda judicial para discutir novamente uma questão que havia sido resolvida anteriormente.

Veja o exemplo:

Maria entrou com um processo contra João, pedindo o divórcio, a partilha dos bens, a guarda do filho e o pagamento de alimentos no valor de R$ 1.000,00. Na sentença, o Juiz decretou o divórcio, especificou quem ficaria com cada bem, deixou a guarda do filho com a Maria, e determinou que o pai (João) pagasse os alimentos no valor mensal de R$ 800,00.

Nenhuma das partes recorreu (ninguém interpôs recurso) e, portanto, fez-se coisa julgada (a sentença ficou imutável e teve que ser cumprida pelas partes).

Entretanto, um ano depois, o filho foi morar com João, e desde então o pai ficou responsável por todas as despesas dele.

Houve, portanto, uma alteração na situação vivenciada por aquela família, e a parte da sentença que falava sobre a guarda e sobre a pensão alimentícia não está mais adequada à realidade vivida pelos envolvidos, de modo que deixou de fazer sentido, não possuindo mais eficácia, já que agora o filho mora com o pai, que é quem paga todas as suas despesas.

Neste exemplo, no que diz respeito ao divórcio e à partilha de bens, a sentença continuará imutável, uma vez que ninguém recorreu, ou seja, não será possível desfazer o divórcio e nem rediscutir, ainda que em uma nova ação, a forma como os bens foram divididos.

Porém, mesmo não tendo sido apresentado recurso na época em que a sentença foi proferida, poderá haver um novo julgamento, com relação à guarda e aos alimentos, já que a situação fática mudou.

Citando o caso utilizado como exemplo, João deverá procurar um advogado ou a Defensoria Pública para ingressar com um processo pedindo a alteração da guarda, para que seja atribuída a ele (que já vem exercendo de fato) e, a exoneração do pagamento dos alimentos que antes eram devidos por ele também. A sentença que será proferida nesse novo processo passará a valer, tornando a primeira sem qualquer efeito (com relação à guarda e aos alimentos).

Como podemos perceber, o Direito de Família tem maior flexibilidade, por tratar de direitos que são considerados indisponíveis e, principalmente por muitas vezes envolver a vida de crianças e adolescentes, motivo pelo qual se permite, em caráter excepcional, a relativização da coisa julgada.

As vidas das pessoas podem sofrer mudanças inesperadas, não podendo o Direito impedir a regularização de tais mudanças. Assim, é permitida, dentro do Direito de Família, a alteração de decisões proferidas anteriormente em outros processos, ainda que seja necessário o ingresso de uma outra ação, isso, é claro, desde que respeitados o bem-estar e o melhor interesse da criança e do adolescente.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

4 frases que não devem ser ditas na frente dos filhos!

No artigo “Direito de Família e Psicologia: como apresentar um(a) novo(a) companheiro(a) para seus filhos? (clique aqui) – convidamos a psicóloga Mirca Longoni, para contar um pouco sobre como os pais devem abordar essa situação com seus filhos.

Toda separação tende a ser dolorosa, e em relação a isso não temos dúvidas. No entanto, no nosso dia a dia dentro das Varas de Família, pudemos perceber a grande dificuldade que as pessoas têm em aceitar um novo membro na família – isso serve tanto para os “ex’s” quanto para os filhos e demais parentes.

Deve ficar claro que essa não aceitação nem sempre é injustificada. Em determinados casos, ela acontece não por mera “birra” dos filhos, mas porque os pais não souberam amenizar as circunstâncias traumáticas geradas pela separação, deixando que aqueles aspectos negativos repercutissem no desenvolvimento das crianças, o que pode interferir na aceitação delas de uma nova pessoa em suas vidas.

Em decorrência das mágoas que ficaram depois do término da relação, algumas pessoas acabam “metendo os pés pelas mãos” e, por vezes, falam coisas que não deveriam ser ditas. Tal situação pode gerar conflitos, acirrar a animosidade existente entre as partes e, por fim, interferir no desenvolvimento daqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade: os filhos.

Com o objetivo de ilustrar essas situações, trouxemos hoje alguns exemplos de frases que devem ser evitadas pelos pais depois do término da relação, a fim de não prejudicar os filhos!

Vamos lá?

1 – “Essa é sua nova mamãe!” ou “Esse é seu novo papai!”

Devemos sempre lembrar que os pais devem separar a conjugalidade da parentalidade. O que isso significa? Significa que o que terminou foi o relacionamento entre os pais, ou seja, as questões pessoais do relacionamento não podem interferir na relação com os filhos.

Não é porque o casal se separou que simplesmente um deles vai deixar de ser pai ou mãe. Geralmente essa situação ocorre com aquele que “deixou” o lar, mas vale lembrar que, apesar da separação, é direito do filho conviver com ambos os genitores, até porque isso contribuirá para a completa formação de sua personalidade (leia mais sobre isso clicando aqui).

Além disso, as obrigações inerentes à parentalidade permanecem. A nova figura que surge ao lado do pai ou da mãe, em que pese possa acrescentar, não virá em substituição. Toda essa situação pode gerar grandes discussões e atrapalhar de maneira grave o desenvolvimento regular de uma criança.

2 – “Você ficou doente porque ele(a) não cuidou direito de você”

Essa situação é muito comum quando o casal enfrenta problemas em relação ao exercício da guarda e convivência com os filhos. A culpa por qualquer problema de saúde que a criança venha a ter, acaba sendo imputada ao genitor que estava com a criança no dia em que ela adoeceu.

Mas espera aí, será que a criança realmente ficou doente ou teve mal estar em decorrência da negligência de um dos genitores? Será que a criança não está manifestando tais sintomas em virtude do estresse que ela está vivenciando?

Se cada vez que ela for visitar um dos genitores, tal momento for permeado de discussões e acusações, a situação pode tornar-se traumática, e ela poderá, inclusive negar-se a realizar as visitas, para evitar passar por todo esse desgaste emocional. Assim, ela poderá começar a ter sintomas de uma criança ou adolescente com um desenvolvimento emocional conturbado.

Falamos um pouco sobre isso no artigo “Conflitos durante um processo: como lidar?” (clique aqui):

Dificilmente as partes reconhecem que qualquer enfermidade ou mudança de humor da criança pode ser em decorrência do conflito travado entre eles, e não simplesmente da eventual alegada má adaptação à casa do outro ou até mesmo à falta de cuidado por parte do outro genitor.”

Ainda, no artigo “Direito de Família e Psicologia: quando o relacionamento dos pais prejudica os filhos”, a psicóloga Karina de Paula Menezes Santana falou um pouco sobre esses casos, vale a pena conferir, clicando aqui.

3 – “Ele/Ela brigou com a mamãe/papai e foi embora” ou “Ela/Ele arranjou outra pessoa e saiu de casa”

Por que expor os filhos a essas situações?

Como falamos acima: separe a conjugalidade da parentalidade. Não jogue a culpa pelo término da relação para uma pessoa só. Não queira transformar o pai ou a mãe em um “monstro” que abandonou ou trocou a família por outra pessoa.

Os filhos não têm que tomar as dores de um dos pais, a relação conjugal não deu certo, mas os laços entre pais e filhos devem ser mantidos.

4 – Seu pai/mãe foi fazer uma viagem e não vai voltar.

Será que mentir para criança ou adolescente realmente é a melhor saída? Por mais novos que sejam, os filhos conseguem perceber que algo está acontecendo. A tarefa de explicar para os filhos que seus pais estão se separando pode ser muito delicada, disso não temos dúvida. Mas será que uma mentira, por menor que seja, não pode vir a precisar de outra mentira para encobrir essa primeira, e criar um círculo vicioso? Mentira atrás de mentira? Quais os efeitos disso quando a verdade for descoberta? Qual é o exemplo de conduta que será repassado ao filho?

Como os efeitos dessa situação são incertos, é extremamente aconselhável procurar o amparo de profissionais especializados da área da psicologia, principalmente aqueles com experiência em atendimento familiar, a fim de receber a orientação adequada para lidar com a situação.

Devemos lembrar que cada pessoa é única e, que cada uma enfrenta seus problemas da maneira que lhe convém. Nem todas as pessoas reagem da mesma forma nessas situações, por isso é muito importante conhecer o comportamento e entender os sentimentos de cada indivíduo do núcleo familiar, para que seja feita a abordagem correta, a fim de evitar traumas, que, por vezes, podem vir a ser irreversíveis na vida de uma pessoa.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Como funciona a compensação da pensão alimentícia com pagamentos in natura?

Não paguei a pensão alimentícia em dinheiro, mas paguei mensalidade escolar e plano de saúde! Como considerar isso no processo de execução/cumprimento de sentença de alimentos?”

Se você está com dúvidas iguais ou parecidas a essa, continue lendo este artigo para entender melhor sobre a possibilidade de compensação dos alimentos!

Primeiramente, precisamos dizer que, se a pensão alimentícia (leia mais sobre pensão alimentícia de pais para filhos clicando aqui) foi fixada por decisão judicial em dinheiro (por exemplo, em percentual do salário-mínimo ou com base nos rendimentos do alimentante), o correto seria que o alimentante (ou seja, aquele que deve pagar) prestasse os alimentos da forma ali estabelecida, evitando, assim, discussões e efetivo prejuízo aos filhos.

Isso porque, em tese, os alimentos pagos de forma diferente do estabelecido em decisão judicial podem ser vistos como mera liberalidade do alimentante, ou seja, pode-se entender que, se ele pagou alguma coisa a mais, de maneira diferente do estipulado, o fez por sua própria vontade e, por isso, esses pagamentos não seriam considerados dentro de um processo de execução (cobrança) da pensão alimentícia.

No entanto, pode ser que, mesmo contrariando a decisão que fixou o valor dos alimentos, um dos genitores pague diretamente algumas despesas essenciais dos filhos (como por exemplo as mensalidades escolares direto à escola; o plano de saúde direto à prestadora de serviço; despesas com a moradia do filho, como taxas condominiais), e poderia ser relativamente “injusto” desconsiderar esses pagamentos durante a análise de um processo de cobrança dos alimentos.

Assim, em determinadas situações, ainda que a decisão que fixou os alimentos não tenha tratado sobre a possibilidade de prestação do valor in natura (ou seja, diretamente aos prestadores de um determinado serviço), aquele pagamento pode não ser visto como mera liberalidade, já que se tem admitido, em casos excepcionais, a compensação de crédito alimentar em espécie (dinheiro) com aqueles pagos in natura pelo alimentante.

Apesar do princípio da não compensação dos valores referentes à pensão alimentícia ser a regra no ordenamento jurídico brasileiro, essa incompensabilidade pode ser flexibilizada em situações peculiares, uma vez que os alimentos existem para suprir, principalmente, as necessidades básicas daqueles que os recebem.

É que, em razão até mesmo do superior interesse das crianças, o mais importante é sempre “garantir a efetiva percepção pelo necessitado dos alimentos que lhe são devidos (…) para que os alimentos não resultem em uma obrigação ilusória e do constante risco de ficar a mercê de um mau pagador”1, assim, o principal é que os filhos tenham suas necessidades atendidas.

Importante dizer que não é todo gasto efetuado diretamente com o fornecedor do serviço que poderá ser compensado com os alimentos. A compensação somente pode acontecer quando “se verificar que o débito que se quer deduzir tem origem igualmente alimentar, configurando-se assim forma de adiantamento que visa impedir eventual enriquecimento sem causa do alimentando”2.

Assim, esta é uma ideia que deve ser aplicada com ponderação, sob pena de eventual enriquecimento indevido daquele que recebe os alimentos.

Geralmente, as despesas aceitas para a compensação envolvem, por exemplo, o pagamento direto do plano de saúde e da mensalidade escolar (exceto se a própria sentença tiver determinado o pagamento destas despesas), pois são valores que geralmente seriam utilizados de qualquer maneira para arcar com essas necessidades dos filhos, essenciais ao crescimento saudável deles.

Então, vamos a um exemplo:

O Juiz determinou em sentença que João deve prestar alimentos a Maria no valor equivalente a um salário-mínimo. Ocorre que, João não realizou devidamente os pagamentos em todos os meses no valor estabelecido. Apesar disso, realizou o pagamento do plano de saúde de Maria em alguns meses.

Em um processo de cumprimento daquela sentença que fixou os alimentos, desde que documentalmente comprovado o pagamento do plano de saúde, o juiz poderá determinar que Maria apresente uma planilha da dívida alimentar, indicando o valor devido mês a mês (salário-mínimo), com a exclusão dos valores pagos a título de plano de saúde, como forma de compensação (um salário-mínimo, menos o valor do plano de saúde), já que foram realizados em benefício de Maria.

João, então, será intimado (saiba o que é intimação aqui) para quitar o débito que sobrou – excluída a quantia já paga relativa ao plano de saúde –, sob pena de ter, por exemplo, penhorados seus bens ou decretada sua prisão civil.

É importante enfatizar, mais uma vez, que tal compensação é excepcional, eis que, via de regra, não pode o alimentante pagar a pensão de forma diversa daquela acordada entre as partes (com homologação judicial) ou estabelecida por sentença, devendo ocorrer somente de maneira ponderada, evitando-se prejudicar a subsistência de quem recebe os alimentos.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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1 MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. 4ª Edição. Editora Forense. Rio de Janeiro, 2011.
2 (Processo: AI 226320 SC 2003.022632-0, Relator (a): Dionizio Jenczak, Julgamento: 17/08/2004, Órgão Julgador: Primeira Câmara de Direito Civil, Publicação: Agravo de Instrumento n. 03.022632-0, da Capital).

Até que ponto o Judiciário pode interferir na sua vida?

Se você é nosso leitor e nos acompanha há algum tempo, já deve ter percebido que sempre indicamos que o melhor seria que todas as questões familiares fossem resolvidas por meio do diálogo, ainda que com intermédio de profissionais terapêuticos.

Isso porque acreditamos que as próprias partes – melhor do que outras pessoas que não estão vivendo aquela relação – é que são as mais capacitadas para decidir sobre seu próprio destino e o dos filhos.

Determinadas situações devem ser levadas ao Judiciário, especialmente quando há algum caso de vulnerabilidade dos envolvidos ou de risco para as crianças, que estão em fase de desenvolvimento. No entanto, no artigo de hoje, falaremos sobre a ideia de “intervenção mínima do Estado nas famílias” ou de “Direito de Família mínimo”.

O que isso quer dizer?

Pois bem, como já falamos em textos anteriores, as leis que regem o Direito de Família estão em constante transformação, até porque as mudanças sociais exigem que as leis também mudem para se adaptar aos padrões da sociedade, atendendo às suas necessidades. Tendo isso em vista, podemos imaginar que, no passado, o estado interferia muito mais nas relações particulares das pessoas e, com o decorrer do tempo, passou-se a valorizar uma intervenção mínima.

Explicamos:

A título de exemplo, podemos mencionar que, em outros tempos, se um casal quisesse se separar, a lei determinava que eles deveriam ter, pelo menos, dois anos de casados (sendo amigável) para formular o pedido na Justiça, ou um deles deveria demonstrar a culpa do outro pelo fim do relacionamento (sendo litigioso). É certo, porém, que se tratava de uma intervenção desnecessária do Estado.

É que, se duas pessoas se casaram, se elas não querem mais viver juntas, e se existe a possibilidade do divórcio (ou da separação), qual seria o sentido de se manter a obrigatoriedade, por lei, de que ficassem casadas por dois anos, antes de poderem se separar?

O que acontece é que, antigamente, o matrimônio possuía um caráter muito mais patrimonial e nem sempre era baseado no amor e no afeto. Contudo, com o aumento da liberdade e com a valorização da dignidade da pessoa, a norma que impunha as condições mencionadas acima deixou de fazer sentido, motivo pelo qual foi posteriormente alterada.

Atualmente, até mesmo por conta da Constituição Federal de 1988, as pessoas podem pedir o divórcio a qualquer momento, desde que não tenham mais vontade de permanecer juntas, como já visto no artigo Quero me divorciar, e agora?” e essa norma parece corresponder muito mais à liberdade das pessoas, que é um direito fundamental.

Podemos também dar um exemplo no qual o estado continua intervindo. Conforme explicamos no artigo Quais são os regimes de bens existentes?”, os interessados em se casar podem escolher o regime de bens de seu casamento, ou seja, possuem liberdade para optar pelas formas previstas em lei e, caso entendam como necessário, podem pactuar uma forma diversa.

Mas existem algumas situações específicas nas quais essa liberdade de escolha é proibida pelo Direito. Por exemplo, para que as pessoas maiores de 70 anos possam se casar, a lei obriga que o regime seja o da separação de bens (leia mais sobre esse regime de bens aqui), ou seja, eles não possuem escolha. Ou é assim, ou não casam. Existe essa imposição do Estado porque se presume que sejam pessoas em um estado de maior vulnerabilidade, o que justificaria a intervenção na escolha, embora para outras pessoas ela permaneça sendo livre.

Em relação aos processos envolvendo crianças, tais como os de guarda e de convivência, o que se vê é que os pais, muitas vezes, não conseguem conversar de forma equilibrada e sensata, agindo somente na busca de seus interesses, com acusações mútuas, o que não contribui para o crescimento sadio dos filhos.

Nestes casos, os genitores esquecem, ou não se atentam para o fato de que o Judiciário não possui os instrumentos necessários para decidir pequenas questões do cotidiano dos filhos – seja por falta de conhecimento aprofundado da relação das partes, seja pela falta de estrutura física e funcional dentro dos Fóruns – que poderiam ser melhor resolvidas caso os genitores mantivessem um diálogo amigável, ao menos em relação às questões ligadas aos filhos, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário.

Por isso, é importante pensar na ideia do “Direito de Família mínimo”, ou seja, pensar que, apesar de o Juiz poder tomar diversas medidas dentro de um processo judicial quando verificar que existem situações de risco que justifiquem estas medidas, ele não está envolvido naquele relacionamento, e dificilmente saberá o que é melhor, de fato, para a rotina dos filhos e da própria família.

Ele atuará, portanto, visando o interesse da criança, com o auxílio de uma equipe de psicólogos e assistentes sociais, tendo por objetivo minimizar os danos que os conflitos dos pais podem causar ao filho.

Assim, entendemos que, antes de recorrer ao Judiciário, as pessoas precisam parar para refletir sobre o que elas preferem: tomar as decisões sobre as próprias vidas, ou deixar isso na mão do judiciário?

Pensem: Até que ponto o Judiciário vai ser tão eficaz em resolver todos os seus problemas familiares? Será que não existem situações que podem ser tratadas fora do âmbito judicial, quem sabe com o auxílio de terapeutas especializados na área ou até mesmo se os envolvidos estiverem abertos a resolver as questões amigavelmente?

O ideal é que os genitores, sempre em nome do amor e da preocupação que devotam aos filhos, possam se entender através do diálogo e do bom senso, a fim de que os pequenos deixem de ser expostos a situações que comprometam seu desenvolvimento.

Além disso, o diálogo e o entendimento se mostram a melhor saída não só em relação aos filhos, mas também para o relacionamento dos genitores e de todos os envolvidos nestas disputas familiares, que tendem a crescer quando todos estão “cegos” pelas brigas e desentendimentos.

Percebe-se que muitas vezes as situações de brigas e desentendimentos não se amenizam com a existência de um processo judicial. Pelo contrário, as partes tornam-se mais inflexíveis e fechadas para um diálogo, com a ilusão de que o Juiz resolverá todos os seus problemas familiares.

O Judiciário e a lei devem cumprir seu papel, mas é certo que nem sempre uma “sentença” consegue resolver todas as questões. Apesar de mostrar um “caminho” em alguns casos, a decisão judicial, por si só, não faz cessar os conflitos se as partes não estiverem abertas para isso.

Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

Herdeiro por representação: você sabe o que é?

Se o meu marido falecer antes do pai dele, nosso filho terá direito a receber herança quando o avô paterno vier a falecer?”

Essa é uma dúvida frequente, mas, antes de respondê-la, vamos ilustrar melhor a situação com o seguinte exemplo:

João e Maria, casados, tiveram dois filhos: Pedro e Paulo.

Pedro, casou-se com Ana e teve um filho dessa união, chamado Antônio.

Paulo é solteiro e não teve filhos.

Pedro faleceu e, dois anos depois, seu pai João veio a falecer também.

 

Antônio terá direito a receber herança deixada pelo avô João?

A resposta é sim!

A área do Direito que regulamenta essas situações é chamada de Direito das Sucessões. Ela é formada pelo conjunto de normas que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que faleceu aos seus sucessores. O termo “patrimônio” não abrange somente bens, ele abarca também alguns direitos e algumas obrigações – com exceção daquelas que somente poderiam ser prestadas pelo próprio falecido, quando em vida-, conforme já vimos no artigo “O que é inventário e para que serve?(clique aqui).

Quando você ouvir falar ou se deparar com o falecimento de alguém que deixou bens, fique sabendo, desde já, que a transferência desses bens deixados é o que podemos chamar de sucessão.

Dentro da sucessão, existe a previsão legal de uma “ordem de vocação hereditária”, que pode ser entendida como “a ordem de preferências e substituições que a lei estabelece entre os herdeiros”1.

Atualmente, a ordem de vocação hereditária prevista pela legislação brasileira é a seguinte: 1o) descendentes, 2o) cônjuge sobrevivente e ascendentes, 3o) parentes colaterais. Os demais possíveis herdeiros somente herdarão na ausência dos mencionados acima. Ainda, os descendentes mais próximos têm preferência sobre os mais remotos, ou seja, temos os filhos (1o), netos (2o), bisnetos (3o), etc., seguindo-se uma linha vertical.

Pois bem, passando à análise do caso apresentado no início do texto, devemos esclarecer que existe um instituto, dentro do Direito das Sucessões, que é chamado de “direito de representação”.

Esse instituto prevê que um herdeiro será chamado a receber a herança no lugar de outro herdeiro. Tal fato pode acontecer por haver herdeiro pré-morto, ou seja, que faleceu antes de receber uma herança que seria sua por direito, ou pelo herdeiro ser considerado ausente (quando ninguém sabe seu paradeiro e a ausência é declarada por uma decisão judicial), ou que foi excluído da sucessão.

Por tal motivo, o sucessor desse herdeiro pré-morto, ausente, ou excluído da sucessão, receberá a herança em nome dele, ou seja, o herdeiro de direito será representado por seu sucessor.

No artigo “Qual a diferença entre herdeiro e meeiro?(clique aqui), explicamos que “HERDEIRO é aquele que tem direito a receber os bens deixados por quem faleceu, ou seja, é um sucessor da pessoa falecida”.

Aplicando essa explicação ao caso concreto apresentado no presente artigo, temos que Pedro é herdeiro de João, pois é seu filho. E, embora Pedro tenha falecido antes de seu pai, ele não perde o status de herdeiro, apenas o transfere para o seu sucessor, que no caso é seu filho Antônio, neto de João.

Portanto, Antônio terá direito a receber a herança de seu avô, que deveria ter sido recebida pelo seu pai, Pedro, se vivo fosse.

Importante dizer também, que não há direito de representação para os casos de sucessão testamentária, ou seja, quando o falecido deixa testamento. Assim, se um indivíduo foi contemplado em testamento como herdeiro testamentário, e vem a falecer antes do testador, seus filhos não terão o direito de representação sucessória.

Cabe ainda dizer, que esse direito de representação ocorre apenas em relação aos descendentes, ou seja, um filho pode receber por representação a herança do avô que caberia ao pai, mas um avô não receberá por representação caso seu neto venha a falecer e, seu filho (pai do neto) seja falecido também.

Outro ponto importante a salientar é que, quando a herança for por representação, a cota parte que pertenceria ao herdeiro “original” será dividida entre o número de filhos existentes. Por exemplo: se no caso acima exposto Pedro tivesse dois filhos, a parte que Pedro herdaria se fosse vivo seria dividida em dois. Então, no exemplo acima, Paulo herdaria 50% por cento dos bens de João, enquanto Antônio e seu outro irmão herdariam os outros 50%, que seria dividido em duas partes iguais, ou seja, 25% para cada um.

Portanto, concluímos que, caso os pais de uma pessoa faleçam antes dos avós dela, ela terá direito a herdar o patrimônio deixado pelos avós, que caberia aos seus pais se vivos fossem.

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho


Reconhecimento de união estável após a morte: como fazer?

Posso pedir o reconhecimento da união estável após o falecimento do meu companheiro/a?”

Existe a possibilidade de reconhecimento de união estável depois do falecimento de um dos companheiros e, neste artigo, explicaremos como uma pessoa deve proceder caso esteja passando por uma situação assim.

Como se sabe, a união estável deve ser entendida como a convivência duradoura, pública e contínua, de duas pessoas, estabelecida com o objetivo de constituição de uma família.

Para saber mais sobre união estável, confira os artigos sobre o tema clicando aqui.

A formalização dessa união poderá ocorrer de maneira extrajudicial ou judicial.

Pela via extrajudicial:

O casal deverá encaminhar-se diretamente a um cartório e informar a existência da união estável. Neste momento, será feito um documento chamado de “escritura pública” que será preenchido com os dados pessoais do casal; a data de início da união (que não precisa necessariamente ser a data em que é feita a declaração no cartório, pode ser data anterior); o regime de bens a ser adotado (sim, é possível optar pelo regime de bens que mais se encaixa na situação do casal); bem como outras considerações que o casal considerar pertinentes.

Tem-se, então, que, para o reconhecimento extrajudicial é necessário que o casal compareça em cartório para firmar o ato.

Assim, a princípio, não seria possível o reconhecimento da união estável extrajudicialmente após o falecimento de um dos companheiros/as, já que, obviamente, não poderão ambos comparecer em cartório.

Apesar disso, há uma Resolução (nº 35 de 2007) do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que tornou possível o reconhecimento da união estável por esta via, porém, o reconhecimento aconteceria dentro do inventário extrajudicial daquele companheiro/a que faleceu, desde que haja acordo entre todos os herdeiros e não haja menores de idade ou incapazes envolvidos.

Pela via judicial:

Aquele companheiro/a interessado/a no reconhecimento da união após a morte do outro deverá procurar um advogado/a ou a Defensoria Pública (se houver) para entrar com um processo, explicando o período de duração da união, se dela resultou o nascimento de filhos e se foram adquiridos bens.

E aí você se pergunta: contra quem eu devo interpor o processo? Ou seja, se o outro companheiro já é falecido, quem será a parte ré?

O processo de reconhecimento de união estável após a morte deverá ser interposto em face dos herdeiros do falecido/a. Por exemplo, se aquele que faleceu deixou filhos, o processo deverá ser proposto “contra” eles.

Importante dizer que, embora a união estável se equipare ao casamento em diversos aspectos, isso não acontece nas ações de divórcio, já que, quando dois interessados se casam, eles formalizam aquela situação e, com o falecimento de um deles, o outro é automaticamente considerado viúvo(a), sem a necessidade de reconhecer judicialmente o casamento havido anteriormente.

Sendo reconhecida a união estável por sentença, o companheiro fará parte do inventário, que é o processo necessário para a transmissão dos bens do falecido para os seus sucessores (para saber mais sobre o inventário, clique aqui). É por isso que os herdeiros do falecido são chamados para contestar o reconhecimento da união, pois o eventual reconhecimento pode interferir no processo de partilha dos bens pelo inventário.

Em nosso outro artigo (clique aqui) ilustramos situação parecida, vejamos:

Maria conviveu com João por 15 anos, e a convivência preenchia todos os requisitos para configurar uma união estável (veja quais são os requisitos no artigo O que é união estável?). Durante a união, João e Maria compraram um apartamento, que ficou somente em nome de João. Assim, para que Maria passe a ter direito sobre este apartamento, ela precisa pedir o reconhecimento e a dissolução da união estável que tinha com João, para demonstrar que ela tem direito à partilha de bens.

De igual modo, no caso de falecimento de João, Maria precisa reconhecer que convivia em união estável com ele, para que possa ser reconhecida como meeira e herdeira de João – este será um caso de reconhecimento de união estável após a morte – e assim, participar da sucessão dos bens deixados por João.”

Devemos esclarecer que, ao pretender o reconhecimento da união estável após a morte de um dos companheiros, a pessoa interessada deverá apresentar provas robustas da existência da união, tais como: fotos do casal, dependência em plano de saúde, contas da casa em nome de ambos, declarações de testemunhas, entre outras.

Isso porque todos os requisitos para se configurar uma união estável deverão ser preenchidos, tendo em vista que os herdeiros do falecido poderão posicionar-se contra a existência da união.

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Arethusa Baroni

Flávia Kirilos Beckert Cabral

Laura Roncaglio de Carvalho

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